"APELAÇÃO CRIME. PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO ALHEIO. ARTIGO 42,
INCISOS II E III, DO DECRETO-LEI 3688/41. TIPICIDADE DA CONDUTA. SUFICIÊNCIA DO
CONJUNTO PROBATÓRIO. manutenção do DECRETO CONDENATÓRIO. PENA READEQUADA.
Mérito recursal
1. A contravenção de perturbação do sossego alheio exige,
para seu reconhecimento, que tenha sido atingida uma coletividade de pessoas,
diferentemente do que ocorre com a prevista no artigo 65 do mesmo diploma.
Presentes os elementos configuradores do tipo penal, é de manter-se o decreto
condenatório.
Pena
2. Aplicação da pena de multa prevista alternativamente
no tipo. Vetores do artigo 59 do CP que permitem a fixação no mínimo legal.
3, Sendo a pena de multa a única aplicada, incide o
disposto no parágrafo único do artigo 84 da Lei n. 9.099/95.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, COM READEQUAÇÃO DA PENA.
Recurso Crime
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Turma Recursal
Criminal
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Nº 71003668985
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Comarca de
Farroupilha
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ALVARO JUNIOR DALLANHOL
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RECORRENTE
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MINISTERIO PUBLICO
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RECORRIDO
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Juízes de Direito integrantes da Turma
Recursal Criminal dos Juizados Especiais Criminais do Estado do Rio Grande do
Sul, à unanimidade, em dar parcial provimento ao recurso.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes
Senhores Dr.ª Cristina Pereira Gonzales (Presidente) e Dr. Fabio Vieira
Heerdt.
Porto Alegre, 21 de maio de 2012.
DR. EDSON JORGE CECHET,
Relator.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto por
Álvaro Junior Dallanhol contra
sentença que o condenou à pena de 15 dias de prisão simples, substituída por
prestação pecuniária, no valor de um salário mínimo, por incurso nas sanções do
artigo 42, inciso II e III, da Lei das Contravenções Penais (fls. 47/49),
requerendo sua absolvição por falta de provas e, subsidiariamente a
substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito (fls.
52/53).
O Ministério
Público ofereceu as contra-razões (fls. 58/61).
O Parquet, nesta instância recursal,
manifestou-se pelo conhecimento do recurso e, no mérito, por seu desprovimento
(fls. 64/65).
VOTOS
Dr. Edson Jorge Cechet (RELATOR)
Eminentes colegas.
Conheço do recurso, já que
presentes os pressupostos de admissibilidade.
Mérito recursal
O apelo procede em parte.
Por primeiro, não descuido
do fato de que a emissão irregular de ruídos e sons tornou-se, na modernidade,
um dos problemas mais críticos dos grandes centros urbanos, que se distinguem
da quietude do interior, dos campos, das matas, dos ribeiros que correm para o
mar. A agitação causada pela vida moderna, os ruídos excessivos das fábricas,
os originados de equipamentos de veículos (motores, surdinas, alarmes,
aparelhos de som e amplificadores) têm sido reconhecidos pelos malefícios
causados à saúde humana, atingindo, até mesmo o meio ambiente. A exposição constante a ruídos e a sons tanto
pode causar mera perturbação como patologias físicas, a exemplo do que ocorre
com a Perda Auditiva Induzida por Ruído, que atinge a audição por níveis de pressão
sonora acima da capacidade orgânica do ser humano.
Esses fenômenos motivaram o
legislador a aprovar preceitos visando a minimizar as ocorrências que vêm se
verificando, impondo obrigações variadas, desde meras normas regulamentadoras
(v.g. NR7, Anexo I do Quadro II da Portaria n. 19/98 do Ministério da Saúde,
que fornece subsídios para adoção de programas de prevenção), passando por
legislações estaduais e municipais, além de leis amplas dentro das quais se
inseriu o dado específico: CTB (arts. 20, IV; 21, XIII; 22, XV; 24,XX; 98,
parágrafo único; 104; 227, 228 e 229, entre outros); DL 3688 (arts. 4e e 65);
Lei 6.938/81; Lei n. 9.605/98; Resolução 01/90 do Conama, entre outras, cuja
citação serve apenas para ilustrar a preocupação com a emissão de sons e ruídos
em níveis que causem incômodos e prejudiquem a saúde e as atividades humanas,
enquadrando-se no conceito amplo de poluição.
Mesmo assim, percebe-se um
incremento de ações humanas que obrigam o legislador, cada vez mais, a buscar
soluções para conter os diversos modos pelos quais a poluição se expande.
Restringindo a discussão à
espécie tratada, um dos índices de maior efetividade reside no número de
pessoas que utilizam equipamentos de som com capacidade de superar com largueza
os níveis máximos de ruído permitidos.
Especialidade da situação versada
No caso em exame, ao réu
foi imputada a prática de perturbação do sossego alheio, por estar utilizando e
testando equipamentos sonoros em seu estabelecimento comercial, exercendo
profissão incômoda e ruidosa, em desacordo com as prescrições legais e abusando
de instrumentos sonoros e sinais acústicos, embora não tenha havido qualquer
medição acústica, nem comparativo com o ruído de fundo.
A imputação dada observou
as linhas do art. 42, incisos II e III, da LCP, que tem a seguinte redação:
Art. 42.
Perturbar alguém o trabalho ou o sossego alheios:
I – com
gritaria ou algazarra;
II – exercendo profissão incômoda ou
ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;
III – abusando de instrumentos sonoros ou
sinais acústicos;
IV –
provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a
guarda:
Pena –
prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a
dois contos de réis.
No exame da matéria, registro,
inicialmente, que a tipificação desse ilícito deve reunir os elementos
caracterizadores do núcleo do tipo, entendendo, tanto a doutrina como a
jurisprudência, que a perturbação do sossego alheio não se configura pela
ocorrência de qualquer ruído, mesmo que de intensa sonorização, se não vier a
atingir a generalidade das pessoas de determinado local.
Veja-se, a exemplo, o
ensino de José Duarte, para quem “A
simples suscetibilidade de um indivíduo, a sua maior intolerância ou a
irritabilidade de um neurastênico não é que gradua a responsabilidade. A
perturbação deve, assim, ser incômoda aos que habitam um quarteirão, residem em
uma vila, se recolhem a um hospital, freqüentam uma biblioteca” (COMENTÁRIOS À LEI DAS
CONTRAVENÇÕES PENAIS, José Duarte, 2ª. ed., Forense, 1958, pág. 179).
No mesmo sentido Guilherme de Souza Nucci ensina que essa
contravenção exige, para sua configuração, efetivo incômodo para o trabalho ou
sossego de terceiros (Leis Penais e
Processuais Comentadas, RT), que representem, como também leciona Paulo Lúcio
Nogueira, o coletivo: “Se a conduta
perturba o sossego de indeterminado número de pessoas, tem-se como configurada
a contravenção do art. 42, e se a perturbação se destinava a determinada pessoa
em particular, caracteriza-se a infração do art. 65” (Contravenções
Penais ’Controvertidas, Sugestões Literárias Ed.)..
Também
a jurisprudência majoritária exige, para a configuração dessa contravenção, que
a perturbação do sossego atinja efetivamente a coletividade, não se positivando
caso atinja uma pessoa determinada.
No caso, a
conduta do réu positiva-se nos elementos do tipo penal em questão, já que não
perturbou determinada pessoa, incomodando, isto sim, a um considerável número
de pessoas que residem e que trabalham nas proximidades do local dos fatos
narrado na exordial acusatória (Rua Marechal Deodoro da Fonseca, n. 162).
Nesse
sentido, a testemunha Silvio José Marchetto (fl. 33), também comunicante do
registro policial (fls. 11/14), que reside próximo ao local dos fatos, relatou
que “sofre com o problema” de barulho, dizendo que “o som é excessivo”. Que
diariamente havia som alto, de “meia em meia hora”, “de hora em hora”. Que “em
um sábado de tarde” acordou com a “janela tremendo”.
A
corroborar o depoimento supra, a testemunha Rita Rosa Baretta (fl. 34 e v.),
psicanalista, que mora e trabalha na Rua Marechal Deodoro, narrou que há algum
tempo o som produzido pelo réu tem a incomodado, principalmente no seu horário
de trabalho, pois quando está atendendo seus pacientes “começa um som da
pesada”, que atrapalha. Disse, ainda, que já ligou várias vezes e que, umas
duas vezes desligaram o telefone, mas que depois tinha acalmado, porém, há
pouco tempo (duas ou três semanas) a perturbação havia recomeçado. Que “fica difícil”, “impossível trabalhar”,
pois os pacientes na sua frente, “se desmantelando, chorando, contando uma
coisa complicada e aí começa um vum, vum, vum”. Que tem dias que o som alto
ocorre duas ou três vezes por dia; uns dias mais; outros menos.
No mesmo
sentido, têm-se os relatos de Erotides Maria Toso Ferro (fl. 35), que mora ao
lado do estabelecimento comercial do réu, e de João Alberto Farinon (fl. 35v.).
Aquela afirmou que “o som é muito auto e atrapalha mesmo”. Este, que o “barulho
é insuportável”.
O acusado não negou a
autoria do fato, justificando que “os problemas vinham acontecendo” porque não
estava na sua empresa (AD Auto Som), mas que, a partir de abril de 2011 “estava
constante” em seu estabelecimento, e que pediu para os funcionários para não
“levantar todo o som”, a fim de não incomodar a vizinhança (fl. 39).
Dessa forma, o conjunto
probatório indica a responsabilidade do réu pelo fato que lhe foi imputado.
Diferentemente do que alega
o apelante nas razões recursais, a decisão de origem não se baseou tão-somente
na prova testemunhal da ex-companheira do réu (fl. 56), pois, além do fato de
que foram ouvidas quatro testemunhas – que se pronunciaram de forma harmônica
–, o réu, em seu interrogatório, quando indagado pelo Juiz se teria alguma
inimizade com algum dos depoentes, respondeu negativamente, dizendo que “nem
conhecia todos” (fl. 39).
Ademais, o documento de
fls. 05/09, enviado ao Ministério Público, em que consta assinatura de vários
condôminos do Edifício Delmar (esquina com a Rua Mal. Deodoro da Fonseca),
próximo à empresa do réu, embora encaminhado por uma das vítimas, reforça a
tese acusatória.
Portanto, há provas
suficientes para a manutenção do decreto condenatório, inexistindo qualquer
causa excludente de ilicitude ou isenção de pena a amparar o réu.
A pena
Entretanto, a pena aplicada
merece readequação.
O juízo a quo deixou de
justificar a sua não opção pela pena alternativa de multa prevista no tipo
penal, medida esta que entendo suficiente para reprovação do delito, além de se
mostrar socialmente recomendável na espécie, mormente por se tratar de réu
primário, sem antecedentes.
Ademais, no âmbito dos
Juizados Especiais, impositiva a aplicação, sempre que possível, de pena não
privativa de liberdade em detrimento da sanção corporal.
Dessa forma, substituo a
penalidade aplicada na origem por multa e considerando que as operadoras do
artigo 59 do Código Penal são favoráveis, fixo-a no mínimo legal de 10 (dez)
dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente ao tempo
do fato, corrigido na forma da lei.
Em que pese a confissão do
réu, torno a pena definitiva em tal patamar, já que a incidência de
circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo
legal, a teor da súmula 231 do STJ.
Em conseqüência, aplicada
exclusivamente pena de multa, seu cumprimento, que se faz mediante pagamento na
Secretaria do Juizado, determina a extinção da punibilidade do réu, devendo o
Juiz determinar que a condenação não fique constando dos registros criminais,
exceto para fins de requisição judicial, de acordo com o parágrafo único do
art. 84 da Lei n. 9.099/95.
Voto, portanto, por dar parcial provimento ao recurso para
readequar a pena imposta na origem".
Dr. Fabio Vieira Heerdt (REVISOR) - De
acordo com o(a) Relator(a).
Dr.ª Cristina Pereira Gonzales (PRESIDENTE) - De
acordo com o(a) Relator(a).
DR.ª CRISTINA PEREIRA GONZALES -
Presidente - Recurso Crime nº 71003668985, Comarca de Farroupilha: "À UNANIMIDADE, DERAM
PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO."
Juízo de Origem: 3.VARA FARROUPILHA - Comarca de Farroupilha
achei formidavel sofro muito com um caminhao em frente a minha casa ja fui parar na UTI POR CAUSA DISSO
ResponderExcluirMuito branda a condenação, continuarão a fazer o mesmo. Cadeia é pouca para este tipo de delinquente.
ResponderExcluircalem a boca vão morar no interior isolados
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