""Está em andamento desde julho deste ano o curso “O Poder
Judiciário e a Copa do Mundo de 2014” promovido pela Escola Paulista da
Magistratura. Ele prossegue até março de 2013 com várias palestras programadas
envolvendo os temas de interesse para a realização da Copa do Mundo de 2014,
tais como o exame das políticas públicas para o evento, a questão da segurança
pública, o trato dos turistas, a resolução dos conflitos pelo Poder Judiciário,
os direitos e deveres dos consumidores torcedores etc.
No dia 27 de agosto p.p., eu tive oportunidade
de proferir uma das palestras tratando dos direitos do consumidor
torcedor e da aplicação das normas constitucionais de interesse, da Lei
Geral da Copa, do Estatuto do Torcedor e do Código de Defesa do Consumidor. Eu
ainda voltarei ao assunto aqui nesta coluna, mas, hoje, quero trazer um tema
para nossa reflexão, com a seguinte pergunta: Tem o consumidor torcedor direito
de pagar para assistir os jogos de futebol que sejam disputados e decididos de
forma verdadeira? Tem ele direito a que as pelejas tenham resultados justos?
Isto é, que quando o gol é feito em impedimento seja anulado, que as faltas
sejam corretamente marcadas, que o gol feito com a mão não seja convalidado?
Trago esse assunto à baila, em função da
polêmica dos últimos dias envolvendo o gol de mão anulado pelo árbitro
Francisco Carlos Nascimento. Como
é de conhecimento geral, falo do caso envolvendo o jogo entre o Palmeiras e o
Internacional de Porto Alegre. O placar estava 2 a 1 para o Inter quando o
jogador Barcos do Palmeiras fez um gol com a mão. O árbitro, num primeiro
momento, assinalou o gol, mas voltou atrás após alguns minutos, atendendo
orientação, segundo consta, do quarto árbitro Jean Pierre Gonçalves. Este
teria sido alertado pelo delegado da partida. Mas, a acusação é a de que o gol
somente foi anulado por informações de terceiro ou uso de tecnologia – o que é
proibido na questão.
Independentemente do resultado da polêmica –
que aqui neste espaço não importa – quero voltar ao assunto da Justiça e da
verdade nos jogos de futebol e do incrível atraso desse esporte no uso da
tecnologia. Aliás, sempre que esse tipo de discussão surge, pergunta-se: Por
que será que a Fifa insiste em manter-se na pré-história tecnológica?
No caso do jogo citado, ninguém duvida que o
gol foi de mão. Logo, ele não deveria valer de modo algum. No entanto, pelas
regras vigentes não só ele pode valer, como se pode até lutar para que
ele valha, ainda que todo mundo veja clara e abertamente que foi feito com a
mão!
Como já tive oportunidade de
tratar aqui nessas linhas, a Fifa – a dona do negócio futebol – é uma enorme
corporação multimilionária, que se utiliza dos mais modernos métodos existentes
no mercado para promover seus eventos, lançando mão do que existe de mais
avançado em termos de tecnologia: de venda, de distribuição, de marketing, de
transmissão dos jogos etc. Todavia, paradoxalmente, mantém em funcionamento um
esporte no qual vigem regras antigas que não são submetidas ao mais simples
elemento da tecnologia como,por exemplo, o uso de câmaras e “tira-teimas” para
a aferição de infrações e gols. Algo que pode ser feito sem muito transtorno ao
espetáculo. Por que será?
Uma teoria conhecida, e que também aqui
já referi, diz que a não modernização do jogo de futebol nada tem a ver
com seu movimento e com o espetáculo, mas sim com a perda do poder de manipulação.
Afinal, se não se puder mais dar gols impedidos, anular gols legítimos,
expulsar jogadores indesejados etc., perder-se-á uma boa maneira de interferir
nos resultados.
Mas, como a Fifa é a dona soberana do
espetáculo, quem pode reclamar? Talvez os consumidores torcedores. Quem sabe um
dia eles se cansem e resolvam formar um movimento visando fazer com que a
verdade e a Justiça finalmente cheguem via tecnologia aos estádios de futebol.
Oscar Wilde diz, com sua conhecida
ironia, que “é só quando ao recusar pagarmos nossas faturas que podemos
assegurar nossa sobrevivência na memória das classes comerciantes”.
Parafraseando-o, podemos dizer que será apenas quando os torcedores deixarem de
ir aos estádios e também desligarem os aparelhos de tevê na hora dos
jogos que conseguirão ver vencerem os times que merecem vencer por sua
competência e garra. Isso é direito do consumidor torcedor. Ele deve poder
garantir para si e para o time que ama e para o qual torce, gastando seu tempo
e seu dinheiro, que os jogos sejam limpos e que ganhe o melhor, sem
interferência espúria de quem quer que seja e sem manipulação dos resultados
com marcação de infrações inexistentes, validação de gols feitos fora da regra
etc.
Naturalmente, a implementação de tecnologia no
jogo de futebol não deverá ser capaz de atrapalhar o espetáculo. O árbitro
continuará a exercer suas funções junto com seus auxiliares, mas apenas
tirar-se-á dele o poder imperial. Não se pode esquecer de que ele é humano e
como tal pode errar ou, pior, agir de má fé.
Lembro, como disse anteriormente, que a
questão é que, no fundo, o princípio vigente no futebol não é o da busca da
verdade, mas apenas e tão somente o da autoridade do árbitro. Este, intocável
em suas decisões dentro do gramado, transforma sangue em água; areia em ouro. É
um mágico. Capaz de mudar o real. Ou uma espécie de ditador nomeado e aceito.
Quando vieram os vídeos, com os tira-teimas e
repetições, pensava-se que as coisas mudariam, porque o árbitro teria
contra si o fato real para demonstrar seu erro, mas nada mudou. Permanece o
regime autoritário de permitir que o árbitro modifique o real a seu bel prazer,
doa a quem doer. E, olhe que, em tempos atuais, isso pode significar muitos
milhões de reais ou dólares, porque a mudança de um único resultado pode
impedir ou levar um time à final de um campeonato importante; ou a um torneio
importante, valorizar o depreciar clubes, técnicos e jogadores etc. É, de fato,
muito poder concentrado com alto grau de permissividade.
De minha parte, repito: Espero que haja, algum
dia, pressão suficiente da opinião pública, especialmente dos consumidores
torcedores, para que o futebol passe a ser um jogo mais real e honesto. A
tecnologia ajudará, sem tirar a graça do espetáculo.
“Está em andamento desde julho deste ano o curso “O Poder
Judiciário e a Copa do Mundo de 2014” promovido pela Escola Paulista da
Magistratura. Ele prossegue até março de 2013 com várias palestras programadas
envolvendo os temas de interesse para a realização da Copa do Mundo de 2014,
tais como o exame das políticas públicas para o evento, a questão da segurança
pública, o trato dos turistas, a resolução dos conflitos pelo Poder Judiciário,
os direitos e deveres dos consumidores torcedores etc.
No dia 27 de agosto p.p., eu tive oportunidade
de proferir uma das palestras tratando dos direitos do consumidor
torcedor e da aplicação das normas constitucionais de interesse, da Lei
Geral da Copa, do Estatuto do Torcedor e do Código de Defesa do Consumidor. Eu
ainda voltarei ao assunto aqui nesta coluna, mas, hoje, quero trazer um tema
para nossa reflexão, com a seguinte pergunta: Tem o consumidor torcedor direito
de pagar para assistir os jogos de futebol que sejam disputados e decididos de
forma verdadeira? Tem ele direito a que as pelejas tenham resultados justos?
Isto é, que quando o gol é feito em impedimento seja anulado, que as faltas
sejam corretamente marcadas, que o gol feito com a mão não seja convalidado?
... Quando vieram os vídeos, com os tira-teimas e repetições, pensava-se
que as coisas mudariam, porque o árbitro teria contra si o fato real para
demonstrar seu erro, mas nada mudou. Permanece o regime autoritário de permitir
que o árbitro modifique o real a seu bel prazer, doa a quem doer. E, olhe que,
em tempos atuais, isso pode significar muitos milhões de reais ou dólares,
porque a mudança de um único resultado pode impedir ou levar um time à final de
um campeonato importante; ou a um torneio importante, valorizar o depreciar
clubes, técnicos e jogadores etc. É, de fato, muito poder concentrado com alto
grau de permissividade.
De minha parte, repito: Espero que haja, algum
dia, pressão suficiente da opinião pública, especialmente dos consumidores
torcedores, para que o futebol passe a ser um jogo mais real e honesto. A
tecnologia ajudará, sem tirar a graça do espetáculo”.
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