sábado, 16 de junho de 2012

Audiência Preliminar de Justificação.



Nome: Aluísio Iunes Monti Ruggeri Ré

Área de Atividade: Cível, Família, Fazenda Pública, Infância e Juventude Não-Infracional e Tutela Coletiva

REGIONAL: Ribeirão Preto
Endereço: Rua Alice Além Saadi,  nº 1256

Bairro: Nova Ribeirânia

Cidade: Ribeirão Preto
Telefone: 
16-3965-3882 
                                                    
Fax




SÚMULA: “É obrigatória a designação de audiência preliminar de justificação (art. 804 do CPC), nas hipóteses de pedido liminar de qualquer tutela de urgência na defesa de direitos fundamentais, quando o juiz entender por insuficientes as provas documentais apresentadas e a prova oral apresenta-se útil e adequada à apreciação da medida urgente pleiteada”.


ÁREA: Cível.


ASSUNTO:

            A tese em tela tem por objetivo assegurar uma tutela jurisdicional adequada, efetiva e célere nas hipóteses de necessária proteção dos direitos fundamentais, mormente quando o decurso do tempo puder agravar os efeitos dessa concreta violação, e as provas documentais contidas nos autos forem insuficientes à demonstração dos pressupostos necessários à concessão das tutelas urgentes (tutela antecipada ou tutela cautelar), hipótese em que o juiz, antes de indeferir o pedido, deve designar audiência de justificação, para que a parte demandante, com ou sem a presença da parte contrária, a partir de provas orais, possa justificar a necessidade desse provimento jurisdicional liminar.
            Em outras palavras, nas hipóteses de potencial violação aos direitos fundamentais, como ao direito à vida, à saúde, à liberdade, deve o juiz, antes de indeferir o pedido de tutela de urgência por insuficiência probatória, permitir que o requerente, a partir de provas orais, demonstre o alegado, como garantia de um provimento jurisdicional adequado, pertinente, efetivo e célere, ou seja, como garantia de efetivo acesso à Justiça.
            Para ilustrar a questão, narramos o atendimento a uma assistida que teve seu plano de saúde extinto por inadimplemento de uma das parcelas mensais, sendo tal consumidora pessoa idosa e doente (mal de Alzheimer), que deixara de efetuar o pagamento por simples esquecimento (caso fortuito), fato comum em pacientes desse tipo, mas que necessitava, com urgência, de assistência médica intensiva e constante. Diante desse contexto, propusemos ação judicial para a manutenção do contrato, com fundamento na escusabilidade da mora, e pedimos, em tutela antecipada, a obrigação de prestar assistência médica contra a empresa operadora do plano de saúde. O juiz, por sua vez, sob alegação de falta de provas em relação à ocorrência do caso fortuito (esquecimento em razão dos sintomas causados pelo mal de Alzheimer), simplesmente indefere o pedido liminar, sem, contudo, buscar outros elementos para sua convicção.
            Ora, o caso traz em seu bojo o direito à vida e à saúde e merece uma atenção especial. Se a falta de provas documentais levaria ao indeferimento da tutela urgente, de rigor, como medida de efetivo acesso à Justiça (ou à ordem jurídica justa e efetiva), a busca por outras provas, no caso, provas orais, a partir de audiência específica a ser designada, intimando-se ou não a parte contrária.
            Em suma, a proposta em questão sugere que o Defensor Público, diante de violações aos direitos fundamentais, busque a tutela mais adequada e célere, com o esgotamento dos meios de prova, ainda que em fase de cognição sumária.

INDICAÇÃO DO ITEM ESPECÍFICO RELACIONADO ÀS ATRIBUIÇÕES INSTITUCIONAIS DA DEFENSORIA PÚBLICA:

            Artigo 5°, incisos I, III e IX da Lei Complementar Estadual n° 988 de 9 de Janeiro de 2008.
            Artigo 4º, incisos I, V e X da Lei Complementar nº 80 de 1994.

FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA:

            Em tese, a audiência de justificação foi concebida para a produção de provas orais, em fase liminar, nos processos cautelares, para a comprovação do fumus boni iuris e do periculum in mora, conforme dispõe o artigo 804 do CPC: “É lícito ao juiz conceder liminarmente ou após justificação prévia a medida cautelar, sem ouvir o réu, quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz (...)”.
            Porém, em busca de uma tutela efetiva, propomos a possibilidade/necessidade dessa audiência preliminar em toda e qualquer hipótese de tutela de urgência, seja ela de natureza cautelar (art. 796 e seguintes do CPC), seja de natureza de tutela antecipada (art. 273 CPC), para a complementação probatória acerca dos pressupostos indispensáveis à sua concessão.
            E nessa busca pelo ideal de efetivo acesso à Justiça, nos apoiamos em princípios estruturantes do moderno direito processual: o princípio da primazia da proteção aos direitos fundamentais, o ativismo judicial, princípio da colaboração no processo, princípio da flexibilidade procedimental, princípio da adequação, dentre outros.
            No Brasil, o constituinte originário enunciou, já no preâmbulo da CF/88, como elemento formal de aplicabilidade a instituição de um Estado Democrático de Direito destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça. Essa opção em adotar o princípio democrático é reafirmada no artigo 1º do texto constitucional, que o estabelece como fundamento do Estado brasileiro. O emprego do termo “democracia” como qualificativo de “Estado” possibilita a irradiação dos seus efeitos sobre todos os componentes constitutivos do Estado, inclusive sobre a ordem jurídica estabelecida, que a recebe como componente de transformação do status quo. Por ser impossível afirmar o princípio democrático sem permitir que o Direito, por ele imantado, se enriqueça do sentir popular e se ajuste ao interesse coletivo, a CF/88 abre perspectivas para a sua concretização em um Estado de Direito com função prospectiva de modificação social por meio do império da lei comprometida com o ideal de Justiça.
            Por oportuno, faz-se imperioso para o presente estudo apontar os contornos principais do Estado Brasileiro que, por suas peculiaridades, revela um Estado Constitucional de Direito sui generis. Dentre as notas distintivas que podem ser apresentadas, encontramos os fundamentos deste Estado, que são elencados no artigo 1° da CF/88, a saber: a soberania (inciso I), a cidadania  (inciso II), a dignidade da pessoa humana (inciso III), os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (inciso IV) e o pluralismo político (inciso V). Pela leitura dos dispositivos retro, é possível traçar o ponto central de nossa democracia: o respeito à pessoa humana em sentido universal, considerando o homem como o “valor fonte” de todos os valores. Dessa estrutura constitucional decorre a necessidade de proteção dos direitos fundamentais.
            Ocorre, porém, que a proteção desses direitos não prescinde de uma tutela jurisdicional acessível, justa, célere e efetiva, cujos contornos são traçados pela própria Constituição Federal. Cândido Rangel Dinamarco, dimensionando o processo na ordem constitucional, afirma que “a tutela constitucional do processo tem o significado e escopo de assegurar a conformação dos institutos do direito processual e o seu funcionamento aos princípios que descendem da própria ordem constitucional” (A instrumentalidade do Processo. 13 ed. São Paulo: Malheiros, 2008. P.25 e seguintes). Nesse sentido, importante citar a contribuição de Nelson Nery Júnior no desenvolvimento dos princípios constitucionais processuais, que poderiam ser assim enumerados: devido processo legal (CF, art. 5º, LIV); isonomia (CF, art. 5º, caput); inafastabilidade do controle jurisdicional (direito de ação) (CF, art. 5º, XXXV); contraditório (CF, art. 5º, LV); proibição de prova ilícita (art. 5º, XII); publicidade dos atos processuais (CF, art.5º, IX e 93, IX); duplo grau de jurisdição; e motivação das decisões judiciais (CF, art. 93, IX) (Princípios do processo civil na Constituição Federal, 7.Ed. Revista dos Tribunais).
            É certo que, até mesmo por uma questão terminológica, os princípios estão atrelados à idéia de “início”, “fonte”, “base” ou “estrutura fundante”. Há uma proximidade entre o conceito de princípio e a idéia de Direito: princípios possuem um caráter de fundamentalidade, são fontes primeiras do Direito, externam uma natureza normogenética, na medida em que estão na base ou constituem a ratio das regras jurídicas. Pode-se ainda afirmar, que os princípios possuem um caráter de primariedade (porque precedem materialmente às demais normas), originalidade e superioridade. Em uma acepção sistêmica do Direito, pode-se dizer que os princípios “conformam o sistema (...) bases axiológicas estruturantes, positivadas ou não, que delimitam e dotam de racionalidade sistêmica determinado ordenamento jurídico” (ROTHENBURG, Walter Claudius. Princípios Constitucionais. 2. ed. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2003).
            Aliás, novos princípios processuais são concebidos nessa busca pela efetiva tutela jurisdicional, quais sejam: o princípio do ativismo judicial, a princípio da adequação e o princípio da efetividade.
            Sobre o primeiro, Cândido Rangel Dinamarco afirma, em uma de suas obras dedicadas ao estudo das Instituições de Direito Processual Civil, que o “juiz mudo tem também algo de Pilatos e, por temor ou vaidade, afasta-se do compromisso de fazer justiça.” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Volume 1. p.224-225).
            José Roberto Bedaque aponta como precursor doutrinário do embate ao imobilismo judicial Alexandre Gusmão. Já em 1922, o jurista invocava estudos das legislações alemã, austríaca e húngara para defender a possibilidade do juiz ordenar, de ofício, qualquer diligência necessária à apuração dos fatos, sempre que disso dependesse a resolução do processo. Estas idéias foram incorporadas na Exposição de Motivos do Código de Processo Civil de 1939, que afirmou caber ao juiz a direção do processo, podendo, inclusive, intervir no processo de maneira que este atinja, pelos meios adequados, o objetivo de investigação dos fatos e descoberta da verdade (Poderes instrutórios do Juiz. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. P.73).
            Quanto ao princípio da adequação, processo e procedimento devem então ser adequados a amparar os interesses judicializados, sob pena de ter esvaída a sua finalidade. Sobre esse princípio, lembramos estudo realizado por Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr. Eles o dividem em dois sub-princípios: o da adaptação e o da adaptabilidade. O sub-princípio da adaptação se refere à atividade do legislador ao prever procedimentos e ritos diversos para os variados tipos de direitos a serem tutelados. Nesse sentido, identificamos na previsão das tutelas de urgência, cuja congnição sumária atende à necessária urgência do caso concreto. Já o sub-princípio da adaptabilidade destina-se ao operador e construtor do direito, vislumbrando hipótese para que ele molde e lapide o rito legal à hipótese concreta, atendendo, assim, às peculiaridades do interesse a ser tutelado e, com isso, garantindo a máxima efetividade da tutela pretendida. Aliás, exatamente nesse segundo sentido, encontramos o fenômeno da flexibilização procedimental, e como exemplo, defendemos a possibilidade/necessidade de realização de audiência de justificação quando da apreciação dos pressupostos da tutela liminar, para a adequada complementação probatória, mormente quando envolver a proteção aos direitos fundamentais:
O caminho mais seguro é a simplificação do procedimento, com a flexibilização das exigências formais, a fim de que possam ser adequadas aos fins pretendidos ou até ignoradas, quando não se revelarem imprescindíveis em determinadas situações. O sistema jurídico não pode ser concebido como uma camisa-de-força, retirando do juiz a possibilidade de adoção de soluções compatíveis com as especificidades de cada processo. (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do Processo e Técnica Processual. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p.51).

            No tocante à efetividade, notamos que seu conceito traz em seu bojo a concretização de algo. Este “algo”, em processo civil, é a própria tutela jurisdicional do direito material questionado. Para Luiz Guilherme Marinoni:
A tutela jurisdicional, quando pensada na perspectiva do direito material, e dessa forma como tutela jurisdicional dos direitos, exige a resposta a respeito do resultado que é proporcionado pelo processo no plano de direito material. A tutela jurisdicional do direito pode ser vista como a proteção da norma que o institui. Trata-se da atuação concreta da norma por meio da efetivação da utilidade inerente ao direito material nela consagrado. Como direito à efetividade da tutela jurisdicional deve atender ao direito material, é natural concluir que o direito à efetividade engloba o direito à pré-ordenação de técnicas processuais capazes de dar respostas adequadas às necessidades que dele decorrem. [grifo nosso] (MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos diretos. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. P.114 e 115).
             
            Aliás, pondera José Carlos Barbosa Moreira sobre a efetividade do processo: “Qualquer instrumento será bom na medida em que sirva de modo prestimoso à consecução dos fins da obra a que se ordena: em outras palavras, na medida em que seja efetivo. Vale dizer: será efetivo o processo que constitua instrumento eficiente de realização do direito material” (MOREIRA, José Carlos B. Por um processo socialmente efetivo. In Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil. Porto Alegre: Síntese, 2001, nº 11, p.5).
            Portanto, a tutela jurisdicional dos direitos fundamentais exige do Juiz um ativismo responsável e dos postulantes, incluindo o Defensor Público, uma postura ostensiva e criativa.
            O Código de Processo Civil de 1973, ainda influenciado pelo ideal liberal-individualista de proteção ao patrimônio, prevê tal audiência na apreciação da liminar nas ações possessórias: “Se a petição inicial não traz provas suficientes para justificar a expedição de mandado liminar de posse, deve o juiz cumprir o que dispõe a segunda parte do art. 928 do CPC e determinar a realização de audiência de justificação prévia com o fim de permitir ao autor a oportunidade de comprovar suas alegações” (STJ, REsp 900534/RS).
            Ocorre que a Constituição Federal estabelece novo plano axiológico, menos vinculado à propriedade e mais focado na dignidade da pessoa humana.
            Portanto, a tese da obrigatoriedade da audiência de justificação, nos processos que veiculam a proteção de direitos fundamentais, para a complementação probatória, atende exatamente aos ditames dessa tutela mais efetiva, justa, célere e adequada do ser humano.      

FUNDAMENTAÇÃO FÁTICA:

            Caso acolhida a presente tese, o Defensor Público, que diariamente atende a casos de violação ou ameaça a direitos fundamentais, deverá, em hipóteses de urgência, pleitear a concessão de tutelas emergências em cognição sumária, mas não precária.
            Em outros termos, deve o Defensor Público buscar a completude probatória de elementos suficientes à apreciação das tutelas de urgência, sendo imprescindível a colheitas de provas orais, desde que úteis, antes do juiz pronunciar eventual indeferimento dessa medida por simples falta de provas quanto aos seus pressupostos. 

SUGESTÃO DE OPERACIONALIZAÇÃO:

            Como sugestão de aplicação da tese acima exposta, deve o Defensor Público pleitear a concessão da tutela antecipada em ações de conhecimento ou da medida liminar em ações cautelares e, subsidiariamente, caso houver necessidade, diante da urgência do caso concreto, pleitear a designação de audiência preliminar de justificação para a colheita de provas orais para, somente após esse ato, apreciar o pedido da tutela de urgência.
            Caso o juiz indefira, de imediato, a tutela pretendida, deve-se utilizar do agravo de instrumento para a reforma desse pronunciamento e concessão da tutela urgente ou, subsidiariamente, requerer a anulação dessa decisão inicial, por cerceamento de defesa e violação do direito de ação, para determinar a realização da audiência preliminar de justificação.  
(...) Em tese, a audiência de justificação foi concebida para a produção de provas orais, em fase liminar, nos processos cautelares, para a comprovação do fumus boni iuris e do periculum in mora, conforme dispõe o artigo 804 do CPC: “É lícito ao juiz conceder liminarmente ou após justificação prévia a medida cautelar, sem ouvir o réu, quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz.
            Porém, em busca de uma tutela efetiva, propomos a possibilidade/necessidade dessa audiência preliminar em toda e qualquer hipótese de tutela de urgência, seja ela de natureza cautelar (art. 796 e seguintes do CPC), seja de natureza de tutela antecipada (art. 273 CPC), para a complementação probatória acerca dos pressupostos indispensáveis à sua concessão.
            E nessa busca pelo ideal de efetivo acesso à Justiça, nos apoiamos em princípios estruturantes do moderno direito processual: o princípio da primazia da proteção aos direitos fundamentais, o ativismo judicial, princípio da colaboração no processo, princípio da flexibilidade procedimental, princípio da adequação, dentre outros”.


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