“Mandado de segurança-Concurso
público-Aprovação dentro do número de vagas-Nomeação-Direito subjetivo
Processo nº 0001575-85.2011
Mandado de Segurança
Impetrante: Nichele da Soledade Caroba
Impetrado: Prefeito do município de São João do Paraíso
SENTENÇA
I - RELATÓRIO
NICHELE DA SOLEDADE CAROBA, já qualificada, impetrou mandado de segurança, com pedido liminar, contra ato do PREFEITO DO MUNICÍPIO DE SÃO JOÃO DO PARAÍSO/MG, sustentando, em síntese, que a impetrante foi aprovada no concurso público, no ano de 2009, para o cargo de Oficial Administrativo, logrando classificar-se no quinto lugar, sendo oferecidas seis vagas para tal cargo. Alega que, as vagas ofertadas no edital estão sendo ocupadas por funcionários contratados sem concurso de forma irregular, sendo a impetrante e os demais aprovados preteridos em seu direito à nomeação, sofrendo lesão em seu direito líquido e certo.
A impetrante requereu, liminarmente, a promoção de sua posse no cargo de oficial administrativo, ao qual foi aprovada, e que atualmente é exercido por funcionário não concursado, bem como a gratuidade judiciária e, ao final, a concessão da segurança em definitivo para determinar-se sua nomeação e posse no cargo almejado (ff.02/10).
Com a inicial vieram os documentos de ff.13/18.
A decisão de ff.20/22 deferiu a liminar pleiteada, determinando que a autoridade coatora, no prazo de 30 dias, promova a nomeação, posse e exercício da impetrante no cargo de oficial administrativo sob pena de multa diária no valor de R$ 300,00 (trezentos reais).
Regularmente notificada (ff. 23/24), a autoridade coatora prestou informações, alegando que a impetrante aprovada em concurso público possui apenas expectativa de direito em ser nomeada, que não trouxe aos autos prova pré-constituída de seu direito líquido e certo à nomeação, pois não comprovou a ocupação irregular de cargos por funcionários contratados temporariamente, e que no município há apenas dois servidores efetivos ocupando o cargo pleiteado. Afirmou, também, que o impetrado possui prerrogativa de preencher os cargos existentes, observando a conveniência e oportunidade, e que não há no município disponibilidade ou necessidade de seis vagas para o cargo de oficial administrativo, sendo o concurso realizado pela administração anterior, completamente sem critério quanto às vagas disponibilizadas, de forma que a impetrante deverá aguardar o surgimento da almejada vaga até o prazo final de validade do concurso (ff. 26/32), por fim, juntou documentos de ff. 34/53.
Parecer do Ministério Público estadual às ff. 55/63, tendo manifestado pela concessão da ordem, sob o fundamento da existência de direito líquido e certo da autora à nomeação para o cargo, ao qual foi aprovada, dentro do número de vagas ofertadas pelo edital do concurso público.
É o relatório.
II - FUNDAMENTAÇÃO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Nichele da Soledade Caroba, contra ato do prefeito Municipal de São João do Paraíso a fim de ser nomeada para o cargo de oficial administrativo para o qual foi aprovada no concurso público realizado pelo Município, em quinto lugar, dentro do número de vagas ofertadas pelo edital, afirmando a impetrante que, embora não tenha sido até a presente data, nomeada pela municipalidade sob o argumento de inexistência da vaga pretendida, os cargos estariam sendo ocupados por funcionários não concursados.
Tradicionalmente, a jurisprudência firmou o entendimento de que o candidato aprovado dentro do número de vagas do certame tinha mera expectativa de direito, sendo a nomeação um ato administrativo discricionário.
[...] Na hipótese, o e. Tribunal a quo concluiu que "é incontroverso na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que os candidatos aprovados em concurso público são detentores de mera expectativa de direito à nomeação pela Administração, a qual não tem obrigação de nomeá-los dentro do prazo de validade do certame, além do que o recorrente não provou que houve desrespeito à ordem classificatória". Tal raciocínio expõe a tese jurídica adotada pelo e. Tribunal de origem, descaracterizando a alegada omissão [...] (AgRg no REsp 893453/MS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 10/04/2007, DJ 04/06/2007 p. 424, in www.stj.jus.br, acessado em 10/06/2010).
Todavia, o e. Superior Tribunal de Justiça modificou sua orientação, para considerar que o candidato aprovado dentro do número de vagas tem direito subjetivo à nomeação.
Cumpre ressaltar que tal modificação de pensamento ocorreu em virtude de uma interpretação constitucionalmente adequada, em apreço aos princípios da segurança jurídica, da eficiência e da boa-fé objetiva.
Segundo tais princípios, o Estado tem o dever de cumprir suas promessas, para não quebrar a legítima expectativa que os cidadãos lhe depositaram.
Com efeito, a discricionariedade da administração existe quanto à análise de conveniência e oportunidade, bem como da necessidade de se realizar concurso público para preenchimento de cargos, e, da mesma forma, socorre-se da discricionariedade na determinação do número de vagas que irá disponibilizar para serem preenchidas através de concurso público.
No entanto, a partir da publicação do Edital do concurso público ofertando determinado número de vagas, a realização do certame e sua homologação, o ato de nomeação dos aprovados deixa de ser discricionário e passa a ser vinculado aos exatos termos do Edital.
É que, ao disponibilizar as vagas através de Edital, a Administração reconhece a necessidade e existência de cargos disponíveis a serem preenchidos, atendendo ao princípio da razoabilidade a nomeação daqueles candidatos que se mostraram aptos ao exercício dos cargos, através de aprovação em concurso público.
Nessa esteira, o ensinamento de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
Se o poder Público realiza o concurso, que é um procedimento oneroso, é porque necessita de pessoal para preenchimento dos cargos vagos. Não tem sentido e contraria o princípio da razoabilidade o Poder público deixar de nomear os candidatos aprovados em consonância com o edital. (Di Pietro, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 22ª edição, 2009, São Paulo, Ed. Atlas, p.527).
Ressalte-se, ainda, a decisão proferida pelo e. Superior Tribunal de Justiça, em 4/12/07, por meio de sua 6ª Turma, no RMS nº 20.718/SP cujo Relator foi o Ministro Paulo Medina:
1. O candidato aprovado em concurso público, dentro do número de vagas previstas em edital, possui direito líquido e certo à nomeação e à posse; 2. A partir da veiculação, pelo instrumento convocatório, da necessidade de a Administração prover determinado número de vagas, a nomeação e posse, que seriam, a princípio, atos discricionários, de acordo com a necessidade do serviço público, tornam-se vinculados, gerando, em contrapartida, direito subjetivo para o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas em edital. (grifei e negritei)
Já foi pacificado o tema, inclusive, na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, conforme abaixo colacionado:
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO PÚBLICO - CANDIDATOS APROVADOS DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL - DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO - ATO ADMINISTRATIVO VINCULADO - ORDEM CONCEDIDA. O CANDIDATO APROVADO em CONCURSO PÚBLICO, dentro do número de vagas previsto no ato convocatório, tem direito líquido e certo à nomeação, que é ato vinculado. A discricionariedade da Administração, em casos como este, cessa quando da publicação do Edital, ao qual fica vinculada. CONCURSO PÚBLICO - EDITAL - VAGAS - PREENCHIMENTO. "O anúncio de vagas no edital de concurso gera o direito subjetivo dos candidatos classificados à passagem para a fase subsequente e, alfim, dos aprovados, à nomeação". Precedente: Recurso Extraordinário n 2 192.568-0/PI, Segunda Turma, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 13 de setembro de 1996" (STF, RMS nº 23.657/DF, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, "DJU" 09.11.2001) (grifei).
Frise-se que esse direito subjetivo da impetrante não depende de comprovação da contratação irregular de servidores para o exercício de funções afetas ao cargo para o qual foi aprovada, porque as disposições contidas no edital vinculam a Administração, que está obrigada a prover os aprovados no limite das vagas previstas.
No que tange ao prazo da Administração para realizar a nomeação dos candidatos aprovados dentro do número de vagas ofertados no edital convocatório, é incontroverso que ele expira com o decurso do lapso de eficácia jurídica do certame, período em que a Administração Pública possui o poder-dever de convocar os candidatos aprovados no limite das vagas que veiculou no edital, observada a ordem classificatória.
Contudo, acertada a recente interpretação dos Tribunais Superiores que afasta a alegada conveniência da Administração em realizar, discricionariamente, a nomeação a qualquer momento até o prazo final de validade do certame, tendo em vista a exigência constitucional de previsão orçamentária prévia à divulgação do edital, de forma que o orçamento para pagamento dos cargos disponibilizados deve existir previamente à sua veiculação.
Nesse sentido, oportuna a jurisprudência colacionada pelo Ilustre representante do Ministério Público em seu parecer, abaixo transcrita:
RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INTERESSE PROCESSUAL.EXISTÊNCIA. CONCURSO PÚBLICO. APROVAÇÃO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTO NO EDITAL, CONSIDERADAS AS DESISTÊNCIAS. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRECEDENTES.
1. De acordo com entendimento consolidado deste Superior Tribunal de Justiça, mesmo após expirado o prazo de validade do concurso público, há interesse processual do candidato na impetração de mandado de segurança contra ato omissivo consubstanciado na ausência de sua nomeação.
2. Tendo em vista os princípios da lealdade, da boa-fé administrativa e da segurança jurídica, bem como o fato de que a criação de cargos depende de prévia dotação orçamentária, o candidato aprovado dentro do número de vagas previsto no edital do certame, consideradas as desistências dos candidatos melhor classificados, não tem mera expectativa de direito, mas verdadeiro direito subjetivo à nomeação. Precedentes. 3. Recurso ordinário provido. (STJ, RMS 21.323/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, julgado em 01/06/2010, DJe. 21/06/2010).(negritei e sublinhei).
No caso em comento, a impetrante fez prova pré-constituída de que foram ofertados em edital seis vagas para o cargo de Oficial Administrativo (f.17), que foi aprovada para tal cargo, no referido certame, em quinto lugar na data de janeiro de 2010 (f.14), e que, não obstante tenha direito subjetivo à nomeação, até a data da impetração do presente ¿mandamus¿ (11/02/2011), não havia sido nomeada para o cargo.
Cumpre destacar que, embora não tenha comprovado a alegação de que funcionários contratados sem concurso público exerciam o cargo para o qual foi aprovada, tal fato não altera ou condiciona seu direito subjetivo, isso porque, como já afirmado anteriormente, as disposições contidas no edital vinculam a Administração, que está obrigada a prover os aprovados no limite das vagas previstas.
Outrossim, quanto à ordem de classificação para nomeação, deve-se ressaltar que não há qualquer prejuízo para os demais candidatos aprovados em primeiro, segundo, terceiro e quarto lugar, visto que a imediata nomeação da impetrante aprovada em quinto lugar não irá preterir os primeiros aprovados ou ocupar o cargo que cabe a cada um deles, sendo certo que todos tiveram, ao mesmo tempo, seu direito líquido e certo violado e já fazem jus à imediata nomeação, bastando que reclamem seu direito para serem também, ato contínuo, empossados no mesmo cargo.
Concluo, portanto, que a impetrante fez a prova pré-constituída do direito líquido e certo que invocou, bem como da violação sofrida, conforme se depreende da documentação adunada aos autos, motivo pelo qual a concessão da ordem é medida que se impõe.
III - DISPOSITIVO
Isso posto, CONCEDO A SEGURANÇA pleiteada para determinar, em definitivo, a nomeação, posse e exercício de NICHELE DA SOLEDADE CAROBA, para o cargo de Oficial Administrativo, confirmando a liminar já deferida.
Condeno a parte impetrada ao pagamento das despesas processuais.
Sem honorários, a teor do disposto no art. 25, da Lei nº 12.016, de 2009.
Ciência ao MP.
Sentença sujeita a duplo grau de jurisdição, a teor do disposto no parágrafo único do art. 14, § 1º, da Lei n.º 12.016/2009.
Cumpra a secretaria o contido no art. 13, da Lei nº 12.016, de 2009.
P.R.I.C.
São João do Paraíso, 10 de maio de
2011.
Aline Martins Stoianov de Campos
Juíza de Direito Substituta”
Juíza de Direito Substituta”
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