quarta-feira, 1 de maio de 2019

XXVII EXAME DE ORDEM UNIFICADO PROVA PRÁTICO-PROFISSIONAL ÁREA: DIREITO CIVIL


QUESTÃO 1

 Enunciado 

Luiza ajuizou ação porque, embora há muitos anos se apresente socialmente com esse nome e com aparência feminina, foi registrada no nascimento sob o nome de Luis Roberto, do gênero masculino. Aduz na inicial que, embora nascida com características biológicas e cromossômicas masculinas, desde adolescente compreendeu-se transexual e, ao constatar a incompatibilidade com sua morfologia corporal, passou a adotar a identidade feminina, vestindo-se e apresentando-se socialmente como mulher. Nunca se submeteu à cirurgia de transgenitalização, por receio dos riscos da cirurgia e por entender que isso não a impede de ser mulher. Diante disso, formula pedidos para que seja alterado não somente o seu registro de nome, mas também o registro de gênero, cujo conteúdo lhe causa profundo constrangimento. Demanda que passe a constar o prenome Luiza no lugar de Luis Roberto e o genêro feminino no lugar de masculino. A sentença, contudo, julgou improcedente o pedido, limitando-se a afirmar que o pleito, sem a prévia cirurgia de transgenitalização, fere os bons costumes.

 Sobre o caso, responda aos itens a seguir. 

A) A sentença pode ser considerada adequadamente fundamentada? Justifique. (Valor: 0,65)

B) No mérito, os dois pedidos de Luiza devem ser acolhidos? Justifique. (Valor: 0,60)

Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação. 

Gabarito comentado 

A) Ao indicar, como fundamentação para a improcedência, a referência ao conceito jurídico indeterminado de “bons costumes”, sem explicar as razões concretas para sua incidência no caso concreto, a sentença violou o disposto no Art. 489, § 1º, inciso II, do CPC/2015. E/OU a sentença violou o disposto no Art. 489, § 1º, inciso VI, do CPC, pois o juiz não apontou distinção com o julgamento proferido pelo STF na ADI 4.275 e no RE 670.422, objeto de repercussão geral. Considera-se, por conta disso, que a sentença não foi fundamentada e, consequentemente, é inválida. 

B) No mérito, tanto o pedido de retificação do registro de nome como o pedido de retificação do pedido de gênero devem ser acolhidos, pois conforme o entendimento manifestado pelo STF no julgamento da ADI 4.275 e do RE 670.422, objeto de repercussão geral, em casos de transexualidade a alteração registral pode ocorrer independentemente de cirurgia de transgenitalização.

 QUESTÃO 2 


Enunciado 

Mariana comprou de Roberto um imóvel por um preço bastante favorável, tendo em vista que Roberto foi transferido para outra cidade. Ao contratar empreiteiros para realizar obras necessárias no local, algumas semanas depois da aquisição, Mariana foi acionada judicialmente por Almir, que sustenta ser o real proprietário do imóvel, o qual lhe teria sido injustamente usurpado por Roberto. Mariana não tem elementos para se defender no processo relativo a um fato ocorrido antes da sua aquisição e, resignada a perder o bem, precisaria ao menos recuperar o dinheiro que por ele pagou, bem como as despesas que efetuou para a realização de obras no local, pois, embora estas não tenham chegado a ser realizadas, ela não pôde reaver o sinal pago aos empreiteiros. Sobre o caso, responda aos itens a seguir. 

A) Qual medida processual deve ser tomada por Mariana para poder reaver o preço pago pelo imóvel no mesmo processo em que é acionada por Almir? Justifique. (Valor: 0,70) 

B) Além do preço pago, pode Mariana exigir o reembolso das despesas efetuadas com o objetivo de realizar obras no local? Justifique sua resposta. (Valor: 0,55)

Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação. 

Gabarito comentado 

A) Trata-se de hipótese de evicção, já que Mariana está sendo privada judicialmente de sua propriedade em razão de direito de terceiro (Almir) anterior à sua aquisição. Para exercer seu direito à indenização decorrente da evicção no mesmo processo em que é privada da propriedade do bem, em lugar da ação autônoma, Mariana deve recorrer à denunciação da lide em face de Roberto, seu alienante imediato (Art. 125, inciso I, do CPC).

B) O direito à indenização, por sua vez, abrange não apenas o valor do bem, mas igualmente à indenização pelas despesas dos contratos e pelos prejuízos que diretamente resultarem da evicção, o que inclui as despesas efetuadas com o objetivo de realizar obras necessárias no local (Art. 450, inciso II, do CC).


  QUESTÃO 3 


Enunciado 

Marcela firmou com Catarina um contrato de mútuo, obtendo empréstimo de R$ 50.000,00, no qual figurou como fiador seu amigo, Jorge, sem renúncia aos benefícios legais. Todos residem no Município de São Carlos, SP. Vencida a obrigação de pagamento, Marcela não efetuou o depósito do valor devido a Catarina, de modo que Catarina ajuizou execução de título extrajudicial, indicando como executados Marcela e Jorge. Jorge, citado, procurou seu advogado, com o objetivo de proteger seu patrimônio, já que sabe que Marcela possui dois imóveis próprios, situados no Município de São Carlos, suficientes para satisfação do crédito. Diante de tal situação, responda aos itens a seguir. 

A) Jorge tem direito a ver executados primeiramente os bens de Marcela? Apresente o embasamento jurídico pertinente. (Valor: 0,50) 

B) Poderia Catarina ter incluído Jorge como executado? Uma vez citado, como Jorge deve proceder no âmbito do processo de execução, em defesa de seus bens? (Valor: 0,75) 

Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação.

 Gabarito comentado 

A) Jorge tem direito a exigir que sejam primeiro executados os bens de Marcela, até que haja satisfação da dívida, conforme dispõe o Art. 827 do CC. Isso ocorre porque, não tendo ocorrido renúncia ao benefício de ordem (Art. 828), a responsabilidade de Jorge é subsidiária, e seu patrimônio apenas será atingido caso os bens de Marcela sejam insuficientes. 

B) Catarina poderia ter incluído Jorge no polo passivo da Execução (Art. 779, inciso IV, do CPC). No entanto, uma vez citado, Jorge pode nomear à penhora os bens de Marcela, indicando-os pormenorizadamente (Art. 794 do CPC), para que seus bens apenas sejam atingidos caso não seja possível satisfazer o crédito pela excussão dos bens de Marcela.


 QUESTÃO 4

 Enunciado

 Marcos, por negligência, colidiu seu carro com o automóvel de Paulo, que é taxista e estava trabalhando no momento. Em razão do acidente, Paulo teve que passar por uma cirurgia para a reconstrução de parte de seu braço, arcando com os custos correlatos. A cirurgia foi bem-sucedida, embora Paulo tenha ficado com algumas cicatrizes. Após ficar de repouso em casa por quatro meses, por recomendação médica, no período pós-operatório, Paulo resolveu ajuizar ação contra Marcos, com o objetivo de obter indenização por perdas e danos sofridos em razão do acidente. No curso da ação, Marcos, que tinha contratado seguro contra terceiros para seu veículo, requereu a denunciação da lide da Seguradora X, tendo o juiz, no entanto, indeferido o pedido. 

Nessa situação hipotética, responda aos itens a seguir. 

A) Especifique os danos sofridos por Paulo e indique os fundamentos que justificam sua pretensão. (Valor: 0,60)

B) Qual a medida processual cabível para Marcos impugnar a decisão que indeferiu o pedido de denunciação da lide? Esclareça se Marcos poderá exercer futuramente o direito de regresso contra a Seguradora X, caso seja mantida a decisão que indeferiu o pedido de denunciação da lide. (Valor: 0,65) 
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação. 

Gabarito comentado

A) Paulo sofreu danos estéticos, em razão da cicatriz que a cirurgia deixou em seu braço, e danos materiais emergentes, em razão da colisão ocorrida com seu automóvel e dos custos incorridos com a cirurgia. Além disso, Paulo também amargou lucros cessantes, em virtude de ter ficado impossibilitado de trabalhar como taxista por quatro meses. Ademais, Paulo também sofreu danos morais. Como fundamento de sua pretensão, Paulo poderá alegar que Marcos cometeu um ato ilícito e que, portanto, fica responsável por reparar o dano sofrido, na forma do Art. 186 e do Art. 927, ambos do CC. Poderá argumentar, ademais, que o dever de indenizar abrange não só a reparação do dano estético e do dano material emergente, mas também o pagamento dos lucros cessantes, na forma do Art. 402 do Código Civil.

B) Marcos poderá impugnar a decisão que indeferiu o pedido de denunciação da lide através de recurso de agravo de instrumento. Com efeito, o Art. 1.015, inciso IX, do CPC estabelece que o agravo de instrumento é cabível contra decisões interlocutórias que versem sobre a admissão ou inadmissão de intervenções de terceiros. Por outro lado, mesmo que seja mantido o indeferimento da denunciação da lide, Marcos poderá exercer futuramente o direito de regresso em face da Seguradora X. Isso porque o Art. 125, § 1º, do CPC permite que o direito regressivo seja exercido por ação autônoma quando a denunciação da lide for indeferida. Assim, caso Marcos venha a ser condenado na ação movida por Paulo, poderá ajuizar demanda autônoma contra a Seguradora X para obter o ressarcimento do que pagou.



Fonte: https://dpmzos25m8ivg.cloudfront.net/630/135295_GABARITO%20JUSTIFICADO%20-%20DIREITO%20CIVIL.pdf. Acesso: 01/05/2019

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