“A Defensoria Pública de SP, com apoio da Secretaria de Estado de
Administração Penitenciária (SAP) e da Pastoral Carcerária, desenvolve o
projeto “Mães do Cárcere”, que pretende identificar e atender mães e
gestantes sob custódia nos presídios do Estado.
O projeto prevê visitas de Defensores Públicos e Agentes
Psicossociais da instituição a unidades prisionais de São Paulo, geridas
pela SAP. Durante as visitas, são realizados atendimentos jurídicos,
inspeção de condições de encarceramento e coleta de dados sobre a situação
dos filhos das mulheres presas. A partir dos dados colhidos, será possível
traçar estratégias de atuação para garantir a convivência familiar entre
presas e seus filhos.
Inicialmente, em fase experimental, o projeto promove visitas ao Centro
de Detenção Provisória Feminino de Franco da Rocha e a Penitenciária
Feminina de Sant’Ana, ambos na Capital. No âmbito da Defensoria Pública, 3 Núcleos Especializados da
instituição estão envolvidos: Situação Carcerária, Infância e Juventude e
Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher.
O projeto decorre de demandas levantadas pela Pastoral Carcerária,
que culminou em um seminário realizado em agosto de 2011, na sede do
Tribunal de Justiça do Estado (TJ-SP). Promovido pela Defensoria, em
parceria com especialistas, juristas, integrantes do Executivo e da
sociedade, o evento teve o objetivo de discutir caminhos para a garantia da
convivência familiar de mulheres presas e seus filhos. A intenção era
encontrar alternativas para que o laço familiar e afetivo entre eles não
fosse rompido com o encarceramento das mulheres.
A partir do seminário, o projeto “Mães do Cárcere” ganhou forma, e
em maio de 2012, Defensores Públicos e Agentes Psicossociais iniciaram as
visitas a estabelecimentos prisionais, além de levarem questionários para
entrevistas e cadastramento.
Após 5 meses de visitas, o projeto identificou alguns números: de
1.627 mulheres presas no Centro de Detenção Provisória Feminino de Franco
da Rocha, 899 são mães e outras 141 gestantes (ou com indícios). No total,
essas mulheres possuem 2.413 filhos, sendo que 80% deles estão sob a guarda
de familiares. Na Penitenciária Feminina de Sant’Ana apenas as mulheres que
ingressaram na unidade entre maio e julho de 2012 foram entrevistadas.
Desse total, foram identificadas 187 mães, que possuem 430 filhos – desses,
77% estão sob a guarda de familiares. Os dados são coletados pela própria
SAP por meio de formulários e enviados à Defensoria Pública.
Destituição do poder familiar
O projeto “Mães do Cárcere” identificou inicialmente 73 casos de
mães que se separam dos filhos após a prisão e nunca mais tiveram contato
com as crianças. Em casos como esse, muitas vezes é instaurado um processo
para que seja destituído o poder familiar – o que significa cortar o
vínculo jurídico entre mãe e criança e encaminhá-la para adoção. Muitas vezes,
quando esse procedimento é adotado, as mães sequer são ouvidas pelo Juiz
responsável no respectivo processo.
Para o Coordenador do Núcleo de Infância e Juventude da Defensoria,
Defensor Diego Vale, o projeto irá evitar que os filhos de mulheres presas
sejam disponibilizados para adoção sem a anuência das mães. “A Defensoria
recebe denúncias de que o poder familiar dessas mães presas são destituídos
sem que elas tenham conhecimento disso. Estamos falando de crianças, que
possuem famílias; muitas vezes, parentes da mãe têm capacidade e interesse
em cuidar delas durante o período de aprisionamento. Se elas são adotadas
por outras pessoas, os verdadeiros pais podem jamais descobrir seu
paradeiro”, diz.
Um dos casos acompanhado pelo projeto é o de Kiara Uche e de seu
filho Piter Uche (ambos são nomes fictícios). Kiara é nigeriana e está
reclusa na Penitenciária Feminina de Sant’Ana desde o início do ano. Após
ser presa, ela foi obrigada a se separar do seu filho, na época com apenas
3 meses. A criança foi levada para um abrigo na periferia da Capital; todos
os familiares da mãe estão na Nigéria. Desde então, Kiara jamais teve
contato com o garoto.
Durante uma visita do projeto à Penitenciária, Kiara relatou seu
drama a um dos Agentes Psicossociais da Defensoria. Segundo ela, uma amiga
brasileira chamada Denise (nome fictício), que mora em São Paulo, estaria
disposta a cuidar de Piter até que a questão penal de Kiara fosse
finalizada. Defensores Públicos e Agentes Psicossociais da Defensoria
atenderam Denise e confirmaram seu interesse em cuidar da criança na
ausência da mãe. No final de setembro, a Defensoria formalizou um pedido ao
Judiciário, em nome de Denise, para que ela pudesse ter a guarda de Piter
na ausência de Kiara. A Justiça ainda analisa o pedido.
Gestação e amamentação em presídios
O projeto “Mães do Cárcere” também acompanha casos de mulheres
presas que estão grávidas ou que possuem filhos recém nascidos.
O Coordenador Auxiliar do Núcleo de
Situação Carcerária da Defensoria, Defensor Bruno Shimizu, aponta que, em
casos assim, o Código de Processo Penal prevê a possibilidade de que a
detenção em estabelecimento prisional seja substituída por prisão
domiciliar, em consideração ao ambiente de amamentação e criação do bebê.
“De acordo com a legislação vigente, todas as mulheres presas lactantes,
com gestação acima de 7 meses, com gravidez de risco ou que possuem filhos
dependentes menos de 6 anos podem ter a prisão em regime fechado
substituída por prisão domiciliar”, aponta.
Bruno Shimizu lamenta o fato de que poucas mulheres nessas condições
tenham esse direito assegurado: “o Judiciário é refratário a esses pedidos,
raramente obtemos uma decisão favorável”, disse. Entretanto, o projeto tem
obtido algumas concessões para que o local de cumprimento de prisão seja
substituído pela casa da presa ou por uma outra instituição. É o caso de
Juliana Santos (nome fictício).
Juliana relatou em um dos formulários do projeto que acabara que dar
à luz a uma criança e apontou que o local onde cumpria pena não propiciava
condições adequadas para a amamentação. Após uma visita e a constatação das
condições locais, a Defensoria impetrou um habeas corpus solicitando que a
mãe cumprisse a pena em regime domiciliar durante o período de aleitamento.
O pedido foi concedido pelo TJ-SP, após ser indeferido em primeira
instância. Hoje, mãe e filha estão em casa”.
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