“Devo fazer um concurso sem estudar?
Por que muita gente ainda participa de um concurso público sem ter se
preparado previamente? Saiba o que há de tolerável e o que há de abominável
nessa "prática".
"Quem passou pela vida em branca
nuvem
E em plácido repouso adormeceu;
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida, não viveu"
E em plácido repouso adormeceu;
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida, não viveu"
Francisco Octaviano
Pergunte a alguns colegas seus (ou gente até minimamente antenada na
seara dos concursos) quantos já participaram de um certame sem ter estudado
(disse "participaram" e não "passaram", porque são pontos
de vista muito diferentes). Garanto que a resposta em nada vai lhe espantar,
porque não é raro o fenômeno. Vou tocar talvez em um assunto delicado,
justamente porque parece que é algo que vai "contra a corrente atual"
e certamente se seguirão comentários carregados de reprovação. Hoje prega-se um
mantra que possui ares de "sequência lógica", no qual é dito que uma
aprovação virá sempre quando precedida de uma vida longa de dedicação aos
estudos. Não seria ingênuo ao ponto de desconsiderar o valor de tudo isso, mas
sempre existem ponderações a serem ditas.
Claro que esta máxima é absolutamente verdadeira! Eu sou prova de que ela
funciona na minha própria vida, a cada vez que estudo para obter uma aprovação,
seja ela em prova de uma formação (de qualquer nível), seja numa prova para um concurso almejado. Também sei que você,
concurseiro, é a prova cabal de que tal abordagem funciona. Quando se luta
seriamente por um objetivo, é fato que ele será alcançado. Pelo menos é assim
para a maioria das coisas conquistáveis da vida. Se fôssemos para o campo da
religião, diríamos que até Deus tende a abençoar uma pessoa esforçada, até
mesmo se ela não tiver crença NEle (Ele sabe quem crê). Deus é a favor dos
corajosos e se existem pessoas cientes de que o benefício só vem depois de uma
fase de luta, de esforço, é inevitável que em algum momento não aconteça o
milagre. Se fôssemos para o campo da auto-ajuda de todos os dias, a
"sequência lógica" - ou a "programação neurolinguística" -
seria verdadeira da mesma forma. Repito: não seria insensato ao ponto de questionar
a dica dos experientes mestres. Também não estou pregando o desleixo! Mas
também não seria hipócrita de negar que, tomando como exemplo a área dos
concursos, alguns poucos felizardos já alcançaram aprovações, mesmo sem ter
encarado os estudos dessa forma metódica e disciplinada que hoje virou
tendência. Não digo que tal fenômeno é pior ou melhor, bom ou mal, negativo ou
positivo. Digo apenas que esses casos existem, agora, se são raros, isso é
outro problema.
Existe um ditado que ensina: "um é pouco, dois é bom, três é
demais". Esse adágio se encaixa perfeitamente no tipo de assunto de que
estou tratando. Ou seja, fazer concurso uma ou duas vezes sem ter se preparado
a contento pode até ser tolerável/aceitável. Mas passar para a terceira tentativa
e assim por diante, sem tomar para si o compromisso de se preparar de verdade,
aí já é demais!
Participar de um concurso sem ter
estudado não é para todo tipo de concurseiro
Na verdade, não existe uma vantagem objetiva e direta em se participar
de um concurso público sem estudar. O que existe é a capacidade humana de poder
bancar uma empreitada sem se sentir culpado depois, independente do resultado
da prova. Tal capacidade, contudo, pertence a um determinado tipo de
concurseiro...
Explicando um pouco mais: as vantagens dessa participação só podem ser
sentidas por determinados grupos de concurseiros: aqueles que já estão
empregados, seja na área pública ou privada; aqueles que são financiados por
alguém que não cobre resultados evidentes; ou mesmo aqueles que passam a vida
em branca nuvem, sem nada cobrar de si mesmos - o que, por si só, é algo
abominável.
Essa categoria de gente é a que vai dispor dos recursos financeiros e
logísticos relativamente "sobrando" para esse tipo de
"investimento no escuro" em concursos públicos. São, portanto,
pessoas que se encaixam no perfil do "concurseiro despreocupado",
posto que não serão afetadas pelo incômodo de ter participado de um certame
simplesmente para "ver no que ia dar", sem compromissos.
Ou seja, para essas pessoas participar do concurso vai se configurar
somente como um ganho de experiência (por mais que tenham dispendido algum
dinheiro ou tempo), sem contar que ainda existe a "vantagem" de não
precisar se lamentar de coisa alguma, se algo der errado lá na frente, se a
aprovação tentada, de fato, não vier. Para contrabalançar, existe uma outra
vantagem: imagine se o "concurseiro despreocupado" chega bem perto de
uma classificação relevante, da qual muitos que estudaram bastante passaram bem
longe? Imagine se ele "bate na trave"? Em resumo, é a vantagem de se
confiar no acaso...
Mas não confundir despreocupação com
espírito de perdedor
Por outro lado, e sem querer fazer apologia da despreocupação, é preciso
que lembremos que "concurseiro despreocupado" não quer dizer sempre
"concurseiro derrotado". Ou você acha que esses abnegados vão para o
campo de batalha com espírito de perdedor, por mais que não tenham treinado
para o embate final, no front da sala de aula?
Ademais, você acha que todo cargo público hoje ocupado via concurso
público está sendo ocupado por uma pessoa que "se matou de estudar"?
Se tinha essa ilusão, reveja seus conceitos. Nem todo cargo público exige a
mesma determinação para os estudos que alguns cargos, hoje considerados
"de elite" (auditores, policiais federais, magistrados, etc), exigem.
Existe gente, por exemplo, que vai participar de um concurso para um cargo
específico sem dedicar uma hora do dia aos estudos do programa específico do
edital, simplesmente porque já vem de uma trajetória de estudos mais ou menos
condizente com aquele programa, ainda que não sejam exatamente os mesmos
conteúdos. É o caso de pessoas que estão cursando licenciaturas e planejam
participar de concursos para o magistério, ou o caso de pessoas com formação na
área da saúde, do direito ou da administração que estão pretendendo participar
de concursos para cargos específicos, cujas provas não são consideradas como
"bichos de sete cabeças", ainda que as táticas das bancas
selecionadoras tenha avançado. Não estou generalizando, mas apenas dizendo que
existem casos e casos a serem considerados... Estudar sempre será o melhor
caminho, mas não podem ser relegadas a segundo plano as bagagens intelectuais
de muitos candidatos, até mesmo aquelas construídas ao longo de suas experiências
de preparações para concursos anteriores.
Devo participar de um concurso sem
ter estudado?
Deixei a resposta principal para o final, a fim de concluir estas
considerações sem dar esperanças aos concurseiros que estão, além de
despreocupados, talvez pensando em se tornar até relaxados por toda a vida.
Sim, porque a qualquer momento vai ser preciso enfrentar algum tipo de embate,
seja pessoal, seja profissional. Repito: relevar uma prática errônea/errante
por uma ou duas vezes pode até ser "bacana", mas será que a gente vai
poder fugir das seleções (provas) da vida durante toda a existência? Não aprendi
a conceber a vida sem algum tipo de enfrentamento da realidade. Para mim, a
felicidade passa sempre por essa questão.
Quer participar de um concurso do momento sem ter estudado?
Fique à vontade para se inscrever, pelas razões/circunstâncias que apontei
antes ou pelos motivos que você já tiver formulado. Mas não aja como se isso
fosse algo a ser sempre repetido. Não viva dando desculpas para não fazer
aquilo que deva feito da maneira mais correta possível, considerando as suas
próprias singularidades”.
Acesso: 29/10/2013
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