“Extraído de: Rede
de Ensino Luiz Flávio Gomes - 09 de Junho de 2008
O que é venire contra factum proprium?
Veja o conceito de venire contra factum proprium.
A expressão "venire contra factum proprium" significa vedação
do comportamento contraditório, baseando-se na regra da pacta sunt servanda.
Segundo o prof. Nelson Nery, citando Menezes Cordero, venire contra
factum proprium' postula dois comportamentos da mesma pessoa, lícitos
em si e diferidos no tempo. O primeiro - factum proprium - é,
porém, contrariado pelo segundo.
O venire contra factum proprium encontra respaldo nas situações em que
uma pessoa, por um certo período de tempo, comporta-se de determinada maneira,
gerando expectativas em outra de que seu comportamento permanecerá inalterado.
Em vista desse comportamento, existe um investimento, a confiança de que
a conduta será a adotada anteriormente, mas depois de referido lapso temporal,
é alterada por comportamento contrário ao inicial, quebrando dessa forma a
boa-fé objetiva (confiança).
Existem, portanto quatro elementos para a caracterização do venire:
comportamento, geração de expectativa, investimento na expectativa gerada e
comportamento contraditório.
Nos dizeres de Anderson Schreiber, a tutela da confiança atribui ao
venire um conteúdo substancial, no sentido de que deixa de se tratar de uma
proibição à incoerência por si só, para se tornar um princípio de proibição à
ruptura da confiança, por meio da incoerência. Em suma, segundo o autor
fluminense, o fundamento da vedação do comportamento contraditório é, justamente,
a tutela da confiança, que mantém relação íntima com a boa-fé objetiva.
Esse tema já vem sendo aplicado nos tribunais. No Tribunal de Justiça de
São Paulo, alguns julgados também aplicaram, com maestria, o conceito da
vedação do comportamento contraditório. O primeiro deles examinou o caso de uma
empresa administradora de cartão de crédito que mantinha a prática de aceitar o
pagamento dos valores atrasados, mas, repentinamente, alegou a rescisão
contratual com base em cláusula contratual que previa a extinção do contrato em
caso de inadimplemento. O TJ/SP mitigou a força obrigatória dessa cláusula, ao
apontar que a extinção do negócio jurídico não seria possível. De maneira
indireta, também acabou por aplicar o princípio da conservação do contrato, que
mantém relação com a função social dos negócios jurídicos patrimoniais. Vejamos
a ementa do julgado:
Dano moral. Responsabilidade civil. Negativação no Serasa e
constrangimento pela recusa do cartão de crédito, cancelado pela ré.
Caracterização. Boa-fé objetiva. Venire contra factum proprium. Administradora
que aceitava pagamento das faturas com atraso. Cobrança dos encargos da mora.
Ocorrência. Repentinamente invoca cláusula contratual para considerar o
contrato rescindido, a conta encerrada e o débito vencido antecipadamente.
Simultaneamente providencia a inclusão do nome do titular no Serasa.
Inadmissibilidade. Inversão do comportamento anteriormente adotado e exercício
abusivo da posição jurídica. Recurso improvido (Tribunal de Justiça de São Paulo,
Apelação Cível n. 174.305-4/2-00, São Paulo, 3ª Câmara de Direito Privado A,
Relator: Enéas Costa Garcia, J. 16.12.05, V. U., Voto n. 309).
Em outro caso, o mesmo tribunal aplicou a vedação do comportamento
contraditório ao afastar a possibilidade de uma compromitente vendedora exigir
o pagamento de uma quantia astronômica referente ao financiamento para
aquisição de um imóvel, eis que tais valores não foram exigidos quando da
quitação da dívida. Entendeu-se que, como a dívida foi quitada integralmente, tal
montante, por óbvio, não poderia ser exigido:
Compromisso de compra e venda. Adjudicação compulsória. Sentença de
deferimento. Quitação, sem ressalvas, da última das 240 prestações
convencionadas, quanto à existência de saldo devedor acumulado. Exigência, no
instante em que se reclama a outorga da escritura definitiva, do pagamento de
saldo astronômico. Inadmissibilidade, eis que constitui comportamento
contraditório (venire contra factum proprium). Sentença mantida. Recurso não
provido. (Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação cível n. 415.870-4/5-00,
São José dos Campos, 4ª Câmara de Direito Privado, Relator: Ênio Santarelli
Zuliani, J. 13.07.06, M.V., Voto n. 9.786)”.
http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/20745/o-que-e-venire-contra-factum-proprium.
Acesso: 30/04/2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Qualquer sugestão ou solicitação a respeito dos temas propostos, favor enviá-los. Grata!