quinta-feira, 12 de setembro de 2019

OAB.SEGUNDA FASE. PENAL.

Em prática penal, errar a peça é praticamente impossível. Digo isso porque, o momento de cabimento de cada uma é tão específico, que não há como fazer confusão. Em todos os Exames de Ordem unificados – desde a época do CESPE -, somente em duas provas a escolha da peça foi motivo de discussão na área penal. Em todas as demais, não houve qualquer dúvida a respeito de qual seria a peça cabível.
Por isso, para acalmar o coração dos mais aflitos, iniciarei o nosso estudo pela correta identificação da peça cabível. Em seguida, nos próximos posts, veremos as principais peças, uma a uma. Procure não memorizar a explicação a seguir, pois veremos as peças individualmente, e, com o tempo, o cabimento de cada uma estará enraizado em sua mente. Por enquanto, preocupe-se apenas em entender as fases processuais. São o ponto principal de estudo deste resumo de hoje.
AS FASES PROCESSUAIS
Para a escolha da peça adequada, é essencial que se tenha em mente que o processo penal é dividido em fases. É possível fazer uma porção de divisões, mas adotarei a mais simples possível: a) fase pré-processual; b) fase processual; c) fase pós-processual. Para cada uma delas, há um rol de peças, com objetivos específicos.

PRÉ-PROCESSUAL → PROCESSUAL → PÓS-PROCESSUAL

FASE PRÉ-PROCESSUAL
A fase pré-processual engloba tudo o que ocorrer antes do RECEBIMENTO da denúncia ou da queixa. Ainda não existe um processo em andamento. Antes de falarmos da fase pré-processual em si, uma distinção importante: não confunda oferecimento da petição inicial com o seu recebimento. Um exemplo que talvez esclareça:
João é promotor de justiça. Francisco praticou um roubo. João OFERECE denúncia contra Francisco. Carlos, o juiz da comarca, RECEBE a denúncia contra Francisco, dando início ao processo.
No momento em que o promotor OFERECEU a denúncia, a fase ainda é a pré-processual. No entanto, quando o juiz a RECEBEU – houve uma decisão judicial dizendo que a petição inicial do promotor está de acordo com o art. 395 do CPP -, deu-se início à fase processual. Pode parecer besteira, mas veja algumas situações em que essa distinção é exigida:
1ª. O arrependimento posterior (CP, art. 16) só é possível se ocorrer até o RECEBIMENTO da denúncia.
2ª. A retratação da representação, em crime de ação penal pública condicionada, só é possível até o OFERECIMENTO da denúncia (CPP, art. 25).
3ª. A prescrição é interrompida pelo RECEBIMENTO da petição inicial, e não pelo OFERECIMENTO (CP, art. 117, I).
Portanto, como já dito, a fase pré-processual é encerrada no momento em que a petição inicial (denúncia ou queixa) é recebida, quando é dado início à fase processual. Sabendo disso, veja como é simples saber se uma peça é pré-processual ou processual. Dois exemplos:
1º. Defesa Prévia da Lei de Drogas (Lei 11.343/06): “Art. 55. Oferecida a denúncia, o juiz ordenará a notificação do acusado para oferecer defesa prévia, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.”.
2º. Resposta à Acusação (CPP, art. 396): “Art. 396. Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.”.
No primeiro exemplo, o dispositivo diz: oferecida a denúncia, o acusado deve oferecer defesa prévia. Logo, fase pré-processual. No segundo, o CPP fala em recebimento da denúncia. Destarte, fase processual. Então, se o enunciado da prova dissesse que a petição inicial foi recebida, a defesa prévia da Lei de Drogas estaria descartada, pois só é cabível após o oferecimento e antes do recebimento da denúncia.
Na fase pré-processual, embora existam outras peças, as realmente possíveis para a segunda fase são as seguintes:
a) Liberdade Provisória: o enunciado descreverá hipótese em que o cliente foi preso em flagrante dentro da legalidade, mas estão ausentes os requisitos da prisão preventiva (CPP, art. 312). Não há denúncia e nem nada. Apenas a prisão em flagrante. Exemplo: “João foi preso em flagrante por estar dirigindo embriagado. Ele possui residência fixa, trabalha e é a primeira vez em que é preso. Como advogado de João, elabore a peça adequada em sua defesa”. A LP nunca caiu em uma segunda fase por ser uma peça extremamente simples, que não comporta muitas teses. Se caísse na próxima segunda fase, seria, sem dúvida, uma grande surpresa.
b) Relaxamento da Prisão em Flagrante: assim como na liberdade provisória, o seu cliente foi preso em flagrante, mas há um porém: a prisão é ilegal. Exemplo: “Após ser obrigado a fazer o teste do bafômetro, João foi preso em flagrante por estar dirigindo embriagado. Como seu advogado, elabore a peça adequada em sua defesa”. Como todos sabemos, ninguém pode ser obrigado a fazer o teste. Logo, a prisão em flagrante foi ilegal, devendo ser relaxada. Veja que não há qualquer menção ao recebimento de denúncia ou queixa. Portanto, fácil perceber que estamos lidando com peça da fase pré-processual. O relaxamento caiu no VI Exame de Ordem.
c) Queixa-Crime: é uma peça com boas chances para a próxima segunda fase. O enunciado dirá que o seu cliente foi vítima de um delito e você, como advogado, deve buscar os meios adequados para que o criminoso seja punido. Exemplo: “João disse em uma rede social que Francisco, seu vizinho, está tendo um caso extraconjugal. Segundo ele, Francisco encontra a amante às quartas, após o expediente. Como advogado de Francisco, elabore a peça adequada para a defesa dos seus interesses”. Veja que não se falou em recebimento de queixa ou em sentença. O seu cliente foi ofendido e você deve fazer algo em sua defesa. Portanto, a peça só pode ser a queixa-crime, que não cai desde o XV Exame de Ordem.
d) Defesa Preliminar (Crimes Funcionais): o art. 514 do CPP diz assim: “Art. 514. Nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para responder por escrito, dentro do prazo de quinze dias.”. Trata-se de peça do rito especial dos crimes funcionais (crimes cometidos por funcionários públicos). Perceba que o dispositivo não fala, em momento algum, que a denúncia foi recebida. Embora tenha havido manifestação do juiz, não houve o recebimento da petição inicial. Logo, mais uma peça pré-processual. Dica: antes do recebimento, o juiz manda notificar; após o recebimento, o juiz manda citar. Se o dispositivo legal disser “notificar”, você já sabe que a peça é pré-processual. Exemplo: “João foi preso em flagrante pela prática do crime de peculato (CP, art. 312). Concluído o inquérito, o promotor de justiça o denunciou pela prática delituosa. O juiz da comarca o notificou a respeito da denúncia, para que ofereça a peça cabível. Como advogado de João, ofereça a peça adequada”.
e) Defesa Prévia (Lei de Drogas, art. 55): o enunciado da prova descreverá situação em que o cliente praticou crime da Lei 11.343/06 – provavelmente, tráfico – e dirá que a denúncia foi oferecida, mas ainda não recebida. Exemplo: “João foi preso em flagrante por estar transportando 2kg de maconha. O promotor de justiça o denunciou pelo crime de tráfico de drogas, com fundamento no art. 33 da Lei 11.343/06. João foi notificado no dia de ontem da denúncia. Como seu advogado, elabore a peça cabível”. Perceba, mais uma vez, que não foi falado em recebimento, fazendo com que o leitor do enunciado conclua com facilidade que se trata de peça pré-processual.
Como já dito, há outras peças pré-processuais. Algumas serão vistas durante a nossa preparação. No entanto, as de maior probabilidade para a próxima segunda fase são as descritas acima.
FASE PROCESSUAL
A fase processual tem início com o recebimento da petição inicial (denúncia ou queixa). O juiz decide se recebe ou não a inicial com fundamento no art. 395 do CPP – marque em seu vade mecum, pois pode ser útil no futuro. As principais peças da fase processual são as seguintes:
a) Resposta à Acusação: é a primeira chance de defesa na fase processual. O problema dirá que a denúncia foi recebida e que o cliente foi citado. Exemplo: “João foi preso em flagrante pela prática do crime de roubo. O promotor de justiça o denunciou pela prática delituosa. O juiz de direito recebeu a inicial e determinou a citação do réu, ocorrida há dois dias. Como advogado de João, elabore a peça cabível”. Veja que não foi falado em audiência ou em sentença. A problema tem como último ato o recebimento da inicial. A resposta à acusação foi a peça em três Exames de Ordem.
b) Memoriais: como regra, concluída a audiência, advogados e Ministério Público devem fazer as alegações finais oralmente. No entanto, em algumas situações, isso não é possível, e o juiz abre prazo para que as alegações sejam oferecidas por escrito. São os memoriais. Portanto, se o problema disser que houve audiência, mas ainda não foi dada a sentença, os memoriais são a única peça possível. Exemplo: “João foi preso em flagrante pela prática do crime de roubo. O promotor de justiça o denunciou pela prática delituosa. O juiz de direito recebeu a inicial e determinou a citação do réu. A resposta à acusação foi oferecida. Ocorrida a audiência, saíram as partes intimadas para que ofereçam suas considerações finais. Como advogado de João, elabore a peça cabível”. A FGV já cobrou memoriais em quatro oportunidades.
c) Apelação e Recurso em Sentido Estrito (razões): se o problema disser que houve decisão de juiz de primeira instância, é bem provável que a peça cabível seja uma dessas duas. Há outras, a exemplo dos embargos de declaração, que serão estudadas, mas a chance de caírem em uma segunda fase é quase inexistente. Para decidir por uma ou por outra, veja se a hipótese relatada se encaixa em uma das situações do art. 581 do CPP. Se houver correspondência, faça o recurso em sentido estrito. Caso contrário, faça apelação. Exemplo: “João foi denunciado pela prática de um homicídio. Recebida a inicial e ocorrida a audiência, o juiz decidiu pronunciá-lo. Como advogado de defesa, elabore a peça cabível”. Como o art. 581, IV, prevê que a peça cabível é o RESE, é a peça a ser elaborada no exemplo. Outro exemplo: “João foi denunciado pelo crime de roubo. Concluída a audiência, o juiz o condenou à pena de 6 anos. Como advogado de João, elabore a peça adequada”. Como o art. 581 não prevê a hipótese do segundo exemplo, por eliminação, a peça cabível é a apelação. A apelação já caiu em oito edições da prova. O RESE, em duas, e já não cai há algum tempo, o que me leva a crer que pode ser a peça da próxima segunda fase. Atenção: pode ocorrer de o enunciado descrever hipótese em que a outra parte ofereceu apelação ou recurso em sentido estrito. Neste caso, para defender o cliente do recurso interposto, deverão ser oferecidas contrarrazões.
d) Embargos Infringentes e/ou de Nulidade: nunca caíram em uma segunda fase – e, sinceramente, acho que nem cairão. Digo isso pela facilidade da peça. Os embargos são cabíveis contra decisão por acórdão (decisão de órgão colegiado, a exemplo de uma câmara criminal de TJ), quando não houver unanimidade entre os julgadores. Explico: se uma câmara criminal for composta por três desembargadores, pode ocorrer de dois votarem pela condenação e um pela absolvição. Neste caso, o réu pode oferecer embargos infringentes e/ou de nulidade para que o voto do desembargador que entendeu pela absolvição prevaleça.
e) Recurso Especial e Recurso Extraordinário: nunca caíram, mas acredito que pela dificuldade. São os recursos cabíveis contra decisões de tribunais em hipóteses bem específicas, previstas nos arts. 102, III, e 105, III, da CF. O Recurso Especial leva a discussão ao STJ; o Extraordinário, ao STF. Se caírem um dia, a reprovação será em massa. Considerando que a FGV pegou pesado na primeira fase do XXIII Exame de Ordem, não acredito em um dos dois para a próxima segunda fase. De qualquer forma, serão estudados.
f) Recurso Ordinário Constitucional: carinhosamente chamado de “ROC”, é uma peça com boas chances para uma segunda fase. O ROC é cabível contra decisão de tribunal que denega HC e MS. Se a decisão for de TJ ou TRF, o ROC deve ser endereçado ao STJ; se a decisão for do STJ, a peça é endereçada ao STF. Exemplo: “João teve a sua prisão preventiva decretada pelo juiz da 1ª Vara Criminal. Um Habeas Corpus foi impetrado em seu favor, mas o Tribunal de Justiça o denegou. Como advogado de João, elabore a peça cabível”. No exemplo, a peça é um ROC ao STJ.
FASE PRÓ-PROCESSUAL
Considera-se fase pós-processual tudo aquilo ocorrido após o trânsito em julgado, momento em que a fase processual é encerrada. Como advogado, há dois motivos de intervenção pós-processual: para a discussão do cumprimento da pena (ex.: pedido de progressão de regime) ou para buscar a rediscussão de um caso já transitado, quando nenhum recurso é mais cabível. Para o Exame de Ordem, há duas peças pós-processuais com grande probabilidade:
a) Agravo em Execução: é o único recurso cabível contra decisão do juiz da execução penal. Se o problema disser que o a decisão partiu de juiz da Vara da Execução penal, pode fazer Agravo em Execução, sem medo de errar. Exemplo: “João cumpriu 1/6 de sua pena em regime fechado. Embora presentes os requisitos para a progressão de regime, o juiz da Vara da Execução penal negou o pedido feito. Como advogado de João, elabore a peça cabível”. Caiu uma vez no Exame de Ordem.
b) Revisão Criminal: é a peça cabível para voltar a discutir o mérito de um processo já transitado. Como já não há mais recursos cabíveis, resta ao injustiçado buscar o que lhe é de direito em revisão – equivalente à rescisória do processo civil. Exemplo: “João foi condenado pelo crime de roubo. Transitada em julgado a sentença condenatória, surgem documentos que provam a sua inocência. Como advogado de João, elabore a peça adequada em busca dos seus interesses”. Também caiu uma vez no Exame de Ordem.

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