“ESPECIALISTAS ESCLARECEM APLICAÇÃO DO TELETRABALHO NO
ENSINO SUPERIOR PRESENCIAL E A DISTÂNCIA
Temas discutidos no Seminário ABMES analisam a
aplicabilidade da lei nº 12.551/11, que altera a CLT em relação ao trabalho
realizado fora da empresa
Com o advento das tecnologias utilizadas para o ensino a
distância e nas atividades realizadas fora da sala de aula por professores do
ensino presencial, torna-se comum a incorporação de novas atribuições à rotina
dos profissionais da educação. Monitorias a distância, consultoria via redes
sociais e até mesmo o tempo gasto para correção de provas e elaboração de aulas
passam a gerar questionamentos sobre os direitos do educador que passaria tempo
extra a serviço da instituição.
Após a alteração do artigo 6º da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT), a partir da publicação da Lei nº 12.551, em 15 de dezembro de
2011, o vínculo empregatício e a subordinação do teletrabalhador passam a ser
efetivamente reconhecidos. Para discutir a aplicação do artigo 6º e esclarecer
pontos cruciais sobre o uso das leis trabalhistas na educação a distância, a
Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) realizou em 14
de fevereiro, em Brasília, o seminário “Direitos trabalhistas na era digital: o
que muda com a Lei 12.551/2011?”.
Com o objetivo de avaliar diretrizes para a adequação à esta
nova realidade, reuniram-se os professores Nelson Mannrich, da Universidade de
São Paulo (USP) e presidente da Academia Nacional de Direito do Trabalho; José
Roberto Covac, especialista em Direito Educacional e consultor jurídico da
ABMES e do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, e
Fredric Litto, Presidente da Associação Brasileira de Educação a Distância
(Abed) e professor da USP. Antonio Carbonari Netto, diretor técnico da ABMES e
presidente do Conselho de Administração da Anhanguera Educacional, coordenou a
mesa de discussões, presidida por Gabriel Mario Rodrigues, presidente da ABMES.
Entre os principais desafios levantados durante as
discussões está a necessidade de determinar, a níveis contratuais, a jornada,
as atividades exercidas pelo trabalhador (inclusive as remotas) e o uso de
mecanismos de gerenciamento, como celulares e e-mail. Além disso, acordos
coletivos estabelecidos junto aos sindicatos regionais são uma alternativa
viável para esclarecer a aplicação da CLT.
Confira os principais
pontos de discussão levantados durante o seminário “Direitos
trabalhistas na era digital: o que muda com a Lei 12.551/2011?”:
Hora extra e o atendimento a alunos
O trabalho (seja ele remoto ou não) é configurado pelo tempo
que se está à disposição da empresa. Como explica Nelson Mannrich, a carga
horária externa não deve estar baseada na eventualidade. “Uma conversa informal
com os alunos não seria categorizada como hora extra, não se trata de
atendimento oferecido pela instituição”, explica. “Se a instituição determina
um horário fixo no tempo de serviço do professor para ofertar monitorias ao aluno,
então passa a ser tempo efetivo de serviço”, diz Mannrich.
“Sempre entendi o atendimento aos alunos como dedicação
inerente à atividade do professor. Mas os direitos trabalhistas não entendem a
boa fé como pré-requisito contratual”, comenta o professor Nelson. Dessa forma,
cabe à instituição esclarecer os limites do serviço prestado pelo educador. “Se
a escola quer que o professor utilize chat para atender alunos, isso deve ser
feito em horário de trabalho e de forma remunerada”, explica. Para o especialista,
a escola poderá, em contrapartida, exigir que o profissional entregue
relatórios que mostrem a efetividade e resultados do trabalho extraclasse.
Segundo o especialista em direito educacional, José Roberto
Covac, não é considerada hora extra o tempo que o professor passa trabalhando
de forma acordada com a instituição e sendo remunerado. “Em São Paulo, por
exemplo, foi estabelecido, em acordo coletivo, que se o professor aceita
participar de orientação, de uma comissão de avaliação ou em módulo de pós-graduação,
por exemplo, ele será remunerado pelas horas trabalhadas, sem os adicionais de
hora extra”, lembra Covac.
Com relação às atribuições do educador, ele analisa: “As
atividades de ensino são extremamente dinâmicas. Se o MEC publica uma portaria
em véspera de feriado, como vou dizer ao ministério que não vamos trabalhar em
cima dela?”, ressalta. Ele completa ainda: “a pós-graduação vive dificuldades
ainda maiores por conta das limitações para a contratação e aplicação de banco
de horas. Nesse sentido, sentimos a desatualização das leis trabalhistas com
relação a algumas realidades vividas no ensino superior. Precisamos compreender
formas específicas de aplicá-las em cada situação e estado”.
Gestão de horas do educador
O principal desafio das instituições particulares é fazer
com que se estabeleçam critérios e que esses sejam cumpridos, de forma clara. É
o que explica Covac: “Percebemos, nas reclamações trabalhistas, a
vulnerabilidade pela falta de controle e a falta de participação das partes.
Algumas faculdades determinam tempo de trabalho fora da sala de aula para
cumprimento de outras atividades acadêmicas, mas, por outro lado, não conseguem
regular o que é produzido. Quando se observa o contrato de trabalho, não há nenhuma
definição de quais são as atividades que o educador ou tutor precisa
desempenhar”, analisa.
Covac enfatiza que a regulamentação é positiva para todas as
partes. “Quando se sabe os limites, é bom para o professor e para o aluno. A
mesma coisa vale para a hora extra. Se não tiver o controle, não há como
aplicá-la”, defende. “É curioso ver como, a meu ver, parece não existir gestão
de RH para professores em grande parte das escolas. Fica a impressão de que as
regras se aplicam somente aos demais funcionários”, alerta.
Covac lembra que os artigos 12 e 13 da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB) determinam que cabe ao professor ministrar os
dias letivos e estabelecer estratégias para o melhor rendimento do aluno.
Porém, ele aponta que “algumas instituições não conseguem administrar problemas
sutis como a falta do professor e a aula que deixa de ser dada. É preciso
acompanhar mais de perto as atividades do professor, dentro e fora da sala de
aula”, afirma o advogado.
Aplicação de horas extras vs. Contratos de trabalho
Gestores educacionais presentes no Seminário ABMES
questionaram a mesa debatedora sobre a aplicação de horas extras mesmo em casos
onde está determinada, contratualmente, uma carga horária específica para
atendimento de alunos e trabalho remoto on-line. Para os especialistas, o
primeiro passo para solucionar questões ligadas a essa aplicação de hora extra
nesses casos é consultar as convenções coletivas de trabalho e legislação
específicas para cada estado.
“Em Minas Gerais, por exemplo, algumas atividades realizadas
pelo educador são compreendidas de forma diferenciada, como a avaliação e a
supervisão de estágio. A hora atividade e hora extra são aplicadas de formas
específicas”, explica José Roberto Covac.
O especialista reforçou a importância da gestão efetiva do
trabalho acadêmico, lembrando que é um interesse da instituição. “Se o
professor realizar aquilo para o qual ele efetivamente foi contratado, a partir
do programa de trabalho que ele tem que cumprir, a instituição tem como
compreender e demonstrar o que é feito dentro da escola no momento da avaliação
[realizada pelo Ministério da Educação]”, analisa Covac.
Tecnologia a favor do trabalho
Outro questionamento levantado durante o seminário diz
respeito ao uso de novas tecnologias no trabalho a distância. Trazidas para as
instituições de ensino superior com a finalidade de tornar mais ágil o dia a
dia, ferramentas como e-mail corporativo disponibilizado para uso em celulares
smartphones e tablets geram dificuldades para a gestão da carga horária
realizada fora do ambiente de trabalho, seja ela acordada com a instituição,
hora extra ou trabalho executado sem permissão.
A preocupação de gestores educacionais em se adequar aos
parâmetros da CLT evitando-se abusos foi uma das principais questões levadas
aos especialistas. “Caso a instituição veja a necessidade, é possível proibir
que se use os celulares e outras ferramentas longe do ambiente de trabalho ou
em horário em que o teletrabalhador não esteja executando suas tarefas”,
aconselha Nelson Mannrich.
“Se eu não estabeleço formas de controlar o trabalho do meu
empregado, ele terá como reclamar essas horas não combinadas. Por isso é
importante deixar tudo pré-estabelecido”, diz. “Se ele realmente fez horas
extras, deverá ser devidamente pago. Mas é importante deixar claro que não
serão permitidas atividades fora das estabelecidas”, orienta Mannrich.
Por outro lado, o especialista acredita que não é viável
proibir que o funcionário se desligue totalmente ao sair do trabalho. “Não há
como proibir a eventualidade. Se o chefe precisa entrar em contato com seu
funcionário para tirar uma dúvida, não pode ser um ato passível de punição ou
cobrança de hora extra”, enfatiza.
Um outro critério importante deve ser deixado claro no momento
da contratação: como proceder quando o professor cria ferramentas próprias para
atendimento a alunos? Cabe à instituição prever esse tipo de processo. “Caso
não esteja determinado em contrato, o profissional não poderá exigir
remuneração por espontaneamente ter criado uma rede social, por exemplo, como
canal de apoio aos alunos. Se for o caso, proíbe-se o exercício de novas
atividades, a fim de garantir a segurança de ambas as partes”, explica Nelson
Mannrich.
Atribuição de horistas
Em algumas instituições, profissionais contratados em
modalidade “horista” acumulam atribuições, dentro e fora das dependências da
escola. “Se o professor foi contratado para ser horista e está desempenhando
outras atividades, sendo elas exigidas pela empresa, fica evidente que está
cumprido outra carga de trabalho”, defende Nelson Mannrich. “O professor que
desempenha atividade de extensão à classe por obrigatoriedade poderá comprovar
que estava à disposição da empresa. Nesse sentido, é de extrema importância que
o contrato de trabalho esclareça as atribuições do professor horista e que elas
sejam seguidas”, afirma.
Tutores on-line
Um tutor que permanece on-line para atender demandas de
alunos deve receber hora extra ou um valor fixo? “Quando o professor executa
horas de trabalho comprovadas e efetivas além da carga horária, certamente a
Justiça do Trabalho vai compreender o serviço prestado como hora extra”,
explica Nelson Mannrich.
Ele analisa que é compreensível que a definição genérica
gere problemas dentro das instituições. “A forma ideal para que esse tipo de
questão seja resolvido é propor, em cada região, a negociação coletiva”, diz.
Fechadas em conjunto com sindicatos, as negociações passam a ser vistas pela
Justiça com transparência. “É um instrumento hábil para determinar como o
trabalho no ensino a distância será executado de forma justa para empregados e
empregadores”, reforça Mannrich.
Um dos exemplos citados foi o do Estado de São Paulo, onde
uma das duas convenções aplicadas aceita que práticas educacionais realizadas
por meios eletrônicos fizessem parte dos 5% destinados às atividades
extraclasse.
Hora aula
Estudo levantado pela Covac Educacional, assessoria jurídica
especializada no setor educacional, verificou que as instituições aplicam
critérios para contratação de profissionais de ensino a distância e para
pagamento de horas tecnológicas de formas diferenciadas. “Não há uma
uniformização ou orientação e os sindicatos também divergem”, afirma José
Roberto Covac, responsável pelo órgão jurídico.
Um dos maiores desafios para uniformizar a aplicação desse
tipo de regra é primário: compreender o que é a hora aula e descrevê-la de
forma correta. “É preciso enxergar exatamente as horas que o profissional passa
em sala e aquelas pra atendimento, coordenação, correção de provas e elaboração
de aulas”, explica Covac. “As instituições que dispõe de professores em regime
integral devem aproveitar esses profissionais que ficam à disposição para
atividades extraclasse. Os problemas ocorrem na gestão dessa jornada. Quando
não há clareza, são contratados novos profissionais que acabam por acumular
funções”, defende.
Controle de jornada
Algumas instituições adotam modelos onde professores com
carga horária integral e pesquisadores são nomeados em ato especial, sem
controle de jornada de trabalho. Nesses casos, há a aplicação de hora extra? O
professor Nelson Mannrich explica que apenas em dois casos pode-se excluir o
controle de jornada.
“Está excluído do controle da jornada de trabalho quem
executa trabalho externo. Não é o caso de alguém que está em casa e é
permanentemente controlado pelo gestor. O segundo excluído é o chefe ou
gerente”, explica. “Para qualquer outro caso, deve haver controle da jornada e,
da mesma forma, há hora extra”, diz. “No entanto, precisamos observar como a
empresa caracteriza o serviço prestado. Se na minha escola não cobro horas de
trabalho e sim resultado, como posso enxergar as horas extras? Elas deixam de
existir nesses casos específicos”, explica Mannrich”.
Fonte: http://www.abmes.org.br/abmes/noticias/detalhe/id/471.
Acesso: 26/11/13
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