“Judiciário não pode impedir busca por pai biológico
Qualquer pessoa tem
o direito de saber quem é o seu verdadeiro pai, mesmo que, no registro, já
conste o nome do pai socioafetivo. Como este direito é imprescritível, não se
submete a nenhum prazo extintivo. Com este entendimento, já pacificado na
jurisprudência, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul desconstituiu sentença que extinguiu uma Ação de
Anulação de Registro Civil, cumulada com Investigação de Paternidade. Com a
decisão, tomada de forma unânime pelo colegiado, o processo volta ao juízo de
origem, para regular tramitação, inclusive, com citação de todos os
interessados.
O relator da
Apelação, desembargador Ricardo Moreira Lins Pastl, disse que é flagrante a
possibilidade jurídica do pedido, sobretudo, porque talvez esta seja a única
via por meio da qual a autora poderá saber quem é seu pai biológico, tendo em
vista o fato de o pretenso genitor ser falecido. "Daí que a extinção da
ação equivale a obstaculizar o acesso à Justiça", justificou. O acórdão é
do dia 16 de fevereiro.
O caso é originário
da Comarca de Santo Cristo, distante cerca de 500km de Porto Alegre. Após ter
seu processo extinto no primeiro grau, sem julgamento de mérito, a autora recorreu
ao Tribunal de Justiça, a fim de buscar o reconhecimento de seu verdadeiro pai.
Em síntese, afirmou
que ouviu da mãe a confissão de que mantivera um caso extraconjugal no tempo de
sua gestação com o suposto pai biológico e que tem direito de tirar esta
dúvida, sem qualquer restrição. Neste sentido, afirmou que a decisão do juiz de
Direito Roberto Laux Júnior violou os princípios do contraditório e da ampla
defesa.
O relator da
Apelação disse que o direito da autora de conhecer e investigar a sua ascendência
genética paterna é inquestionável. É corolário do direto de personalidade e não
se submete a nenhum prazo extintivo, citando jurisprudência do próprio
Tribunal.
Para corroborar seu
entendimento, o desembargador considerou os fundamentos lançados no parecer
assinado pela procuradora de Justiça com assento no colegiado, Ana Rita
Nascimento Schinestsck. Na visão da representante do Ministério Público, o
direito à origem é constitucional e sagrado à condição de pessoa humana.
"Não se quer negar, com tal premissa, a observância e o prestígio do
aspecto socioafetivo da paternidade. Todavia, não se pode entender que esse
aspecto possa menosprezar o direito da autora de investigar a sua paternidade
biológica", frisou.
Por fim, a
procuradora do MP destacou que não se aplica às ações de investigação de
paternidade, ainda que o investigante possua pai registral, o prazo decadencial
previsto ao artigo 1.614 do Código Civil. Segundo o dispositivo, o filho
maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar
o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade ou à
emancipação. "Cumpre registrar aqui que o artigo (...) é direcionado aos
que, uma vez reconhecendo a filiação através do registro de nascimento, não
podem vindicar estado contrário, salvo provando-se erro ou falsidade do
registro", afirmou.
Assim, o
desembargador relator Ricardo Moreira Lins Pastl deu provimento à Apelação para
desconstituir a sentença e permitir a retomada do processo no primeiro grau.
Acompanharam o voto os desembargadores Rui Portanova e Sérgio Fernando de
Vasconcellos Chaves” .
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