“Relator: Des.(a) HELOISA COMBAT
Data da decisão: 22/04/2013
Data da publicação: 25/04/2013
Decisão:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0027.10.004721-9/001 - COMARCA DE BETIM - APELANTE(S):
MUNICÍPIO DE BETIM - APELADO(A)(S): RENATA CRISTIANE FELIPE TEIXEIRA -
LITISCONSORTE: PMB SESA FUNDO MUNICIPAL DE SAÚDE
D E C I S Ã O M O N O C R Á T I C A
Vistos.
Trata-se de apelação cível interposta pelo Município de Betim, contra a
r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito daquela Comarca, que julgou
procedente em parte o pedido formulado por Renata Cristina Felipe Teixeira,
para reconhecer o direito da autora à estabilidade prevista no artigo 10, II,
b, do ADCT.
Por consequência, condenou o Ente Público a indenizar a reclamante em
razão da dispensa durante a gravidez no montante de R$ 6.994,54, acrescido de
juros de mora de 1% ao mês, contados da citação, e correção monetária a partir
da sentença.
O douto Julgador primevo fundamentou sua decisão argumentando que ante a
omissão constatada no artigo 10, II, b, do ADCT, a norma inserta no referido
dispositivo deve ser aplicado a toda e qualquer empregada que esteja exercendo
atividade laborativa quando teve confirmada a gravidez.
Em suas razões de recurso, relata o apelante, em suma, que o regime ao
qual a autora estava submetida (contrato temporário por prazo determinado) não
prevê a estabilidade em caso de gestação, pois a gravidez não altera a natureza
do vínculo de emprego pactuado. Aponta que se houvesse tal garantia, com
certeza estaria comprometida a contratação das mulheres nessa modalidade,
porquanto o empregador não assumiria o risco da avença.
Com tais
considerações, requer seja provido o recurso.
A autora
apresentou contrarrazões à f. 134/142.
Decido.
A r. sentença não está sujeita ao reexame
necessário, em razão do valor da condenação imposta ao Ente Público (R$
6.994,54).
O artigo 557, do Código de Processo Civil dispõe o seguinte:
"Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente
inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com
jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal,
ou de Tribunal Superior.(...)"
Acerca do tema, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que "as
disposições do art. 557 do CPC que conferem poderes ao Relator para negar
seguimento ou dar provimento ao recurso são constitucionais" (STF - RTJ
173/948), estabelecendo a súmula 253 do STJ que "O art. 557 do CPC, que
autoriza o relator a decidir o recurso, alcança o reexame necessário".
Cinge-se a controvérsia posta nos autos à possibilidade de concessão de
estabilidade provisória, prevista no art. 7, XVIII, da CF/88, e no art. 10, II,
b, do ADCT, à servidora gestante contratada temporariamente.
Sobre o tema, convém ressaltar que em recentes julgados, o eg. Supremo
Tribunal Federal firmou o entendimento sobre a questão, reconhecendo que as
gestantes, independentemente do regime jurídico ao qual estejam submetidas,
sejam empregadas, servidoras públicas, até mesmo ocupantes de cargo em comissão
ou contratadas temporariamente, fazem jus à licença-gestante e, portanto, à
estabilidade provisória, como se depreende dos artigos 7º, inciso VIII, 39,
parágrafo 2º. e 10, inciso II, alínea "b", do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, todos da Constituição Federal.
Ao assim dispor, e como bem ressaltado pelo MM. Juiz a quo, a
Constituição Federal não excepcionou qualquer situação. Vale dizer, a
Constituição Federal tutelou aqui um bem jurídico de especial valor - um
interesse público primário - para além das meras conveniências da Administração
Pública, conveniências que se constituem em interesses públicos secundários,
embora legítimos.
Nesse ponto, conclui-se que a possibilidade legítima da Administração
proceder à exoneração do servidor, sempre estará excepcionada no caso da
servidora gestante, durante o prazo fixado, uma vez que o interesse da
Administração não se sobrepõe ao da sociedade quanto à proteção à gestante, por
se tratar de garantia constitucional de proteção à maternidade, prevista no
artigo 6°. da Constituição Federal:
"Art. 6° - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a
moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e
à infância, a assistência aos desamparados, na forma da Constituição."
(grifei)
"Com efeito, a Constituição Federal, ao tratar dos direitos
sociais, preconizou ser direito dos trabalhadores urbanos e rurais, além de
outros que visem à melhoria de sua condição social, a licença à gestante, sem
prejuízo do emprego e do salário. Esse direito, como já dito, foi estendido aos
servidores ocupantes de cargo público, nos termos do artigo 39, parágrafo 3º,
da Constituição Federal, até mesmo porque, sendo a gravidez um fator biológico,
não pode ser concedido apenas a uma categoria." (Reexame Necessário-Cv
1.0486.10.000605-6/001, Rel. Des.(a) Moreira Diniz, 4ª CÂMARA CÍVEL, julgamento
em 04/04/2013, publicação da súmula em 10/04/2013)
A propósito, eis a jurisprudência maciça do Pretório Excelso:
"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
CONSTITUCIONAL. SERVIDORA PÚBLICA GESTANTE. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. DIREITO À
ESTABILIDADE PROVISÓRIA - ART. 10, INC. II, ALÍNEA B, DO ATO DAS DISPOSIÇÕES
CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS - ADCT. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE
NEGA PROVIMENTO." (RE 669959 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda
Turma, julgado em 18/09/2012, ACÓRDÃOELETRÔNICO DJe-195
DIVULG 03-10-2012 PUBLIC 04-10-2012)
"Agravo regimental no recurso extraordinário. Servidora gestante.
Cargo em comissão. Exoneração. Licença-maternidade. Estabilidade provisória.
Indenização. Possibilidade. 1. As servidoras públicas, em estado gestacional,
ainda que detentoras apenas de cargo em comissão, têm direto à licença-
maternidade e à estabilidade provisória, nos termos do art. 7º, inciso XVIII,
c/c o art. 39, § 3º, da Constituição Federal, e art. 10, inciso II, alínea b,
do ADCT. 2. Agravo regimental não provido." (AgR no RE n.º 420.839, 1ª
T/STF, rel. Min. Dias Toffoli, DJ 20/03/2012)
"SERVIDORA PÚBLICA GESTANTE OCUPANTE DE CARGO EM COMISSÃO.
ESTABILIDADE PROVISÓRIA (ADCT/88, ART. 10, II, "b"). CONVENÇÃO OIT Nº
103/1952. INCORPORAÇÃO FORMAL AO ORDENAMENTO POSITIVO BRASILEIRO (DECRETO Nº
58.821/66). PROTEÇÃO À MATERNIDADE E AO NASCITURO. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA
COMUNICAÇÃO DO ESTADO DE GRAVIDEZ AO ÓRGÃO PÚBLICO COMPETENTE. RECURSO DE
AGRAVO IMPROVIDO. - O acesso da servidora pública e da trabalhadora gestantes à
estabilidade provisória, que se qualifica como inderrogável garantia social de
índole constitucional, supõe a mera confirmação objetiva do estado fisiológico
de gravidez, independentemente, quanto a este, de sua prévia comunicação ao
órgão estatal competente ou, quando for o caso, ao empregador. Doutrina.
Precedentes. - As gestantes - quer se trate de servidoras públicas, quer se
cuide de trabalhadoras, qualquer que seja o regime jurídico a elas aplicável,
não importando se de caráter administrativo ou de natureza contratual (CLT),
mesmo aquelas ocupantes de cargo em comissão ou exercentes de função de
confiança ou, ainda, as contratadas por prazo determinado, inclusive na
hipótese prevista no inciso IX do art. 37 da Constituição, ou admitidas a
título precário - têm direito público subjetivo à estabilidade provisória,
desde a confirmação do estado fisiológico de gravidez até cinco (5) meses após
o parto (ADCT, art. 10, II, "b"), e, também, à licença-maternidade de
120 dias (CF, art. 7º, XVIII, c/c o art. 39, § 3º), sendo-lhes preservada, em
consequência, nesse período, a integridade do vínculo jurídico que as une à
Administração Pública ou ao empregador, sem prejuízo da integral percepção do
estipêndio funcional ou da remuneração laboral. Doutrina. Precedentes.
Convenção OIT nº 103/1952. - Se sobrevier, no entanto, em referido período,
dispensa arbitrária ou sem justa causa de que resulte a extinção do vínculo
jurídico- -administrativo ou da relação contratual da gestante (servidora
pública ou trabalhadora), assistir-lhe-á o direito a uma indenização
correspondente aos valores que receberia até cinco (5) meses após o parto, caso
inocorresse tal dispensa. Precedentes." (AgR no RE n.º 634093, 2ª T/STF,
rel. Min. Celso de Mello, DJ 22/11/2011)
"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRATIVO. CARGO EM COMISSÃO. SERVIDORA GESTANTE. EXONERAÇÃO. DIREITO À
INDENIZAÇÃO. 1. As servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as
contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de
trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à
estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o
parto. Precedentes: RE n. 579.989-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro
Ricardo Lewandowski, Dje de 29.03.2011, RE n. 600.057-AgR, Segunda Turma,
Relator o Ministro Eros Grau, Dje de 23.10.2009 e RMS n. 24.263, Segunda Turma,
Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 9.5.03. 2. Agravo regimental a que se
nega provimento." (AgR no AI 804574, 1ª T/STF, rel. Min. Luiz Fux, DJ
30/08/2011)
Destarte, deve ser reconhecida a aplicação do art. 7º, I, da CR/88 e do
art. 10, II, "b", do ADCT, mesmo em se tratando de servidora pública
ocupante de cargo de caráter temporário, tal como determinado pela r. sentença.
Neste contexto, considerando as especificidades da questão dos autos e
tendo em vista os recentes precedentes do Pretório Excelso, entendo que deve
ser estendido à autora o benefício da estabilidade provisória.
COM TAIS CONSIDERAÇÕES, NEGO SEGUIMENTO AO RECURSO, forte no art. 557,
caput, do CPC, por estar em confronto direto com jurisprudência dominante e
consolidada do eg. STF.
Custas recursais ex lege.
Publique-se. Intimem-se.
Belo Horizonte, 22 de abril de 2013.
DESA. HELOISA COMBAT
Relatora”