"Violência e falta de segurança assolam algumas regiões no México
Grupos armados foram criados por populares para combater quadrilhas envolvidas com o tráfico de drogas
Randal C. Archibold
A notícia se espalhou rapidamente: O exército estava vindo para desarmar os combatentes "vigilantes" (justiceiros) que os moradores viam como heróis conquistadores após entrarem em cena e expulsarem a gangue de traficantes de drogas que tinha roubado propriedades, extorquido e ameaçado matá-los. Os moradores tinham até de deixar flores e ofertas em um relicário dedicado ao líder messiânico dos traficantes.
Pequenos camponeses entrelaçaram os braços com os justiceiros para bloquear a estrada empoeirada de duas pistas dando acesso à cidade. Os soldados exigiram passar; as pessoas imploraram que fossem embora. Os ânimos se elevaram, e pedras foram lançadas. Segundo os moradores, os soldados atiraram para cima e, depois, em um grupo de pessoas. Pelo menos duas pessoas foram mortas em 14 de janeiro, disseram os moradores e a polícia.
— Ele era apenas um agricultor, e agora morreu por uma causa — , um morador, Luis Sánchez, falou sobre Mario Torres, de 48 anos, um coletor de lima que não era parte do grupo de justiceiros, mas foi um dos enterrados no dia seguinte enquanto os enlutados se manifestavam contra o governo e os soldados.
Enquanto os comboios dos agentes da polícia federal e dos soldados cruzavam as terras agrícolas acidentadas, a confusão aqui no estado de Michoacán – onde os justiceiros se armaram para combater os pistoleiros do cartel – deixou o governo mexicano, que se preocupa com a imagem, com um desafio de segurança espinhoso e um dilema assustador.
O governo deveria desarmar os pistoleiros frouxamente organizados que se levantaram para combater os cartéis de droga, arriscando ter confrontos mortais com alguns dos próprios cidadãos que ele foi acusado de não proteger?
Ou deveria recuar e deixar que esses grupos nebulosos – com pouco ou nenhum treinamento policial, lealdades incertas e possíveis ligações com outras gangues criminosas – continuar a combater os cartéis do narcotráfico da região, possivelmente levando a um confronto sangrento?
Aqui na cidade onde os civis foram mortos, o governo parece ter escolhido a segunda opção: se afastar e se acalmar. Depois que os policiais mexicanos recomendaram que os justiceiros se desarmassem e voltassem para casa, essa pequena cidade agrícola e pelo menos mais outra que resistiu ao governo permaneceram controladas por pistoleiros – alguns deles adolescentes – em caminhonetes surradas.
O surgimento dos supostos grupos de autodefesa é talvez o exemplo mais marcante da fraqueza do policiamento, expondo uma espécie de vigilantismo que atravessa o país, especialmente nas áreas rurais onde a frustração e a falta de confiança nas instituições são mais profundas.
— Michoacán, e especialmente a sua região montanhosa ocidental, tem sofrido com problemas persistentes de violência e talvez um problema ainda mais persistente com a reação débil do estado frente à situação — , declarou Matthew C. Ingram, professor assistente da Universidade de Albany que estuda as instituições de justiça do México. "Se o estado não consegue fazer ou não quer fazer justiça, então, os cidadãos comuns assumem a responsabilidade".
Ou, como o Reverendo Antônio Mendoza, o padre da Igreja Católica Romana que presidiu o funeral das duas vítimas aqui, avalia, "a solução é a legalidade e a reforma do Estado de Direito".
Segundo ele, — Até que cheguemos lá, as pessoas farão justiça com as próprias mãos —
Ficou claro que a tentativa do governo de reafirmar a sua autoridade viria no mínimo intermitentemente, causando pouca interferência nos grupos em algumas cidades onde concordassem baixar ou, pelo menos, esconder as armas, e se afastando onde não era bem recebido.
Em Apatzingán, a pequena cidade que os justiceiros prometeram tomar porque eles a veem como o baluarte do cartel do narcotráfico Cavaleiros Templários, os agentes da Polícia Federal mantêm uma forte presença. Mesmo assim, uma farmácia foi incendiada em circunstâncias suspeitas, e vários tipos de comércio tinham sido fechados por ameaças dos Cavaleiros Templários, relataram repórteres locais.
Aqui em Antúnez, não havia sinal algum dos agentes da Polícia Federal, nem dos soldados, e certamente nenhum desarmamento. E os moradores não aceitariam que fosse de nenhuma outra maneira.
— Desde que vieram na semana passada, tudo mudou — , disse um vendedor de frutas, que como muitos aqui, falou sussurrando e anonimamente por medo de que a gangue que governava voltasse. — Está tudo muito calmo —
Na vizinha Parácuaro, onde permaneciam os vestígios do que sobrou de um caminhão e de um ônibus queimados em um confronto com a gangue, os justiceiros mantinham um bloqueio na entrada da cidade que impedia qualquer forasteiro de entrar.
Segundo os moradores, os Cavaleiros Templários se mudaram para a cidade há dois anos, erguendo um santuário para o seu líder misterioso, Nazário Moreno González. O governo afirma que ele foi morto há três anos e que os seus seguidores, que o reverenciam com uma quase adoração religiosa, têm forçado as pessoas a deixarem ofertas para ele. No entanto, existem vários relatos por toda Michoacán de que Moreno González ainda está vivo.
(Os Cavaleiros Templários são uma ramificação da sua antiga gangue, La Familia Michoacána).
Os moradores falam de uma longa provação de terror e desamparo. Um proprietário de terras foi assassinado quando se recusou a entregar a propriedade. Os caminhões, o dinheiro e outros bens de valor acabaram nas mãos dos líderes das gangues e dos seus aliados. E ameaças de morte se tornaram lugar comum. Segundo os moradores, a polícia do município foi comprada ou forçada a trabalhar para a gangue.
— O líder dos Cavaleiros, mesmo quando estava de saída daqui quando a polícia de autodefesa entrou, disse que eles voltariam e matariam todos nós — , o vendedor disse.
O grupo de autodefesa, armado com rifles automáticos e com caminhonetes no estilo policial, que disseram terem sido tomadas da gangue, entrou em cena. O grupo negou as insinuações de alguns agentes do governo de que eles representavam outra gangue, a Nova Geração, mas quando lhes perguntei como agricultores comuns conseguiram desarmar criminosos violentos e endurecidos, os membros se recusaram a discutir as táticas.
A polícia local desapareceu, disseram, e os membros da gangue, em menor número, se esconderam ou, talvez, saíram para se reagrupar.
Os justiceiros montaram um ponto de controle na entrada de Antúnez, controlando os visitantes e recebendo frutas, tacos e até mesmo pagamentos em dinheiro dos moradores, voluntariamente, insistiram. Eles têm uma aparência desorganizada, e alguns claramente não são acostumados a manusear armas. Enquanto o líder do grupo falava com um repórter, outro membro disparou acidentalmente o seu rifle ao entrar em um caminhão.
— Cuidado aí! — , o comandante gritou.
Entretanto, era difícil encontrar moradores que não os admirassem.
Uma das primeiras coisas que os justiceiros fizeram foi destruir a imagem de Moreno González na capela do relicário do tamanho da casinha de um cachorro. Os moradores depois a substituíram pela estátua da Virgem de Guadalupe, a santa padroeira do México".
THE NEW YORK TIMES SERVICE
http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/mundo/noticia/2014/01/violencia-e-falta-de-seguranca-assolam-algumas-regioes-no-mexico-4400135.html Acesso: 25/1/2014
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