Autor: Marco Antonio Vilas Boas.
( ex-Juiz, Professor e Advogado)
LEI
N. 10.741, DE 1º DE OUTUBRO DE 2003
TÍTULO
I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º É instituído o
Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com
idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.
O vocábulo “idoso” tem sua
origem latina no substantivo aetas, aetatis, de cujo caso acusativo aetatem
(caso lexiogênico de onde nasceu a maioria das palavras num grande número de
línguas modernas) deu-se existência à palavra “idade”. “Idoso” é vocábulo de
duas componentes: “idade” mais o sufixo “oso” que, no léxico, denota
“abundância ou qualificação acentuada”.
Portanto, o vocábulo “idoso”
pode significar: cheio de idade, abundante em idade etc. A figura do idoso
poderia até ser controvertida se não existisse uma nomenclatura própria em lei,
definida no exercício legislativo de 2003.
A Lei n. 10.741, de 1º de
outubro, no ano citado (que dispõe sobre o Estatuto do Idoso), já estabeleceu
de forma lacônica, que o idoso é a pessoa com idade igual ou superior a 60
(sessenta) anos.
Como fez a lei citada, não
se imprimiu para a configuração do idoso, a diferença de sexo, condição social
ou outras variantes denotativas da individualidade humana.
O antigo Código Civil, de
1916, sem ao menos mencionar a palavra “idoso”, já havia obrigado a adoção do
regime matrimonial da separação de bens quando o homem contasse com sessenta
anos de idade e a mulher com cinquenta e cinco.
Com isso, pretendia-se
proteger um grau determinado de faixa etária, preservando-a de golpes contra
sua condição econômico-social ou fortuna.
Já o atual Código Civil (Lei
n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002), diferentemente, veio para nivelar homens
e mulheres e exigiu que as pessoas maiores de setenta anos adotassem o regime
da separação de bens no casamento.
Com a implementação de novos
conhecimentos médicos e avanços sociais concomitantes surgiu uma maior
expectativa de vida. A longevidade, como um fato já apurado, marcou um limite
único para homens e mulheres.
Nesse particular, o Estatuto
como lei especial é que deve se adequar à lei comum. Trata-se de um caso
atípico. Tal estipulação etária veio em um dos incisos do art. 1.641 da nova
lei substantiva. Já o Código Penal, ao tratar das circunstâncias que atenuam a
pena, para o agente da infração penal, considerou o momento etário somente para
os maiores de 70 (setenta) anos, à hora da sentença.
Não se sabe, no âmago do
legislador da época, se a vida com setenta anos era realmente o marco da idade
provecta. Todavia, nos dias de hoje, com a vigência do Estatuto, não se pode
dizer (e se dizê-lo far-se-á uma odiosa discriminação) que a idade senil seja
semelhante a do idoso.
Na senilidade há um incidente biológico que
implica na diminuição da capacidade físico-mental; no caso do idoso,
simplesmente se dá a partida teórico-temporal.
Enfim, considera-se idoso o
sexagenário e pouco importa sua condição de vitalidade, esteja ele em pleno
vigor físico ou nos anos da decrepitude.
Pode haver atletas idosos de
excelente desempenho físico, com desenvoltura admirável, o que não acontece com
os humanos senis.
A Convenção Americana dos
Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica, em 1969), adotada e aberta à
assinatura na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos,
ratificada pelo Brasil em 25 de setembro de 1992, adotou no seu preâmbulo:
“Direito à Vida”, art. 4º, um princípio de proteção ao maior de 70 (setenta)
anos, no caso de pena de morte. Diz seu número 5: Não se deve impor a pena de
morte à pessoa que, no momento da perpetração do delito, for menor de dezoito
anos, ou maior de setenta, nem aplicá-la à mulher em estado de gravidez.
Por fim, o Estatuto do Idoso
incluiu na sua esfera de proteção não só as pessoas maiores de sessenta anos de
idade, mas também as próprias pessoas com idade de sessenta anos.
Antes de o Estatuto
ingressar no arcabouço jurídico do País havia a Lei n. 8.842, de 4 de janeiro
de 1994, que criava a Política Nacional do Idoso.
Seu art. 2º registrava o idoso
nos seguintes termos: Considera-se idoso, para os efeitos desta lei, a pessoa
maior de sessenta anos de idade.
Porém, sendo lei especial
posterior (e prevalente sobre a outra, já referida), o Estatuto ampliou o campo
de abrangência e agasalhou no seu manto as pessoas com sessenta anos de idade,
considerando-as como “idosas”.
Como já foi acentuado, idoso
não é sinônimo de decrépito nem morto-vivo, tem idade que pode ser considerada
como velha, teoricamente.
Porém, a velhice tem seus
graus brandos e graus acentuados. Nem toda velhice se alia à enfermidade ou
apresenta o reduzimento de aptidões em menor escala, se comparada aos outros
homens não abrangidos por seu foco.
Robert Kastenbaum acentuou:
“a palavra ‘velho’ é muito significativa. Tomamos muitas decisões – ou os
outros as tomam por nós – baseados em pressupostos referentes à idade.
É frequente lembrarem-nos
que ‘já estamos velhos demais’ ou que ainda ‘não temos idade suficiente’ para
exercer algumas atividades ou desfrutar certas oportunidades e experiências.
Da mesma forma nós próprios
também tendemos a julgar os outros pela idade.
Comecemos, então, examinando
algumas ideias e praxes que acabaram por associar-se com a idade das pessoas.
Na verdade, teremos de falar em ‘idades’ porque há diferentes modos de ser
velho”.
Em trabalho da Unidade de Serviços – USBC/MG,
da Biblioteca Central, no SESC de Minas Gerais – Belo Horizonte, sob o título:
Pesquisando a terceira idade, às fls. 2/3, vislumbra-se interessante
posicionamento: “Velhice é a palavra usada para indicar o período final da
vida.
A velhice não pode ser
definida com precisão, por dois motivos: o processo de envelhecimento difere
bastante de indivíduo para indivíduo.
Uma pessoa de idade avançada
pode ter mais saúde e agilidade mental que uma pessoa bem mais nova; uma pessoa
pode ser vista como velha em determinada sociedade, e ser considerada
relativamente jovem em outra sociedade.
O indivíduo é um conjunto
complexo de órgão e células, funções, hábitos e reações diversas,
entrelaçando-se o todo de maneira equilibrada. O homem é uno, sua vida é una:
ela não se divide em períodos como a juventude, a maturidade, a velhice, mas
continua e se transforma.
Cada um de seus elementos
tem seu modo de viver, e, portanto, de evoluir e regredir. A noção de um limiar
de envelhecimento varia e parece muito discutível.
A transformação insidiosa
que fará do adulto um velho, se desenrola em várias dezenas de anos.
Entretanto, do ponto de vista biológico, a maioria dos médicos modernos
considera que o envelhecimento começa no fim do período de crescimento; a idade
cronológica, que é útil conhecer, é, portanto insuficiente para determinar o
estado de aptidões do indivíduo idoso e difere muitas vezes da idade biológica,
a única que conta (sic)”.
“Velho” e “idoso” são dois termos quase
sinônimos, por analogia, uma vez que o processo de envelhecimento afeta a
todos, avança com a faixa etária de todos os viventes, mas de modos distintos
em tempo e espaço.
Velho, porém, é um termo
mais depreciativo, se visto na sua pura conotação unívoca, na consequente perda
de sentidos e vigor.
Há idoso no seu quase pleno
vigor e não há velho que não tenha experimentado a fraqueza orgânica visível.
(...)
pode-se dizer que o
“envelhecimento caracteriza-se por uma modificação da estatura e do volume do
corpo. Há uma diminuição das células ativas ou nobres e de um aumento dos
tecidos de apoio chamados intersticiais.
As células e as fibras
nervosas condutoras do influxo diminuem consideravelmente no cérebro.
Compreende-se, então, que cada uma de nossas funções regride com o
envelhecimento, uma vez que cada uma de nossas células é afetada por ele. Os
órgãos do sentido despertam a atenção e dão o alarme relativamente cedo.
O olho perde, pouco a pouco,
seu poder de acomodação, pois o cristalino se torna opaco e duro. A pupila se
contrai com lentidão e reage mal aos estímulos luminosos. O ouvido envelhece,
precocemente, tal que o olho”.
Ao falar sobre o idoso, o
SESC mineiro foi mais complacente, diferenciando-o do velho e pontuando que “o
idoso não pode deixar de ter ambição, deve plantar, aos 90 anos, árvores que
levam 30 anos para crescer”.
A idade tem seus estágios,
de tal sorte a cometer às pessoas uma classificação por critérios múltiplos e
variados.
Há, por incrível que possa
parecer, um critério atemporal. Robert Kastenbaum falou de um “método
alternativo de classificar as pessoas pela idade.
As distinções baseiam-se na
situação de vida da pessoa, especialmente no lugar por ela ocupado na
sociedade, mais do que no número de anos transcorridos desde seu nascimento.
Sociólogos e antropólogos
por vezes se referem a isso como a um método de classificação de idade por
estágios. Este tem sido o critério mais importante para a distinção de idades
em muitas sociedades, e ainda subsiste como enfoque suplementar nas nações
industrializadas de hoje.
Um método simples de
classificação por estágios divide a população em jovens, adultos e velhos. Ele
segue de perto o modelo do desenvolvimento psicossexual.
As pessoas são
classificadas, na verdade, como pré-paternas, paternas ou pós-paternas. Muitas
sociedades acrescentam outra categoria, a ‘adolescência’.
A pessoa é reconhecida como
adulta sob muitos aspectos, mas ainda tem que subir mais um grau para obter
plena aceitação como adulto completo”.
Para
encerrar este tópico, é salutar repetir os ensinamentos de Kastenbaum: “A
sociedade precisa de velhos. – A velhice é um estado de espírito. – Dez anos
mais velho não quer dizer dez anos pior ou dez anos menos valiosos”. (nossos
grifos)
Enfim, idoso, no Estatuto
sob comento, nada mais é que o cidadão ou cidadã com sessenta ou mais anos de
idade”.
Vilas Boas, Marco Antonio
Estatuto do idoso comentado / Marco Antonio Vilas Boas. – 5. ed. – Rio de
Janeiro: Forense, 2015.Comentários ao art.1º., do Título I.
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