Autor: ANTÔNIO ALBERTO
MACHADO, membro do Ministério Público do Estado de São Paulo e professor
livre-docente do curso de direito da Universidade Estadual Paulista
(Unesp), campus de Franca-S
“O SENTIDO DA MORTE
Não há quem não pense na morte um dia sequer! Quem não
tente compreendê-la e até mesmo explicá-la. No entanto, a morte não tem
explicação nenhuma porque não tem sentido nenhum. Apenas as religiões (qualquer
religião) poderão “arbitrar”, mas não compreender ou explicar, o sentido
da morte. Aliás, dizia Hegel que a religião não é outra coisa senão “o homem se
elevando da vida finita para a vida infinita”.
Mas,
o problema é que a vida infinita está, obviamente, para além da morte, num
plano metafísico, sobrenatural, inacessível à razão humana. Deve ser por
isso que a morte sempre esteve cercada de mistério, crenças,
crendices, aparições, assombrações e… medo. Mas a morte, em si, é o nada, é o
“não ser”, portanto, não tem sentido nenhum, ao menos que pudesse ser
alcançado pela razão e pelas especulações do homem. A morte é o vazio, é o
vácuo, é o absurdo…
O
máximo que se pode dizer a respeito da morte é que ela “suspende” a
cotidianidade, paralisa a sucessão mecânica, imperceptível e absurda
do dia-a-dia. Por isso é que a morte sempre traz consigo a perplexidade e o
susto, lançando subitamente o homem para além dela (no além),
no incompreensível - esse terreno tão fértil e tão supersticioso das
religiões.
Na
verdade, segundo Sartre, não é apenas a morte que não tem sentido. O
nascimento do homem também não tem sentido nenhum - a não
ser para as religiões e suas ambições prometeicas. O filósofo francês
dizia: “não faz sentido nascermos, não faz sentido morrermos”. O
nascimento e a morte são apenas dois fatos da natureza, aliás, dois fatos
biológicos submetidos à mesma força cega e incompreensível dos fatos naturais.
Assim como não há nenhum sentido no fato natural de que a água
corre necessariamente para o mar, não tem sentido nenhum o fato de
nascermos ou morrermos.
Antes
do nascimento há apenas o “nada”, depois da morte, há o “nada”
novamente. O que poderia ter algum sentido a que o homem
pudesse legitimamente aspirar (e compreender) é tudo o que está (e que se
passa) entre o nascimento e a morte, isto é, “entre o nada e o nada”. Logo, não
se pode compreender nem o nascimento nem a morte, a especulação
(filosófica, científica, religiosa) acerca deles é inútil, é vã, será sempre
uma tentativa malograda. As únicas coisas que se podem realmente compreender
são as ações e a ”finitude do homem”, que, diga-se, não são
fatos meramente biológicos ou naturais, são “acontecimentos” históricos,
morais, psicológicos, humanos, demasiado humanos.
E
é justamente a finitude do homem que impõe as reações pessoais (ou
psicológicas) do medo, da angústia, do desespero. Mas é também essa mesma
finitude que determina a urgência da vida, isto é, a necessidade
(filosófica, moral, histórica, cultural etc.) de existir e construir um sentido
para a existência humana.
Se
podemos falar num sentido para a vida do homem, esse sentido está
certamente na possibilidade que ele tem de projetar e de agir.
O homem projeta, age e se projeta na direção do futuro, construindo a
própria essência condicionada pela existência, justamente porque sabe
da sua própria finitude. Eis aí, na consciência da finitude, a
fonte da vida autêntica, do agir consciente, do sentido da
vida… e, paradoxalmente, do desespero do homem.
Mas,
se a existência humana pode ter algum sentido, construído pelo próprio homem
quando projeta e age, o mesmo não se pode dizer da condição humana, que está
aprisionada estupidamente nesse breve e tumultuado interregno entre o
nascer e o morrer, “entre o nada e o nada”. Eis aí, na dialética do ser e do
nada, a fonte do incompreensível, do inexplicável, do trágico… e, aturalmente, do absurdo.
O
mais absurdo, porém, é que nem os deuses conseguiriam resolver
esses dilemas tipicamente existenciais dos homens. Pois parece que, com os
deuses ou sem eles, o mundo e a condição humana continuarão sendo a mesma
coisa (Sartre), isto é, algo incompreensível demais para a nossa vã
filosofia, para as nossas imperfeições, para as nossas impotências…
Com Deus ou sem Deus, diria agora Alberto Camus, o homem continua
desamparado, entregue à própria sorte e podendo contar apenas consigo
mesmo”.
http://blogs.lemos.net/machado/.
Acesso: 12/12/2012
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