terça-feira, 15 de maio de 2012

Operações Vegas e Monte Carlo

“ MEDIDA CAUTELAR NO HABEAS CORPUS 113.548 DISTRITO FEDERAL RELATOR :MIN. CELSO DE MELLO PACTE.(S) :CARLOS AUGUSTO DE ALMEIDA RAMOS IMPTE.(S) :MÁRCIO THOMAZ BASTOS E OUTRO(A/S) COATOR(A/S)(ES) :PRESIDENTE DA COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUÉRITO - OPERAÇÕES VEGAS E MONTE CARLO DECISÃO: Busca-se, com a presente impetração deduzida em favor do ora paciente, acesso aos "elementos informativos" constantes de procedimentos penais cujo teor foi compartilhado com a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito criada com apoio no Requerimento nº 01/2012 e instaurada com o objetivo de "(...) investigar,no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, práticas criminosas desvendadas pelas operações 'Vegas' e 'Monte Carlo', da Polícia Federal, com envolvimento do Senhor Carlos Augusto Ramos, conhecido vulgarmente como Carlinhos Cachoeira, e agentes públicos e privados, sem prejuízo da investigação de fatos que se ligam ao objeto principal, dentre estes a existência de um esquema de interceptações e monitoramento de comunicações telefônicas e telemáticas ao arrepio do princípio de reserva de jurisdição" (grifei). Constata-se, desde logo, que o paciente em questão, além de já se encontrar submetido a procedimento penal em curso perante o Poder Judiciário (Processo-crime nº 0009272-09.2012.4.01.3500 - 11ª Vara Federal de Goiânia/GO), ostenta a posição de figura central no inquérito parlamentar em referência, qualificando-se, por isso mesmo, como uma das pessoas sob investigação do próprio Congresso Nacional. Sustenta-se que a recusa de acesso aos "elementos de convicção" já produzidos e formalmente incorporados ao acervo probatório em poder da "Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - Operações Vegas e Monte Carlo"reveste-se de caráter potencialmente lesivo ao "status libertatis" do ora paciente, cujo direito de defesa restará alegadamente comprometido, com sérias implicações no plano processual penal. Os ora impetrantes enfatizam que "(...) não há como privar o paciente e seus advogados do inarredável direito de conhecer todos os elementos pelos quais CARLOS AUGUSTO é investigado", notadamente porque "(...) a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que investiga CARLOS AUGUSTO tenciona,de forma explícita, investigar os supostos delitos que teriam sido cometidos pelo paciente e sua pretensa organização criminosa", tudo em ordem a encaminhar, "(...) ao Ministério Público, para fins de responsabilização criminal, as conclusões advindas da investigação [legislativa] de tais alegadas infrações penais". Reconheço, desse modo, a adequação do meio processual ora utilizado, pois se busca, com o presente "writ" constitucional, proteção jurisdicional ao "status libertatis" do ora paciente, o que permite afastar eventual alegação de impropriedade do "habeas corpus", eis que, diversamente do que se decidiu no HC 75.232/RJ, Rel. p/ o acórdão Min. MAURÍCIO CORRÊA, não conhecido por esta Corte (porque, nele, se pretendia alvaguardar apenas "o direito à intimidade" de determinado paciente, alegadamente lesado por deliberação de Comissão Parlamentar de Inquérito, visa-se, no caso ora em exame, tornar efetivo o amparo ao direito de defesa (com projeção no plano processual penal) e à prerrogativa contra a autoincriminação, cujo desrespeito - ninguém o ignora – pode gerar consequências prejudiciais à liberdade de locomoção física daquele que sofre investigação por parte de órgãos estatais. Cabe acentuar, de outro lado, examinada a pretensão dos impetrantes na perspectiva da espécie ora em análise, que as Comissões Parlamentares de Inquérito, à semelhança do que ocorre com qualquer outro órgão do Estado ou com qualquer dos demais Poderes da República,submetem-se, no exercício de suas prerrogativas institucionais, às limitações impostas pela autoridade suprema da Constituição. Isso significa, portanto, que a atuação do Poder Judiciário, quando se registrar alegação de ofensa a direitos e a garantias assegurados pela Constituição da República, longe de configurar situação de legítima interferência na esfera de outro Poder do Estado, traduz válido exercício de controle jurisdicional destinado a amparar qualquer pessoa nas hipóteses de lesão, atual ou iminente, a direitos subjetivos reconhecidos pelo ordenamento positivo. Em uma palavra: uma decisão judicial - que restaura a integridade da ordem jurídica e que torna efetivos os direitos assegurados pelas leis e pela Constituição da República - não pode ser considerada um ato de indevida interferência na esfera do Poder Legislativo, consoante já o proclamou o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em unânime julgamento: “O CONTROLE JURISDICIONAL DE ABUSOS PRATICADOS POR COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO NÃO OFENDE O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. - A essência do postulado da divisão funcional do poder, além de derivar da necessidade de conter os excessos dos órgãos que compõem o aparelho de Estado, representa o princípio conservador das liberdades do cidadão e constitui o meio mais adequado para tornar efetivos e reais os direitos e garantias proclamados pela Constituição. Esse princípio, que tem assento no art. 2º da Carta Política, não pode constituir nem qualificar-se como um inaceitável manto protetor de comportamentos abusivos e arbitrários, por parte de qualquer agente do Poder Público ou de qualquer instituição estatal. - O Poder Judiciário, quando intervém para assegurar as franquias constitucionais e para garantir a integridade e a supremacia da Constituição, desempenha, de maneira plenamente legítima, as atribuições que lhe conferiu a própria Carta da República. O regular exercício da função jurisdicional, por isso mesmo,desde que pautado pelo respeito à Constituição, não transgride o princípio da separação de poderes. Desse modo, não se revela lícito afirmar, na hipótese de desvios jurídico-constitucionais nas quais incida uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que o exercício da atividade de controle jurisdicional possa traduzir situação de ilegítima interferência na esfera de outro Poder da República.” (RTJ 173/805-810, 806, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Esse entendimento tem sido por mim observado em diversos julgamentos que proferi nesta Suprema Corte e nos quais tenho sempre enfatizado que a restauração, em sede judicial, de direitos e garantias constitucionais lesados por uma CPI não traduz situação configuradora de ofensa ao princípio da divisão funcional do poder, como resulta claro de decisão assim ementada: “(...) O postulado da separação de poderes e a legitimidade constitucional do controle, pelo Judiciário, das funções investigatórias das CPIs, se e quando exercidas de modo abusivo. Doutrina. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. (...).” (HC 88.015-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, “in” Informativo/STF nº 416/2006) Assentadas tais premissas, passo a examinar o pleito cautelar deduzido pelos ora impetrantes. E, ao fazê-lo, reconheço ser densa a plausibilidade jurídica que resulta dos próprios fundamentos em que se apóia a presente impetração. Com efeito, a jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal, hoje consubstanciada na Súmula Vinculante nº 14, tem garantido, a qualquer pessoa sob investigação do Estado e, também, ao seu Advogado (não importando que se trate de inquérito policial, de inquérito parlamentar ou de processo penal), o direito de conhecer as informações já formalmente produzidas nos autos (excluídas, portanto, aquelas diligências ainda em curso de execução), não obstante se cuide de investigação promovida em caráter sigiloso. Por tal razão, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento definitivo do MS 23.452/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, deixou assentado, por unanimidade, “que os poderes das Comissões Parlamentares de Inquérito - precisamente porque não são absolutos - sofrem as restrições impostas pela Constituição da República e encontram limite nos direitos fundamentais do cidadão, que só podem ser afetados nas hipóteses e na forma que a Carta Política estabelecer” (grifei). O presente caso põe em evidência, uma vez mais , situação impregnada de alto relevo jurídico-constitucional, consideradas as graves implicações que resultam de injustas restrições impostas ao exercício, em plenitude, do direito de defesa e à prática, pelo Advogado, em nome de seu constituinte, das prerrogativas profissionais que lhe são inerentes (Lei nº 8.906/94 , art. 7º, incisos XIII e XIV). O Estatuto da Advocacia - ao dispor sobre o acesso do Advogado aos procedimentos estatais, inclusive àqueles que tramitem em regime de sigilo (hipótese em que se lhe exigirá a exibição do pertinente instrumento de mandato) - assegura-lhe, como típica prerrogativa de ordem profissional, o direito de examinar os autos, sempre em benefício de seu constituinte, em ordem a viabilizar, quanto a este, o exercício do direito de conhecer os dados probatórios já formalmente produzidos no âmbito da investigação instaurada por qualquer órgão do Poder Público. Impende enfatizar que o Advogado, atuando em nome de seu constituinte, possui o direito de acesso aos autos da investigação penal, policial ou parlamentar, ainda que em tramitação sob regime de sigilo, considerada a essencialidade do direito de defesa, que há de ser compreendido - enquanto prerrogativa indisponível assegurada pela Constituição da República - em perspectiva global e abrangente. É certo, no entanto, em ocorrendo a hipótese excepcional de sigilo – e para que não se comprometa o sucesso das providências investigatórias em curso de execução (a significar, portanto, que se trata de providências ainda não formalmente incorporadas ao procedimento de investigação) -, que o Advogado tem o direito de conhecer as informações “já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução das diligências em curso (...)” (RTJ 191/547-548, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - grifei). Os eminentes Advogados ALBERTO ZACHARIAS TORON e ALEXANDRA LEBELSON SZAFIR, em obra que versa, dentre outros temas, aquele ora em análise (“Prerrogativas Profissionais do Advogado”, p. 86, item n. 1, 2006, OAB Editora), examinaram, com precisão, a questão suscitada pela injusta recusa, ao Advogado investido de procuração (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIII), de acesso aos autos de inquérito policial, de inquérito parlamentar ou de processo penal que tramitem, excepcionalmente, em regime de sigilo, valendo rememorar, a esse propósito, a seguinte passagem: “No que concerne ao inquérito policial há regra clara noEstatuto do Advogado que assegura o direito aos advogados de,mesmo sem procuração, ter acesso aos autos (art. 7°, inc. XIV) e que não é excepcionada pela disposição constante do § 1° do mesmo artigo que trata dos casos de sigilo. Certo é que o inciso XIV do art. 7° não fala a respeito dos inquéritos marcados pelo sigilo. Todavia, quando o sigilo tenha sido decretado, basta que se exija o instrumento procuratório para se viabilizar a vista dos autos do procedimento investigatório. Sim, porque inquéritos secretos não se compatibilizam com a garantia de o cidadão ter ao seu lado um profissional para assisti-lo, quer para permanecer calado, quer para não se auto-incriminar (CF, art. 5°, LXIII). Portanto, a presença do advogado no inquérito e, sobretudo, no flagrante não é de caráter afetivo ou emocional. Tem caráter profissional, efetivo, e não meramente simbólico. Isso, porém, só ocorrerá se o advogado puder ter acesso aos autos. Advogados cegos, ‘blind lawyers’, poderão, quem sabe, confortar afetivamente seus assistidos, mas,juridicamente, prestar-se-ão, unicamente, a legitimar tudo o que no inquérito se fizer contra o indiciado.” (grifei). Vê-se, pois, que assiste, àquele sob investigação do Estado, o direito de acesso aos autos, por intermédio de seu Advogado, que poderá examiná-los, extrair cópias ou tomar apontamentos (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIV), observando-se, quanto a tal prerrogativa, orientação consagrada em decisões proferidas por esta Suprema Corte (HC 86.059- -MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO - HC 90.232/AM, Rel. Min.SEPÚLVEDA PERTENCE - Inq 1.867/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO -MS 23.836/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, v.g.), mesmo quando a investigação estatal (como aquela conduzida por uma CPI) estiver sendo processada em caráter sigiloso, hipótese em que o Advogado do investigado, desde que por este constituído, poderá ter acesso às peças que digam respeito à pessoa do seu cliente e que instrumentalizem prova já produzida nos autos, tal como esta Corte decidiu no julgamento do HC 82.354/PR, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE (RTJ 191/547-548): “Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado - interessado primário no procedimento administrativo do inquérito policial -, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado, de acesso aos autos respectivos, explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia (L. 8906/94, art. 7º, XIV), da qual - ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas - não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade. A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações. O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não asrelativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em conseqüência, a autoridade policial, de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório.” (grifei) Devo salientar, neste ponto, que assim tenho julgado nesta Suprema Corte, havendo proferido decisões nas quais assegurei, a pessoas submetidas a investigação pelo Poder Público, o direito de acesso a documentos, que, embora sob cláusula de sigilo, já haviam sido formalmente introduzidos nos autos da investigação estatal, considerado, para tanto, o postulado da comunhão da prova: “RECLAMAÇÃO. DESRESPEITO AO ENUNCIADO CONSTANTE DA SÚMULA VINCULANTE Nº 14/STF. PERSECUÇÃO PENAL INSTAURADA EM JUÍZO OU FORA DELE. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO OU PELO RÉU. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA PERSECUÇÃO PENAL (INQUÉRITO POLICIAL OU PROCESSO JUDICIAL) OU A ESTES REGULARMENTE APENSADOS. POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. RECLAMAÇÃO PROCEDENTE, EM PARTE. - O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de persecução penal, mesmo que sujeita, em juízo ou fora dele, a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito ou processo judicial. Precedentes. Doutrina.” (Rcl 8.770-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Esse mesmo entendimento foi por mim reiterado, quando do julgamento de pleito cautelar que apreciei em decisão assim ementada: “INQUÉRITO POLICIAL. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA INVESTIGAÇÃO PENAL. POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. - O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal. - O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de investigação penal, mesmo que sujeita a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito. Precedentes. Doutrina.” (HC 87.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 02/02/2007) Cumpre referir, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o HC 88.190/RJ, Rel. Min. CEZAR PELUSO, reafirmou o entendimento anteriormente adotado por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel.Min. CELSO DE MELLO - HC 87.827/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), em julgamento que restou consubstanciado em acórdão assim ementado: “ADVOGADO. Investigação sigilosa do Ministério Público Federal. Sigilo inoponível ao patrono do suspeito ou investigado. Intervenção nos autos . Elementos documentados. Acesso amplo. Assistência técnica ao cliente ou constituinte. Prerrogativa profissional garantida. Resguardo da eficácia das investigações em curso ou por fazer. Desnecessidade de constarem dos autos do procedimento investigatório. HC concedido. Inteligência do art. 5°, LXIII, da CF, art. 20 do CPP, art. 7º, XIV, da Lei nº 8.906/94, art. 16 do CPPM, e art. 26 da Lei nº 6.368/76. Precedentes. É direito do advogado, suscetível de ser garantido por habeas corpus, o de, em tutela ou no interesse do cliente envolvido nas investigações, ter acesso amplo aos elementos que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária ou por órgão do Ministério Público, digam respeito ao constituinte.” (grifei) O que não se revela constitucionalmente lícito, segundo entendo, é impedir que o investigado (ou o réu, quando for o caso) tenha pleno acesso aos dados probatórios, que, já documentados nos autos (porque a estes formalmente incorporados), veiculem informações que possam revelar-se úteis ao conhecimento da verdade real e à condução da defesa da pessoa investigada ou processada pelo Estado, não obstante o regime de sigilo excepcionalmente imposto ao procedimento de persecução penal ou de investigação estatal. Tenho enfatizado, nesta Suprema Corte, em inúmeras decisões, que o fascínio do mistério e o culto ao segredo não devem estimular, no âmbito de uma sociedade livre, práticas estatais cuja realização, notadamente na esfera da persecução instaurada pelo Poder Público, culmine em ofensa aos direitos básicos daquele que é submetido, pelos órgãos e agentes do Poder, a atos de investigação, valendo relembrar, por oportuno, a advertência de JOÃO BARBALHO feita em seus comentários à Constituição Federal de 1891 (“Constituição Federal Brasileira - Comentários”, p. 323/324, edição fac-similar, 1992, Senado Federal): “O pensamento de facilitar amplamente a defesa dos acusados conforma-se bem com o espírito liberal das disposições constitucionais relativas à liberdade individual, que vamos comentando. A lei não quer a perdição aqueles que a justiça processa; quer só que bem se apure a verdade da acusação e, portanto, todos os meios e expedientes de defesa que não impeçam o descobrimento dela devem ser permitidos aos acusados. A lei os deve facultar com largueza, regularizando-os para não tornar tumultuário o processo. Com a ‘plena defesa’ são incompatíveis, e, portanto, inteiramente inadmissíveis, os processos secretos, inquisitoriais, as devassas, a queixa ou o depoimento de inimigo capital, o julgamento de crimes inafiançáveis na ausência do acusadoou tendo-se dado a produção das testemunhas de acusação sem ao acusado se permitir reinquiri-las, a incomunicabilidade depois da denúncia, o juramento do réu, o interrogatório dele sob a coação de qualquer natureza, por perguntas sugestivas ou capciosas, e em geral todo o procedimento que de qualquer maneira embarace a defesa. Felizmente, nossa legislação ordinária sobre a matéria realiza o propósito da Constituição, cercando das precisas garantias do exercício desse inauferível direito dos acusados -para ela ‘res sacra reus’” (grifei) Tal como decidi no MS 24.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO (Informativo/STF nº 331), cumpre enfatizar, por necessário, que os estatutos do poder, numa República fundada em bases democráticas, não podem privilegiar o mistério. Em conclusão: (a) a investigação parlamentar, por mais graves que sejam os fatos pesquisados pela Comissão de Inquérito (CPI), não pode desviar-se dos limites traçados pela Constituição nem transgredir as garantias, que, decorrentes do sistema normativo, foram atribuídas à generalidade das pessoas, físicas e/ou jurídicas; (b) a unilateralidade do procedimento de investigação parlamentar não confere, à CPI, o poder de negar, em relação ao indiciado, determinados direitos e certas garantias que derivam do texto constitucional ou de preceitos inscritos em diplomas legais; (c) o indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897); (d) no contexto do sistema constitucional brasileiro, a unilateralidade da investigação parlamentar - à semelhança do que ocorre com o próprio inquérito policial - não tem o condão de abolir direitos, de derrogar garantias, de suprimir liberdades ou de conferir, à autoridade pública (investida, ou não, de mandato eletivo), poderes absolutos na produção da prova e na pesquisa dos fatos; (e) a exigência de respeito aos princípios consagrados em nosso sistema constitucional não frustra nem impede o exercício pleno, por qualquer CPI, dos poderes investigatórios de que se acha investida; e (f) o sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso ao inquérito (parlamentar, policial ou administrativo), mesmo que sujeito a regime de sigilo (sempre excepcional), desde que se trate de provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, consequentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito ou processo judicial. Sendo assim, em face das razões expostas e considerando, sobretudo, a presença cumulativa, na espécie, dos requisitos concernentes à plausibilidade jurídica e ao “periculum in mora”, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a suspender, cautelarmente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, o comparecimento e a inquirição de Carlos Augusto de Almeida Ramos perante a “Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - Operação Vegas e Monte Carlo”, sustando-se, em consequência, e unicamente quanto a ele, o depoimento já designado para o próximo dia 15/05/2012. 2. Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presentedecisão, para efeito de seu integral cumprimento, ao Senhor Presidente da CPMI - “Operações Vegas e Monte Carlo”. Permito que os impetrantes comuniquem o teor desta decisão, mediante exibição da respectiva cópia, para efeito de cumprimento da liminar nela referida, ao Senhor Presidente da "Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - Operações Vegas e Monte Carlo”, ou a quem estiver no exercício da Presidência de mencionado órgão de investigação parlamentar. Publique-se. Brasília, 14 de maio de 2012 (19h30). Ministro CELSO DE MELLO Relator”. Fonte: >http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2008941.<. Acesso: 15/05/2012

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