Processo
AREsp 1483308
Relator(a)
Ministro MARCO BUZZI
Data da Publicação
27/09/2019
Decisão
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.483.308 - RS (2019/0099327-0) RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZI AGRAVANTE : J R T ADVOGADOS : GUILHERME MACHADO BARBOZA - RS091796 SABRINA DUARTE SELAU - RS094271 AGRAVADO : A P R ADVOGADO : LUANA ANTUNES VIGNA GONÇALVES - RS090963 DECISÃO Trata-se de agravo (art. 1.042 do CPC/15), interposto por J R T contra decisão que negou seguimento ao recurso especial, interposto com fulcro nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, o qual visa reformar acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado (fl. 255, e-STJ): APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE GUARDA. PLEITO DE CONCESSÃO DA GUARDA UNILATERAL PELO GENITOR E, SUBSIDIARIAMENTE, DA GUARDA COMPARTILHADA COM PERÍODOS ALTERNADOS DE CONVIVÊNCIA. DESCABIMENTO. MANUTENÇÃO DO DECISUM. 1. Caso dos autos em que inexistem provas de eventual conduta desabonadora por parte da apelada ou da existência de situação de vulnerabilidade dos adolescentes. Estudos social e psicológico realizados que, embora não contraindiquem a guarda por nenhum dos genitores, apontam o desejo dos filhos de permanecerem com a genitora e não sofrerem alterações em sua rotina. Mero descontentamento com o método educacional utilizado pela genitora com os filhos, sem reflexos negativos aparentes em suas criações, que não pode ensejar a alteração da guarda, medida excepcional e que pode acarretar diversos prejuízos. II. Guarda compartilhada que pressupõe entendimento entre os pais para que o encargo seja desempenhado uniforme e harmônico, objetivando sempre o melhor interesse dos filhos, no intuito de garantir-lhes o desenvolvimento integral. Evidente clima beligerante existente entre os genitores (fls. 71/72), especialmente quanto à partilha dos bens, como constatado pelas experts. Filho que referiu não querer "ficar andando de um lado a outro", sendo que ambos expressaram o desejo de não alterar a rotina. Apelação desprovida. Opostos embargos de declaração, os quais foram rejeitados pelo aresto de fls. 276/283, e-STJ. Nas razões do recurso especial (fls. 290/309, e-STJ), a ora agravante aponta, além do dissídio jurisprudencial, a violação dos arts. 1.583, 1.584, 1.630, 1.632 e 1.634 do CC, defendendo, em síntese, a concessão da guarda compartilhada, a qual deve prevalecer sobre a guarda unilateral, ainda que haja divergências entre os genitores. Contrarrazões às fls. 333/354, e-STJ. Em juízo de admissibilidade (fls. 366/371, e-STJ), negou-se seguimento ao recurso especial ante a incidência da Súmula 7/STJ. Nas razões do agravo (fls. 375/389, e-STJ), a parte, buscando destrancar o processamento da insurgência, refutou o fundamento apontado. Contraminuta às fls. 390/391, e-STJ. Parecer do MPF às fls. 402/404, e-STJ. É o relatório. Decido. 1. Cinge-se a controvérsia acerca da ofensa aos arts. 1.583, 1.584, 1.630, 1.632 e 1.634 do CC, na qual a parte defende a concessão da guarda compartilhada, a qual deve prevalecer sobre a guarda unilateral, ainda que haja divergências entre os genitores. A Corte a quo, ao solucionar a lide, entendeu pela inviabilidade da guarda compartilhada no caso concreto, adotando a seguinte fundamentação: Com efeito, a convivência familiar é um direito do genitor e merece ser assegurada à criança, mormente porque são os seus interesses que devem prevalecer sobre os de qualquer outro. Aqui, pontua-se que o artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê, de forma expressa, que "é direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integrar. Todavia, não obstante o apelante pleiteie a guarda unilateral dos filhos - [...], nascido em 25/04/2002 (fl. 20); [...], nascida em 14/09/2004 (fl. 21) - não há, nos autos, prova de eventual conduta desabonadora por parte da apelada, que possui sua guarda unilateral desde o acordo homologado nos autos do processo n. 001/1.11.0023094-8 em 23/11/2011 (fls. 23/29), ou da existência de situação de vulnerabilidade dos adolescentes. No laudo de avaliação social (fls. 124/127v.), a assistente social concluiu que, "do ponto de vista social, os genitores se equivalem no empenho de proporcionar aos filhos o acesso aos seus direitos fundamentais (...)". Insta ressaltar que o filho "expressou desejo de manter-se residindo com a genitora, sendo que suas motivações dizem respeito a estar adaptado à escola onde estuda desde o 1-Q ano, à casa onde reside e onde senta-se mais à vontade por ter seus pertences", enquanto que a filha "expressou que se relaciona bem, tanto com o genitor quanto com a genitora e não saberia ao certo se gostaria de residir com o genitor ou com a genitora". E a expert, "levando em consideração o melhor interesse dos adolescentes e respeitando as manifestações dos mesmo de que querem manter-se residindo com a genitora", sugeriu o seguinte: - manter a guarda com a genitora com residência dos filhos em sua casa. Na medida que requerente e requerida estabeleçam o mínimo de condições de diálogo e resolução de seus conflitos conjugais e de partilha, ainda não resolvidos desde a separação, que se encaminhem para uma guarda compartilhada; - estabelecer visitas livres dos filhos ao genitor, haja vista o projeto deste de residir mais próximo do condomínio onde [...] e [.. .] moram com a genitora; - que requerente e requerida sejam encaminhados ao Sejusc - mediação, para tratarem as questões relativas a partilha e divergências quanto as combinações e educação dos filhos, de forma a mantê-los preservados do litígio entre os genitores. Destacou, no mais, ao responder os quesitos, que: - os filhos demonstram bom vínculo afetivo com ambos os genitores. - (...) Atualmente encontram-se adaptados ao arranjo de convivência estabelecido. Quanto à disputa, demonstram clareza que esta diz respeito a um litígio entre os genitores. O que inclusive foi reforçado a eles e aos genitores durante o estudo social, de forma a mantê-los protegidos da disputa, preservando seu melhor interesse. - Os filhos descrevem a relação com cada um dos genitores de forma tranquila, reconhecendo que ambos buscam seus cuidados dentro das características de cada um. Aludem que ambos os genitores se alteram em determinados momentos o que parecem lidar com entendimento de traços da personalidade de cada um. Já quando da realização do parecer psicológico (fls. 128/129v.), [.. .] "fala da surpresa com o pedido de guarda por parte de seu pai. Pensa que se fosse para mudar sua vido, isso teria sido há alguns anos. Agora sua rotina está organizada e não gostaria que fosse modificada. Na casa do pai tem espaço para ele, mas não é mais o seu quarto", e [...] "diz que não gostaria que suas rotinas fossem modificadas". Trago outras conclusões da perita psicóloga: - A avaliação demonstra que a demanda de substituição de guarda por parte do genitor tem uma motivação que vai além da preocupação dele com os filhos, mesmo existindo um vínculo e preocupação paterna genuínos de João para com os dois. - Ambos os genitores apresentam condições relativas para ter os filhos sob guarda: a genitora apresenta questões de fragilidade emocional em tratamento e financeiras, dependendo da pensão dos pais de seus filhos; o genitor apresenta questões de saúde física, mas teria melhores condições financeiras para ter com ele os adolescentes. De fato, o pleito do apelante baseia-se fundamentalmente em sua insatisfação com o método educacional adotado pela apelada, o qual, ao que tudo indica, não desborda a normalidade, inexistindo indícios de qualquer falha que pudesse causar reflexos negativos na criação da prole, até mesmo porque a assistente social consignou que "não foram observadas condutas inadequadas por parte dos filhos", tampouco elementos consistentes de alienação parental, como por ele alegado. Ora, a alteração da guarda é medida excepcional e, no caso, ocasionaria drástica alteração na rotina já estabelecida dos filhos, devendo ser observada, inclusive, a sua manifesta vontade de mantê-la inalterada. Diante disso, atento ao melhor interesse dos adolescentes, que, a meu ver, é permanecer com a genitora, entendo acertada a decisão do primeiro grau, a qual vai mantida no ponto. Nesse sentido, colaciono precedente: [...] Tocante ao pleito de concessão da guarda compartilhada com alternância de convivência, tenho que também não merece prosperar. Isso porque o exercício da guarda compartilhada se traduz em compartilhamento de responsabilidades, não implicando em alternância de residências ou divisão temporal de estada com os filhos. Igualmente, a guarda compartilhada pressupõe entendimento entre os pais para que o encargo seja desempenhado uniforme e harmônico, objetivando sempre o melhor interesse dos filhos, no intuito de garantir- lhes o desenvolvimento integral. Ocorre que, In casu, evidente o clima beligerante existente entre os genitores (fls. 71/72), especialmente quanto à partilha dos bens, como constatado no laudo de avaliação social: - Alegou que divisão dos bens adquiridos durante o período de união não foi justa e que ajuizou ação própria de sobrepartilha. Relatou ainda que [...] sempre assumiu todos os gastos dos filhos até o processo de sobre partilha e que ele teria vinculado a retirado do processo de guarda à suspensão da ação de sobrepartilha. Referiu que sente-se injustiçada pois ajudou construir com [...] o patrimônio dele e atualmente ele estaria usufruindo sozinho. Acrescentou que ela ajudava na parte financeira da empresa e administrava os cuidados dos filhos e a casa que moravam que tinha caseiro, animais e hortas. - [...] aludiu que não há comunicação entre ela e o requerente e as combinações são estabelecidas através dos filhos. Relatou que em momentos que os filhos não aceitam limites ela lhes diz que vai mandá-los para a casa do genitor e que eles escolham com quem morar. Não considera sua atitude como sendo de alienação parental, justificando que é o jeito que encontra para estabelecer limites aos filhos. - A análise do conteúdo processual, os relatos nas entrevistas e as observações, apontam para conflito entre requerente e requerida, desde o período da união. Após a separação, o litígio intensificou-se, sugerindo que as questão relativas ao relacionamento conjugal e partilha de bens, ainda não estão resolvidas pelo ex-casal, refletindo-se em animosidade grave, com reflexos no melhor interesse dos filhos. Há, inclusive, expressa disposição, a qual novamente saliento, de que os litigantes devem estabelecer "o mínimo de condições de diálogo e resolução de seus conflitos conjugais e de partilha, ainda não resolvidos desde a separação, que se encaminhem para uma guarda compartilhada". Já nos termos do parecer psicológico (fls. 128/129/v.): - Percebe-se que as disputas do casal giram principalmente em torno de questões financeiras. Nenhum dos dois está satisfeito com os acordos anteriores, sentindo-se lesados. De um lado, [...] afirma ter sido lesada financeiramente por [...], tendo então entrado com processo para verificação, ele sente-se atacado com a iniciativa da ex-esposa, uma vez que afirma ter sempre cumprido seu acordo de manutenção integral dos filhos, além de oferecer a [...] uma vida confortável do ponto de vista econômico. - Os conflitos entre [...] e [...] se estendem desde antes de seu rompimento, e, neste momento, se perpetuam através das discussões relacionadas as questões financeiras e materiais. O litígio do casal acaba por impedir que eles consigam avaliar com maior isenção e clareza as reais necessidades de seus filhos. Enfim, o próprio [...] consignou que "preocupa-se com a possibilidade de uma guarda compartilhada, pois não quer 'ficar andando de um lado a outro'". Ante o exposto, voto por desprover a apelação. A jurisprudência desta Corte Superior possui entendimento no sentido de que a guarda compartilhada deve ser instituída independentemente da vontade dos genitores ou de acordo. Todavia, o instituto não prevalece quando seja capaz de gerar efeitos ainda mais negativos ao já instalado conflito, potencializando-o e colocando em risco o interesse da criança. Conforme trechos do acórdão recorrido acima destacados, o Tribunal local, analisando detidamente o acervo fático-probatório dos autos e considerando o melhor interesse dos menores, concluiu pela inviabilidade da guarda compartilhada. Em sendo assim, a reforma do julgado a quo demandaria o reexame de fatos e provas, prática vedada pela Súmula 7/STJ. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. GUARDA COMPARTILHADA. MELHOR INTERESSE DA MENOR. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Esta Corte Superior de Justiça entende que a guarda compartilhada deve ser instituída independentemente da vontade dos genitores ou de acordo; contudo, o instituto não deve prevalecer quando sua adoção seja passível de gerar efeitos ainda mais negativos ao já instalado conflito, potencializando-o e colocando em risco o interesse da criança. 2. O Tribunal de origem, analisando atentamente o contexto fático-probatório dos autos e considerando o interesse da menor, concluiu pela inviabilidade da guarda compartilhada. Assim, a pretensão recursal demandaria o reexame do acervo fático-probatório, o que é inviável em sede de recurso especial, conforme dispõe a Súmula 7/STJ. 3. Impossível conhecer da alegada divergência interpretativa, pois a incidência da Súmula 7 do STJ na questão controversa apresentada é, por consequência, óbice também para a análise do apontado dissídio, o que impede o conhecimento do recurso pela alínea c do permissivo constitucional. 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1355506/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 12/02/2019, REPDJe 26/02/2019, DJe 25/02/2019) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE GUARDA DOS MENORES. GUARDA COMPARTILHADA. IMPRESCINDIBILIDADE DE ATENDIMENTO AO MELHOR INTERESSE DOS FILHOS. GUARDA NÃO DEFERIDA NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. ALTERAÇÃO DESSE ENTENDIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Dispõe a jurisprudência desta Corte que a concessão da guarda compartilhada dos filhos entre os seus pais, havendo conflito entre estes, deve atender o princípio do melhor interesse do menor. 2. No caso, não há como alterar o acórdão recorrido - acerca da impossibilidade de deferimento da guarda compartilhada, porquanto não atendido o melhor interesse dos filhos das partes -, pois tal providência demandaria necessariamente o reexame dos fatos e das provas dos autos, o que não se admite no âmbito do recurso especial, ante a incidência da Súmula 7/STJ. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1330545/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/11/2018, DJe 16/11/2018) 2. Do exposto, com amparo no artigo 932 do CPC/15 c/c a Súmula 568/STJ, nego provimento ao agravo e, com base no art. 85, § 11, do CPC/15, majoro os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor já fixado na origem, em favor do patrono da parte agravada. Publique-se. Intimem-se. Brasília (DF), 25 de setembro de 2019. MINISTRO MARCO BUZZI Relator
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