PROCESSO TRT/SP
Nº 1001185-57.2022.5.02.0211
17ª TURMA - CADEIRA 1
RECURSO ORDINÁRIO
ORIGEM: VARA DO TRABALHO DE CAIEIRAS/SP
RECORRENTES: 1) NATURA COSMÉTICOS S/A
2) ANA CRISTINA GOMES ALVES PEREIRA
JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA: GIULIANO MOTTA
RELATORA: CATARINA VON ZUBEN
VÍNCULO DE EMPREGO. CONSULTORA NATURA
ORIENTADORA. Hipótese em que as provas oral e
documental evidenciam controle da trabalhadora e cobrança ostensiva de
cumprimento das metas, demonstrando trabalho por conta alheia em típica
subordinação trabalhista. Recurso patronal desprovido.
Inconformados com a r. sentença de fls. 1638 e ss. - ID
2ae2ed1, complementada pela r. decisão dos embargos de declaração de fls. 1698
e ss. - ID a1f365e, que julgou parcialmente procedente a reclamação
trabalhista, interpõe a reclamada recurso ordinário (fls. 1655 e ss. - ID
38d6c5e), pleiteando a reforma da decisão. Discute: o ônus da prova; o vínculo
empregatício; as diferenças de comissões; a multa do art. 477 da CLT; o saldo
de salário; a gratuidade de justiça; os honorários sucumbenciais e o prazo para
anotação da CTPS e astreIntes.
Igualmente recorre a reclamante às fls. 1702 e ss. - ID
3176196, discutindo: a diferença de comissões; o vale -alimentação/refeição; a
PLR e a indenização pela aquisição de kit de produtos para demonstração.
Contrarrazões às fls. 1710 e ss. - ID 581a847 e fls. 1717 e
ss. - ID 58f9d54.
É o relatório.
VOTO
ADMISSIBILIDADE
Recursos tempestivos, preparado (fls. 1682/1697) e
representação processual regular (fls. 38 e 462/464). Conheço dos recursos, por
presentes os pressupostos legais de admissibilidade.
RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA
Vínculo de emprego
Contestando o pedido de reconhecimento do vínculo de
emprego no período de 01.06.2010 a 21.12.2021, na função de Consultora Natura
Orientadora (CNO), a ré sustenta que manteve relacionamento comercial com a
autora como Consultora Natura Digital - CN, revendedora de cosméticos, sendo
que a partir de 18.01.2012 a reclamante passou a exercer também a atividade de
Consultora Líder de Negócios - CLN (antiga Consultora Natura Orientadora -
CNO), mediante assinatura de contrato de parceria comercial.
Examinando o conjunto probatório, entendo que a tese
patronal não merece acolhida, senão vejamos.
Em depoimento (fls. 1584/1587 e 1599/1602) o preposto já
fornece indícios da relação de subordinação existente entre as
partes, relatando que, ao ingressar na função, a Consultora Orientadora recebe
um certo "volume" de consultoras, a quem irá orientar na
execução dos serviços (vendas de produtos Natura), tendo por objetivo
promover o engajamento destas consultoras e o respectivo incremento nas
vendas da empresa. Informou, ainda, o preposto, que as reuniões
promovidas pelos gerentes da Natura com a CNO eram marcadas pela
própria empresa a cada novo ciclo (intervalo de 21 dias), ocasião em
que a representante da ré (gerente) repassava os novos produtos, comunicava as
novas campanhas de vendas e discutia com a orientadora sobre o volume
de vendas das consultoras a elas subordinadas; que havia aproximadamente
250 consultoras sob gestão da demandante, tendo a gerente acesso à
integralidade do sistema e acompanhando todos os procedimentos, confirmando que
após a saída da autora foi colocada outra orientadora em seu lugar.
Conquanto as testemunhas das partes tenham prestado
declarações um tanto diversas, há de se somar a prova documental juntada aos
autos (fls. 64/93), que corrobora as afirmações da testemunha Ana Maria de
Souza quanto ao efetivo controle e fiscalização dos serviços da
orientadora/líder por meio da gerente, notadamente através do grupo de
what'sapp, em que havia cobrança ostensiva de metas e ameaças, como
por exemplo, "a nossa GV irá fazer uma reunião com as líderes que não
estão com resultados satisfatórios nos temas CN Bem vidas, Digital e CPV",
"para ficar precisamos entregas as metas... Pedi foco duas coisas saldo e
ativa" (fls. 65 e 76), além do áudio juntado às fls. 90. Conquanto a
documentação tenha sido impugnada pela ré, a troca de mensagens restou
confirmada pelo próprio magistrado na audiência de instrução (mediante consulta
ao celular da testemunha Ana Maria), restou inequívoco da oitiva dos áudios
colacionados que se tratavam de gerentes diversas a cobrar o alcance de metas
de suas líderes.
Como bem pontuou o ilustre julgador primário (fls.
1640/1641):
"Valore-se que um vendedor verdadeiramente
autônomo vende conforme sua singela vontade, quando quer, da maneira que quer;
um vendedor autônomo não se sujeita, via de regra, a metas do fornecedor, pois
sua relação com ele é de igualdade hierárquica.
O acolhimento da tese da ré implica admitir que
um trabalhador possa ser simultaneamente autônomo e líder de outros
trabalhadores também pretensamente autônomos (neste caso, na escala de
centenas), mas cujos serviços - de todos - convergem para uma única empresa
destinatária, a ré. Ocorre que a liderança pressupõe a existência de vínculo
relacional entre agentes. Não é concebível o exercício de liderança por
trabalhadores autônomos, entre si.
No mais, note-se que os aspectos de
independência da autora verificados em instrução - como liberdade de horário,
definição da própria rotina e inexistência de fiscalização de horários - não
são diferentes de aspectos que costumeiramente se verificam no exercício de
cargos de gerência e de trabalhadores externos, não sujeitos ao controle de
horário (art. 62, da CLT), regras legais que se projetam como
cláusulas contratuais no caso sob análise.
Nessa toada, faz-se especialmente relevante
distinguir-se que a autora se apresenta com poderes de gestão num
trabalho desenvolvido externamente, cujas características - que
implicam naturalmente maior autonomia no desenvolvimento de suas tarefas -
poderiam provocar confusão a respeito da existência ou não de subordinação. É
que, no caso, a liberdade da autora no desempenho de suas tarefas não se
apresenta diferente da de qualquer empregado celetista externo e/ou titular de
cargo de gestão - liberdade essa que não deve ser confundida com a ausência de
subordinação jurídica."
Destarte, a demandada não logrou êxito em desonerar-se do
encargo probatório de demonstrar a ausência dos requisitos inerentes à relação
de emprego, valendo ressaltar que incontroversa a onerosidade e habitualidade
(mais de 10 anos de relação jurídica entre as partes), sendo que a subordinação
e a pessoalidade restaram evidenciadas na prova oral, além de retratar-se
também, esta última, no documento juntado como prova empresa às fls. 109/119,
em que o §2º da cláusula 10ª impossibilita a "contratação e/ou
sub-contratação de terceiros para a execução dos Serviços".
Mantenho, pois, o direcionamento primário.
Diferenças de comissões
Analiso em conjunto o apelo obreiro.
O MM. Juízo primário condenou a ré a pagar diferenças de
comissões mensais de R$1.050,00, equivalente a 25% do valor arbitrado a título
de remuneração.
A demandada discorda da condenação enquanto a autora
postula majoração para R$2.000,00 a cada ciclo.
Pois bem. Ao invocar na defesa o integral e correto
pagamento das verbas variáveis, a reclamada atraiu para si o ônus de comprovar
o fato extintivo do direito (arts. 818 da CLT e 373, II, do CPC), não logrando
êxito, contudo, em desvencilhar-se do encargo.
Neste aspecto, em que pese a insurgência da reclamada, não
identifico a presença de elementos que evidenciem a clareza dos critérios para
pagamento das comissões. A ré juntou às fls. 514/518 o contrato firmado em
01.06.2017, que estabeleceu, por exemplo, como forma de cálculo de parte da
remuneração, a "lucratividade sobre pontos", correspondendo a
4% sobre o volume total de pontos somados de todas as CN's do grupo
e de todas as vendas realizadas pelas CN's(fls. 519). Contudo, a
demandada não trouxe aos autos os necessários relatórios de vendas das
consultoras e dos pontos auferidos por sua equipe, de forma a possibilitar a
verificação dos valores pagos ao longo do contrato. Vale ressaltar, neste
ponto, que inservível a documentação de fls. 554/1111, primeiro porque
apresenta mais de 500 páginas de tabelas contendo centenas de nomes de
colaboradores, e em segundo lugar, porque sequer indica as vendas realizadas.
Aliás, às fls. 1112/1114 a ré colacionou tabela específica de uma colaboradora
chamada Heloisa, demonstrando ser plenamente possível a indicação precisa dos
pontos e das vendas promovidos pela equipe da autora.
Some-se, ainda, que a demandada também não colacionou os
termos do "contrato comercial" firmado com a autora no início da
prestação de serviços em 2010, de forma a demonstrar a tese da defesa quanto à
inexistência de alteração dos critérios e formas de pagamento das verbas
variáveis, impondo-se rejeitar a arguição das partes acerca da existência de
"confissão".
De outra parte, como bem observou o julgador de origem, não
se mostra crível a alegação da prefacial de que à autora foi sonegado o
recebimento de 67% dos valores remuneratórios a que fazia jus a cada ciclo
(R$2.000,00 numa média total de R$3.000,00), e portanto, considerando os
importes creditados à reclamante (fls. 40/61 e 525/529), a denotar a elevada
variação mensal da remuneração auferida, entendo razoável o arbitramento de
diferenças de R$1.050,00 mensais, porquanto condizente com os elementos presentes
no conjunto probatório.
Nego provimento aos apelos.
Multa do art. 477 da CLT
Com relação à multa do art. 477, § 8º, da CLT, ela é devida
sempre que não houver adimplemento tempestivo dos haveres rescisórios sem culpa
do empregado, ainda que o vínculo e a ruptura contratual tenham sido
reconhecidos em juízo. Nesse sentido, a jurisprudência consolidada do C. TST:
"RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE. APELO
INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. MULTA DO ART. 477, § 8º, DA CLT.
CABIMENTO. RESCISÃO INDIRETA RECONHECIDA EM JUÍZO. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA
RECONHECIDA. REQUISITOS DO ARTIGO 896, § 1º-A, DA CLT, ATENDIDOS. A multa
prevista no artigo 477, § 8º, da CLT, nos termos da jurisprudência desta Corte,
é devida nos casos em que o empregador deixa de efetuar o correto pagamento das
verbas rescisórias no prazo definido pelo § 6º do referido dispositivo. Com o
cancelamento da OJ 351 da SBDI-1 desta Corte, não mais subsiste o entendimento
de que a fundada controvérsia ou dúvida sobre as obrigações isentaria o
empregador do pagamento da multa. Assim, não sendo corretamente pagas
as verbas rescisórias no prazo aludido no art. 477, § 6º, ainda que reconhecido
o próprio vínculo (Súmula 462 do TST) ou a rescisão indireta somente em juízo,
tem-se por cabível a sanção. Precedentes. Recurso de revista conhecido
provido" (g.n.)
(RR-356-33.2020.5.11.0011, 6ª Turma, Relator Ministro
Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 24/06/2022).
Mantenho.
Saldo salarial
Com razão a recorrente, inclusive considerando que sequer
há pedido na inicial para recebimento de saldo salarial.
Acolho.
Anotação da CTPS. Multa
Ainda que tenha sede em São Paulo, não se vislumbra
dificuldade em proceder à respectiva anotação da CTPS no prazo arbitrado pelo
Juízo (5 dias), na medida em que Caieiras é cidade muito próxima à capital. No
mais, o julgador primário já fixou limite razoável a astreintes pelo
descumprimento da obrigação.
Nada a reparar.
Justiça gratuita
O teor da declaração de pobreza de fl. 39, que atesta a
insuficiência de recursos para custear as despesas processuais, não foi
desconstituído por nenhum outro elemento probatório (Súmula 463, do TST).
O critério remuneratório de até 40% do limite máximo dos
benefícios do Regime Geral de Previdência Social, previsto no art. 790, § 3º,
da CLT, deve ser interpretado apenas como um parâmetro de ganhos que faz
presumir legalmente a hipossuficiência do trabalhador, não impedindo a
concessão da gratuidade de justiça para reclamante que receba salário superior.
Mantenho.
Honorários advocatícios
Considerando o trabalho adicional realizado pelo advogado
da reclamante em grau recursal, mantenho os honorários advocatícios arbitrados
na origem no montante de 10%.
RECURSO DA RECLAMANTE
Comissões
A questão já foi analisada junto ao apelo patronal.
Vale alimentação. PLR
Os benefícios postulados na inicial não estão previstos nas
normas coletivas juntadas pela autora (fls. 227/356), inexistindo, portanto,
amparo à pretensão. De notar que a cláusula 23ª tão somente autoriza as
negociações relativas à PLR, mas não fixa regras nem forma de pagamento.
Depoimentos colhidos em processos trabalhistas diversos,
bem como pagamentos realizados a outros empregados, por si só, não constituem
fonte normativa a albergar o pedido.
Rejeito.
Indenização pela aquisição do "kit
líder"
A recorrente expõe no recurso fundamentos para o fim de
comprovar a obrigatoriedade da aquisição do chamado "kit líder", sem
atentar para o óbice específico declinado na origem para o indeferimento do
pleito, qual seja, a inexistência de qualquer prova dos custos desembolsados
para a compra dos kits, de forma a impossibilitar a quantificação do dano
alegado.
De efeito, a teor do disposto nos arts. 818 da CLT e 373,
I, do CPC, a autora não se desonerou do respectivo encargo probatório,
impondo-se manter a improcedência do pedido de ressarcimento.
ANTE O EXPOSTO,
ACORDAM os Magistrados integrantes da 17ª Turma do Tribunal Regional do
Trabalho da 2ª Região em: Por unanimidade de votos, CONHECER dos recursos
ordinários e, no mérito, por unanimidade de votos, NEGAR
PROVIMENTO ao da reclamante e por maioria de votos, DAR
PARCIAL PROVIMENTO ao da reclamada, para excluir da condenação o
pagamento de saldo salarial, mantendo, no mais, o julgado recorrido, nos termos
da fundamentação do voto, vencido o Exmº Des. Homero Batista Mateus da Silva
que afastaria o vínculo empregatício reconhecido na origem. Consideram-se, para
fins recursais, devidamente prequestionadas todas as matérias apresentadas
no(s) apelo(s).
Presidiu o Julgamento a Exma. Sra. MARIA DE LOURDES
ANTONIO.
Tomaram parte no Julgamento os Exmos. Srs. CATARINA VON
ZUBEN (relator), HOMERO BATISTA MATEUS DA SILVA (revisor) e MARIA CRISTINA
CHRISTIANINI TRENTINI (3º votante).
Presente o ilustre representante do Ministério Público do
Trabalho.
Sustentação oral: Leandro Augusto dos Reis Soares e Deyse
Costa de Araújo
Após as sustentações orais, o Ilmº Procurador Dr. Ronaldo
Lima dos Santos proferiu sua manifestação.
CATARINA VON ZUBEN
Desembargadora Relatora
VOTOS
Voto do(a) Des(a). HOMERO BATISTA MATEUS DA
SILVA / 17ª Turma - Cadeira 4
VOTO VENCIDO
Vínculo de emprego
A sentença reconheceu o vínculo de emprego entre as partes
no período compreendido entre 01.06.2010 e 11.02.2022, na função de Consultora
Líder de Negócios, com remuneração mensal de R$ 3.000,00, acrescida de R$750,00
a título de comissões.
A ré impugna a pretensão, argumentando que manteve
relacionamento comercial com a autora como Consultora Natura Digital - CN,
revendedora de cosméticos, sendo que a partir de 18.01.2012 a reclamante passou
a exercer também a atividade de Consultora Líder de Negócios - CLN (antiga
Consultora Natura Orientadora - CNO), mediante assinatura de contrato de
parceria comercial, sem subordinação, pessoalidade ou alteridade.
Assim, por admitir a ré a prestação de serviços, a ela
cabia demonstrar a existência de fatos impeditivos do direito pretendido pelo
autor, nos termos do artigo 818, II, da CLT, recaindo presunção relativa de
existência de subordinação jurídica típica do contrato de emprego na relação
entre as partes.
E deste ônus a ré se desvencilhou satisfatoriamente. Senão,
vejamos.
Consoante contrato de parceria comercial firmado entre as
partes, constata-se que a profissional tinha por objetivo incrementar o número
de Consultoras Natura - CN, identificar possíveis candidatas a essa condição, e
atuar, ainda, na motivação comercial do Grupo CN por ela gerido, por meio do
incentivo à participação em eventos, de auxílio na passagem de pedidos e na
prestação de suporte (ID. 2258596).
Nada obstante, em que pese a reclamante afirmar que, na
condição de CNO/Líder de Negócios, estava subordinada à empresa, por intermédio
da Gerente de Relacionamento - GR, que cobrava metas, avaliava os trabalhos,
comparava, obrigava a fazer visitas e cobranças financeiras às CN's, em seu
depoimento declarou que escolheu ser líder para passar mais tempo com a sua
filha, destacando que não possuía controle de horário, recebendo de acordo com
a sua produtividade.
E ainda que a exclusividade não seja um dos requisitos para
a configuração do vínculo de emprego, é certo que a autora declarou em
depoimento que também foi consultora da Avon, no mesmo período do alegado
vínculo de emprego, o que também enfraquece as alegações iniciais.
Ademais, não se verifica a forma de subordinação alegada na
petição inicial em relação à Gerente de Relacionamento. As metas indicadas no
depoimento e conversas travadas pelo aplicativo de WhatsApp eram inerentes à
função exercida, ou seja, ao aumento da captação de consultoras. E quanto mais
consultoras, mais chances de os resultados das vendas de seu grupo implicarem
incremento de sua remuneração.
No mais, tinha que lhes dar suporte quanto à passagem de
pedidos, muito embora todas as consultoras pudessem realizar a função
diretamente, não mencionou nada relacionado à obrigatoriedade de visitas ou
cobranças financeiras. Além do mais, ficou claro que a autora não precisava
justificar ausências e que arcava pessoalmente com os custos do negócio.
Neste último ponto, constata-se do único extrato bancário
juntado com a inicial, que os valores eram recebidos diretamente das clientes,
em valores variáveis (ID. 3e9c8be), afastando a alteridade como requisito da
relação de emprego, nos termos do art. 2º da CLT.
Logo, da análise conjunta de tais depoimentos, não restou
demonstrada a subordinação alegada, tampouco se vislumbra a subordinação
estrutural acolhida na sentença.
Nesse mesmo sentido, segue a jurisprudência do C. TST:
"AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI
13.467/2017. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO DE EMPREGO. CONSULTORA NATURA
ORIENTADORA. SUBORDINAÇÃO OBJETIVA. SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL. TRABALHO AUTÔNOMO.
SÚMULA 126/TST. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA.
Situação em que o Tribunal Regional registrou que a Autora se ativou em favor
da Reclamada com pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação
objetiva. Desta forma, concluiu estarem presentes todos os requisitos para a
configuração do vínculo de emprego. Nada obstante, a mera subordinação
objetiva, ou estrutural, não é suficiente para desconstituir relação jurídica
formalmente estabelecida e ensejar o reconhecimento de relação empregatícia.
Assim, à mingua de registro no acórdão de circunstâncias fáticas
caracterizadoras de subordinação jurídica direta entre as partes litigantes,
elemento essencial à configuração do vínculo de emprego (Súmula 126/TST),
impõe-se a manutenção da decisão monocrática agravada, ainda que por outros fundamentos.
Agravo não provido" (Ag-RR-20940-88.2017.5.04.0701, 5ª Turma, Redator
Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 14/08/2023).
"AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA
DA RECLAMANTE. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 .
1. NULIDADE PROCESSUAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 2.
RECONHECIMENTO DE VÍNCULO DE EMPREGO. CONSULTORA NATURA. NÃO COMPROVAÇÃO DOS
REQUISITOS. REEXAME DE FATOS E PROVAS . DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR QUE
DENEGA SEGUIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO PREENCHIMENTO
DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE REVISTA. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA.
CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO . I. Fundamentos da decisão agravada não
desconstituídos, mantendo-se a intranscendência, por não atender aos parâmetros
legais (político, jurídico, social e econômico). II. Quanto ao tema
"nulidade processual por negativa de prestação jurisdicional" , o
Tribunal Regional atendeu ao comando dos arts. 832 da CLT, 489 do CPC/2015
(art. 458 do CPC/1973) e 93, IX, da CF/1988, uma vez que a decisão recorrida se
encontra devidamente fundamentada. Na verdade, a parte Reclamante se insurge
contra o posicionamento adotado pela Corte de origem no exame da matéria
controvertida. Contudo, a discordância quanto à decisão proferida, a má
apreciação das provas ou a adoção de posicionamento contrário aos interesses da
parte não são causa de nulidade processual, nem ensejam ofensa aos arts. 832 da
CLT, 489 do CPC/2015 (art. 458 do CPC/1973) e 93, IX, da CF/1988. III. Quanto
ao tema "Reconhecimento de vínculo de emprego" , o quadro fático
delimitado no acórdão regional demonstra que a prova testemunhal comprovou a
ausência dos requisitos dos arts. 2º e 3º da CLT. Conforme consta da sentença ,
transcrita no acórdão regional, " não se encontram presentes os requisitos
da onerosidade, alteridade, subordinação, habitualidade, podendo, ainda, a ré
se ativar na mesma função de vendedora para outras empresas ". Assim, do
quadro fático exposto na decisão regional recorrida, observa-se que a Reclamada
se desincumbiu a contento de seu ônus de demonstrar a ausência do vínculo de
emprego. Dessa forma, para que se chegue à conclusão diversa da adotada pela
Corte Regional há necessidade de reexame de fatos e provas, procedimento
incompatível com a natureza extraordinária do recurso de revista (óbice da
Súmula nº 126 do TST). IV. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento,
com aplicação da multa de 5% sobre o valor da causa atualizado, em favor da
parte Agravada, com fundamento no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015"
(Ag-AIRR-12254-81.2016.5.15.0137, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz
Ramos, DEJT 11/11/2022).
Portanto, diante dos depoimentos prestados, da remuneração
descrita e documentos juntados, vislumbra-se que a prestação de serviço se deu
em caráter autônomo.
Para a caracterização do vínculo empregatício, a conjugação
dos artigos 2º e 3º da CLT impõe que estejam presentes todos os requisitos
relacionados à habitualidade, subordinação jurídica, pessoalidade e
onerosidade, o que não restou demonstrado no presente caso.
Diante de tais elementos, em face da ausência de provas do
concurso dos requisitos do art. 3º da CLT, bem como da impossibilidade de se
presumir o emprego pela simples prestação de serviços, segue-se que a hipótese
configurou autêntica relação de trabalho autônomo, motivo pelo qual se impõe a
reforma do julgado para o fim de afastar o vínculo de emprego reconhecido na
origem, excluir da condenação as parcelas daí decorrentes e, de consequência,
julgar improcedente a pretensão.
QUESTÕES REMANESCENTES
A reforma da r. sentença impõe a abordagem das questões
acessórias.
Diante da improcedência do pedido de reconhecimento do
vínculo empregatício, prejudicada a análise do recurso da reclamante.
Honorários sucumbenciais
Em face da improcedência da demanda, o julgado também
justifica reparo para o fim de absolver a reclamada da condenação no pagamento
de honorários advocatícios sucumbenciais.
Devidos honorários advocatícios ao patrono do réu, ora
arbitrados em 5% sobre a parcela sucumbente, cuja exigibilidade fica suspensa
na forma da ADI 5766. Eventual alteração relativa ao estado de fato ou direito
quanto à declaração de pobreza e a exigibilidade dos honorários sucumbenciais
deverá ser arguida na forma do art. 505, I do Código de Processo Civil de 2015,
mediante ação autônoma de conhecimento.
CONHEÇO dos recursos
interpostos, e, no mérito, NEGO PROVIMENTO ao apelo da autora
e, DOU PROVIMENTO ao apelo da ré, para o fim de afastar o
vínculo de emprego reconhecido na origem, absolvendo-a de todas as parcelas da
condenação e, de consequência, julgar IMPROCEDENTE a demanda,
nos termos da motivação, condenando o autor no pagamento de honorários
sucumbenciais em favor do patrono da ré com a suspensão de sua exigibilidade,
conforme fundamentação do voto do Revisor.
Custas em reversão, pela demandante, calculadas sobre o
valor atribuído à causa, no importe de R$ 15.941,22, dispensado o recolhimento
na forma do art. 790, § 3º da Consolidação das Leis do Trabalho.
HOMERO BATISTA MATEUS DA SILVA
Desembargador Revisor
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