“Os
Direitos Humanos e de personalidade do transexual: prenome, gênero e a
autodeterminação
Cláudia Mara de Almeida Rabelo
Viegas, Cesar Leandro de Almeida Rabelo, Leonardo Macedo Poli
Informações
Sobre os Autores
Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas
Doutoranda
em Direito Privado pela PUC Minas. Mestre em Direito Privado pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais. Professora de Direito da Faculdade João
Alfredo de Andrade e da Faculdade Del Rey. Especialista em Direito Processual
Civil pela Universidade Gama Filho. Especialista em Educação a Distância pela
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito
Público – Ciências Criminais. Bacharel em Administração de Empresas e Direito
pela Universidade FUMEC. Tutora em EAD de Direito do Consumidor e Propriedade
Intelectual. Advogada
Cesar Leandro de Almeida Rabelo
Mestre
em Direito Público pela Universidade FUMEC. Professor da FUNCESI. Especialista
em Docência no Ensino Superior pela Pontifícia Universidade Católica do Estado
de Minas Gerais. Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pelo
CEAJUFE - Centro de estudos da área jurídica federal. Bacharel em Administração
de Empresas e em Direito pela Universidade FUMEC. Advogado do Núcleo de Prática
Jurídica da Universidade FUMEC.
Leonardo Macedo Poli
Doutor
em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Bacharel em Direito pela
Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em Direito pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais. Professor adjunto da Universidade FUMEC,
da UFMG e da PUC Minas. Foi coordenador do curso de direito da PUC MINAS no
triênio 2008/2010. Atualmente, Coordenador do Programa de Pós-Graduação em
Direito da PUC Minas. Advogado.
Resumo: O presente trata da necessidade de regulamentação
da cirurgia de adequação de sexo e do direito à identidade do transexual, como
forma de efetivação do direito da personalidade. O ser humano nunca ocupou um
espaço de tamanha relevância como nos tempos atuais. Os Direitos Humanos, nas
suas mais variadas formas de manifestação, estão positivados por todo o mundo.
Contudo, a situação dos transexuais ainda está à margem do direito, há uma
resistência de aceitação da sociedade, movida pelo preconceito e pela
dificuldade em aceitar as diferenças. O texto pretende afastar alguns mitos e
estigmas relativos aos transexuais, enfatizando a necessidade de reconhecimento
e efetivação dos seus direitos ao caracterizá-los como direitos de
personalidade, assim como ao associá-los à idéia de efetivação de um direito
humano.
Palavras-chave: transexuais; direitos da personalidade; direitos
humanos; dignidade da pessoa humana.
Abstract: This paper deals with the need for regulating sex
reassignment surgeries as well as the right of the transsexual to an identity,
as a means to ensure their right to a personality. Never before has the human
being taken up a place of such relevance as they have now. The Human Rights, in
their myriad manifestations, have been positivated by people all over the
world. However, as far as rights are concerned, the situation of the
transsexual has been neglected, as society, moved by prejudice and the
very difficulty to accept difference, is reluctant to accept them. The text
seeks to dispel myths and stigmas associated with the transsexual, emphasizing
the need for the acknowledgement and enforcement of their rights as they are
recognized as having a right to a personality, and associated with the Idea of
enforcement to a human right.
Palavras-chave: transsexual; right to a personality; human
rights; dignity of the human being.
Sumário: 1. Considerações Iniciais; 2. A
Transexualidade e o direito de adequação de sexo; 3. Transexualismo e
subjetividade: direito humano e da personalidade; 3.1. A evolução dos direitos
humanos e sua relação intrínseca com os direitos fundamentais e da
personalidade; 4. O direito à identidade do transexual como direito da
personalidade; 5. O direito de autodeterminação do transexual: 6. Decisões
judiciais que reconheceram o direito à identidade do Transexual no Brasil; 7.
Proposta de Projeto de Lei que regulamenta os direitos à cirurgia de adequação
de sexo e o de identidade do transexual; 8. Considerações finais. Referências
Bibliográficas.
1.
Considerações Iniciais:
Considerando
a atual perspectiva civil-constitucional que insere o homem como centro do
ordenamento, uma das principais bandeiras levantadas pelo Estado Democrático de
Direito se refere à garantia aos bens jurídicos fundamentais figurados sob o
rol dos direitos humanos, principalmente, visando a conquista de direitos
mínimos e básicos à vida, à saúde e à liberdade.
Neste
contexto, pretende-se abordar um tema polêmico e especifico, mas de relevância
em um real Estado Democrático de Direito: os direitos dos transexuais, pessoas
que nasceram com um sexo biológico com o qual não se identificam psiquicamente
e após a cirurgia de adequação sexual, além de serem obrigados a lidar com
aspectos psicológicos, ainda encontram desamparo jurídico.
No
Brasil ainda não há Lei específica que resguarde o direito de adequação sexual
e suas conseqüências jurídicas, mas a jurisprudência majoritária já se mostra
favorável à pretensão, mas com diversas restrições.
A
comunidade médica comprovou através de muitos estudos acerca do fenômeno do
transexualismo ser a cirurgia de redesignação sexual de natureza terapêutica.
Portanto, seria uma disposição do próprio corpo não punível pelo direito,
trata-se de uma situação irresistível àquele indivíduo que reclama a
readequação do seu sexo biológico ao psicológico.
Ocorre
que depois de realizada a cirurgia estas pessoas enfrentam diversos
constrangimentos sociais e psicológicos para alterar o próprio nome e o seu
sexo, pois, o direito não acompanhou as evoluções médicas e sociais. Assim,
para a modificação de sua documentação, o transexual encara mais uma batalha
recheada de subjetividades, a judicial.
O
indivíduo que destoa dos padrões morais, religiosos e sociais de normalidade,
mesmo após a promulgação da Constituição Federal Brasileira que consagrou os
valores da igualdade e da dignidade humana, ainda permanece relegado à margem
da sociedade. Há uma impressionante dificuldade em aceitar as diferenças, e
isso se expressa de modo particularmente intenso no campo da sexualidade.
Apesar
de, ao longo do tempo, tanto homens como mulheres terem adquirido maior
liberdade e amplitude sobre o modo de exercer a sua sexualidade, percebe-se,
porém, grande resistência social diante da homossexualidade e da
transexualidade.
Numa
sociedade contemporânea e complexa, que abarca a multiplicidade, a variedade, a
pluralidade social, onde convivem inúmeros grupos heterogêneos desafiadores das
noções de normalidade, não há espaço para a discriminação.
Os
transexuais desejam apenas o reconhecimento do direito a uma vida digna, e o
Direito precisa acompanhar as mudanças sociais. Como a sociedade não é
estática, o Direito não pode permanecer inerte, ou imporia a vida social uma
imobilidade incompatível com o senso de evolução da própria civilização humana.
Diante
de uma sociedade que evolui em um contexto de interdisciplinaridade e
interdependência, o direito tem a função de harmonizar o princípio dignidade da
pessoa humana, a garantia dos direitos individuais, a tutela dos direitos da
personalidade, assim como o respeito aos direitos humanos, em razão da sua
interdisciplinaridade, deve fundamentar a luta pelos ideais de justiça e
equidade dos cidadãos brasileiros.
Sob
um prisma crítico, surge a necessidade daqueles que não possuem seus direitos
resguardados especificamente, mas que precisam buscar a analogia e a interpretação
de outros meios legais para exercitar a tutela de suas garantias conquistadas
com esforços e teor histórico.
A
questão do transexual propicia a emergência de importantes questionamentos e
reflexões, que atingem não só a discussão sobre o próprio conceito de sexo, mas
também a configuração e a efetivação dos direitos humanos e de personalidade do
indivíduo.
Portanto,
o presente trabalho visa apresentar as inovações jurisprudenciais acerca do
tema, discutir o direito de autodeterminação dos transexuais que optam por não
fazer a cirurgia de adequação de sexo, bem como realizar um enfoque com muita
objetividade sobre o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana como
sustentáculo das modificações no corpo pretendidas e das alterações jurídicas de
prenome e designação de sexo daqueles que passam pelo procedimento cirúrgico.
2.
A Transexualidade e a possibilidade de adequação de sexo:
As
questões atinentes ao transexual vêm à tona atualmente sempre que se discute a
livre disposição de partes do próprio corpo, a alteração de gênero e a
identidade sexual da pessoa.
Para
início do estudo, importa definir a figura do transexual e a estudiosa Tereza
Rodrigues Vieira (2004, p.47) assim o define:
“Transexual
é o indivíduo que possui a convicção inalterável de pertencer ao sexo oposto ao
constante em seu Registro de Nascimento, reprovando veementemente seus órgãos
sexuais externos, dos quais deseja se livrar por meio de cirurgia. Segundo uma
concepção moderna o transexual masculino é uma mulher com corpo de homem. Um
transexual feminino é, evidentemente, o contrário. São, portanto, portadores de
neurodis-cordância de gênero. Suas reações são, em geral, aquelas próprias do
sexo com o qual se identifica psíquica e socialmente. Culpar este indivíduo é o
mesmo que culpar a bússola por apontar para o norte”.
Na
década de 50, após as primeiras experiências cirúrgicas de mudança de sexo
através da retirada do pênis, que surgiu o conceito de “transexualismo”,
formulado pelo conceituado médico norte-americano Harry Benjamin[1] para
designar um distúrbio relativo à identidade sexual. A expressão “transexual”
surgiu para designar indivíduos que, biologicamente normais, se encontravam
inconformados com seu sexo e queriam a sua troca, apesar de possuírem aparelhos
genitais em estado perfeito (FRIGNET, 2002).
Atualmente
a transexualidade pode ser conceituada como uma psicopatologia que leva à
inconformidade entre o sexo biológico e o psíquico, e à conseqüente vontade de
adequar seu corpo às suas convicções em forma de um Transtorno de Identidade
Sexual – CID (Código Internacional de Doenças) - 10. O indivíduo transexual
seria aquele que não aceita sua condição física, sentindo-se como uma mulher
aprisionada no corpo de um homem ou vice-versa. Segundo estudos, o lado
psíquico da dicotomia corpo-mente não pode ser modificado, sendo a cirurgia
para a mudança de sexo a única opção para aliviar a angústia sofrida por
aqueles que vivem tal conflito. Interessante foi o pronunciamento feito pela
ilustre Desembargadora Maria Berenice Dias, citado por Pablo Stolze e Rodolfo
Pamplona:
“Psicanalistas
norte-americanos consideram a cirurgia corretiva do sexo como a forma de buscar
a felicidade a um invertido condenado pela anatomia. Segundo Edvaldo Souza
Couto, o que define e caracteriza a transexualidade é a rejeição do sexo
original e o conseqüente estado de insatisfação. A cirurgia apenas corrige esse
‘defeito’ de alguém ter nascido homem num corpo de mulher ou ter nascido mulher
num corpo de homem” (GAGLIANO, 2006, p.160).
A
determinação do sexo humano não é baseada apenas na genitália, tendo em vista
que na espécie humana o sexo da pessoa equivale a uma conjugação de fatores
biológicos, psicológicos e sociais. A psicanálise demonstrou – com foros
científicos – que o sexo de uma pessoa não tem relação, senão indireta, com
seus genitais. Ser homem ou ser mulher para psicanálise é determinação psíquica
de cada um (FRIGNET, 2002), importando fazer um contraponto entre o sexo
psicológico e o jurídico:
“O
sexo psicológico é aquele que a pessoa acredita pertencer. Muitos psicanalistas
atribuem surgir com a educação atribuída na primeira infância, condicionado a
um ambiente muito desfavorável para um desenvolvimento normal. Já o sexo
jurídico é determinado em razão da vida civil de cada pessoa na sociedade,
trazendo inúmeras conseqüências jurídicas. É designado por ocasião do
assentamento do nascimento da criança, com base em seu sexo morfológico”
(CHOERI, 2001, p.234-235).
O
transexual, psicologicamente, não se identifica com o sexo biológico, o que lhe
acarreta profundo sofrimento, apresentando características de inconformismo,
depressão, angústia e repulsa pelo próprio corpo. Experimenta desconforto
psíquico com seu sexo antagônico, desejando obsessivamente ter seu corpo
readequado ao sexo oposto que acredita possuir. Para ele, a operação de mudança
de sexo é uma obstinação, não se comportando em momento algum de acordo com o
seu sexo biológico.
A
cirurgia de adequação de sexo evoluiu ao longo do tempo, contudo, o direito não
a acompanhou gerando uma série de conflitos, como bem assevera a Desembargadora
e estudiosa Maria Berenice Dias (2004, p. 3):
“Com
a evolução das técnicas cirúrgicas, tornou-se possível mudar a morfologia
sexual externa, meio que começou a ser utilizado para encontrar a equiparação
da aparência ao gênero com que se identifica. Dito avanço no campo médico,
entretanto, não foi acompanhado pela legislação, uma vez que nenhuma previsão
legal existia a regular a realização da cirurgia. Essa omissão levava a classe
médica a uma problemática ético-jurídica e a questionamentos sobre a natureza
das intervenções cirúrgicas e a possibilidade de sua realização. [...] por intermédio
da Resolução nº. 1.482, de 10/9/1997, o Conselho Federal de Medicina autorizou,
a título experimental, a cirurgia de transexuais. Considerando ser o paciente
portador de desvio psicológico permanente de identidade sexual, com rejeição do
fenótipo, foi reconhecido que a transformação é terapêutica e, não havendo lei
que a defina como crime, inexiste afronta à ética médica”.
Somente
a partir da Resolução 1.652/02, do Conselho Federal de Medicina (CFM), que o
procedimento de adequação de sexo não necessitaria mais de autorização
judicial, desde que atendesse aos padrões e requisitos pré-estabelecidos.
A
Comissão Européia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades
Fundamentais considera a cirurgia de adequação de sexo do transexual como uma conversão
curativa com o fim de permitir a integração pessoal e social do doente
ao sexo a que possui convicção de pertencer.
Estudos
realizados por Tereza Vieira (2004, p.95) apontam a possibilidade jurídica da
cirurgia:
“Destarte,
entendemos não ser criminosa a cirurgia porque não há dolo por parte do médico,
não há intenção de mutilar, mas de curar, ou pelo menos amenizar o problema
deste indivíduo. Este, por sua vez, fornece o consentimento esclarecido.
Ademais, existem laudos psicológicos e médicos aconselhando a cirurgia para o
restabelecimento da sua saúde. Não há tipicidade, pois, como sabemos, para que
uma conduta seja considerada criminosa deverá estar tipificada de forma clara
na lei. Não há crime, pois o agente (médico) pratica o ato no exercício regular
de um direito (art. 23, III, Cód. Penal brasileiro). Trata-se de uma cirurgia
ética, autorizada pelo Conselho Federal de Medicina, através da Resolução 1482,
desde setembro de 1997.”
Visando
resolver as controvérsias sobre o tema no âmbito da medicina, em 2010, o
CFM - Conselho Federal de Medicina editou a Resolução CFM 1.955/2010[2] (Publicada
no Diário Oficial da União, de 03 de setembro de 2010, seção I, p. 109/110),
que regulamenta de modo completo a cirurgia de transgenitalismo, revogando a
Resolução CFM 1.652/2002. Esta considerou ser
o paciente transexual portador de desvio psicológico permanente de identidade
sexual; reafirmou a viabilidade técnica para as cirurgias de
neocolpovulvoplastia e/ou neofaloplastia, bem como o fato de que a
transformação da genitália constitui a etapa mais importante no tratamento de
pacientes com transexualismo.
Um
avanço legislativo que merece aplausos foi a Portaria n.º 1.707 (BRASIL, 2008),
que instituiu no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) o processo
transexualizador, a ser implantado em todo o Brasil. Hoje, qualquer pessoa pode
acessar o SUS para submeter-se a uma cirurgia de transegnitalização.
Com
a resolução do Conselho Federal de Medicina e, ainda, considerando os
princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito, negar o
procedimento cirúrgico nesses casos seria lesionar a vida digna, corolário dos
Direitos da Personalidade, de todos que vivem o tormento de possuir uma
identidade sexual física distinta da psíquica.
Diante
da plena possibilidade de submissão a cirurgia de adequação sexual, imperativo
analisar as conseqüências geradas no mundo jurídico, como a alteração do nome e
do gênero. Importa, também, abordar a autodeterminação do transexual, que opta
por não submeter-se a cirurgia, ainda assim assume socialmente o sexo psíquico
com desejo único de uma vida digna, bem como ser aceito pela sociedade.
Negar
o direito de alguém ter o nome que condiz com o gênero sexual é sonegar o
direito de ser feliz. Buscar meios de adequação dos transexuais na sociedade,
baseado no princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da
Constituição Federal), é um objetivo a ser traçado por toda a população
brasileira, seja com a alteração do prenome e gênero, seja com o combate aos
preconceitos enraizados na sociedade.
3.
Transexualismo e subjetividade: direito humano e da personalidade
Em
pleno século XXI ainda se questiona direitos imanentes às condições dos
indivíduos enquanto seres humanos. Em todos os países os povos encontram-se
perdidos e angustiados em lutas pela conquista de direitos mínimos e básicos à
vida e à liberdade.
O
transexual caracteriza-se por seu desejo de ser aceito social e juridicamente
enquanto do sexo oposto ao seu atribuído no momento do nascimento. Portanto,
possuem a aparência de um sexo, mas detém o desejo intenso de pertencer a
outro, o que seguramente contribui para, numa sociedade excludente, ser tratado
de forma periférica e discriminada.
Elisa
Sheibe (2008) expõe que resgatar essa minoria social em um Estado Democrático
de Direito, espaço preservador da convivência humana que aponta a dignidade
concreta como núcleo fundamental, é imprescindível e impositivo, tendo em vista
ser nítido o sofrimento psíquico do transexual por conviver com a frustração de
pertencer ao sexo não desejado.
Tereza
Rodrigues Vieira (2004) descreve a superioridade da alma sobre o corpo, máxima
apregoada por quase totalidade das religiões, poder-se-ia concluir que, no que
toca ao transexualismo, sempre deveria prevalecer o sexo determinado pela alma,
à adequação do corpo à alma, ao sexo psicológico, justificando a cirurgia.
O
direito à saúde, tutelado constitucionalmente por diversos países, é elemento
incentivador primordial dos interesses do transexual em ver reconhecido o seu
direito à adequação de sexo e do prenome. O direito à busca do equilíbrio
corpo-mente do transexual está ancorado, portanto, no direito ao próprio corpo,
no direito à saúde e no direito à identidade sexual, a qual integra um poderoso
aspecto da identidade pessoal.
Conforme
nos ensina Szaniawski (1999, p. 176), "o direito à vida, o direito à
integridade psicofísica e o direito à saúde constituem o trinômio que informa o
livre desenvolvimento da personalidade e a salvaguarda da dignidade do ser
humano, traduzindo-se no exercício da cidadania".
Oportuno
lembrar o pensamento de Immanuel Kant que já à sua época descrevia:
“No
reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um
preço, pode-se pôr em vez dela qualquer outra como equivalente, mas quando uma
coisa está acima de todo o preço, e, portanto, não permite equivalente, então
tem ela dignidade. O direito à vida, à honra, à integridade física, à
integridade psíquica, à privacidade, dentre outros, são essencialmente tais,
pois, sem eles, não se concretiza a dignidade humana. A cada pessoa não é
conferido o poder de dispô-los, sob pena de reduzir sua condição humana, todas
as demais pessoas devem abster-se de violá-los”. (KANT, 1986. p. 77).
Há
direitos que são inerentes à pessoa humana, posto não poderem ser destacados do
homem. Dentre esses direitos tidos como subjetivos os que se acham nessa esfera
pessoal são chamados direitos da personalidade, que gozam de atributos físicos,
psíquicos e morais da pessoa em suas projeções sociais, e são na sua origem
direitos humanos. Constituem-se, portanto, num conjunto de caracteres próprios
da pessoa, comuns da existência humana, ampliando-se, a partir do acúmulo de
conquistas históricas, de cunho filosófico, ético, político e cultural.
Não
restam dúvidas que os direitos relativos à personalidade se tratam de direitos
atrelados à noção de liberdade, de dignidade, de individualidade e de
pessoalidade, devendo todo ser humano ter sua vida com pleno desenvolvimento e
igualdade de oportunidades, sendo esta proteção imprescindível para o
desenvolvimento integral da personalidade.
Na
perspectiva civil-constitucional, a personalidade não se esgota na possibilidade
de titularizar direitos, a pessoa ainda pode tutelar os seus direitos
fundamentais, imprescindíveis ao exercício de uma vida digna. Para Moraes
(1997, p.103), é necessário que se tenha uma tutela genérica, fundamentada na
dignidade da pessoa humana, na qual o "individuo é globalmente
considerado, sua dignidade, onde quer que ela se manifeste, em conformidade e à
luz do ditame constitucional".
Concorda-se
plenamente com Paulo Netto Lôbo (2011, p.1) que afirma: “A Constituição
brasileira, do mesmo modo que a italiana, prevê a cláusula geral de tutela da
personalidade que pode ser encontrada no princípio fundamental da dignidade da
pessoa humana”
A
cláusula geral da dignidade humana inserida na Constituição Federal fundamenta
o direito à identidade do transexual, na medida em que a concepção
repersonalizante do direito reconhece expressamente a tutela jurídica dos
direitos de personalidade, como bem assevera a Douta Ministra Nancy Andrighi:
“A
definição da identidade sexual – que deve ser examinada como um dos aspectos da
identidade humana – e a autorização para a modificação do designativo de sexo
dos transexuais, devem ser examinadas sob o crivo do direito à saúde –
compreendida, segundo a OMS, como a busca do bem estar físico, psíquico e
social –, à luz do princípio da dignidade humana, autêntico arquétipo
primordial, uma das bases principiológicas mais sólidas nas quais se assenta o
Estado Democrático de Direito. Sob essa perspectiva, a afirmação da identidade
sexual, compreendida pela identidade humana, encerra a realização da dignidade,
no que tange à possibilidade de expressar todos os atributos e características
do gênero imanente a cada pessoa. Para o transexual, ter uma vida digna importa
em ver reconhecida a sua identidade sexual, sob a ótica psicossocial, a
refletir a verdade real por ele vivenciada e que se reflete na sociedade.
A
falta de fôlego do Direito em acompanhar o fato social exige, pois, a invocação
dos princípios que funcionam como fontes de oxigenação do ordenamento jurídico,
marcadamente a dignidade da pessoa humana – cláusula geral que permite a tutela
integral e unitária da pessoa, na solução das questões de interesse existencial
humano. Em última análise, afirmar a dignidade humana significa para cada um
manifestar sua verdadeira identidade, o que inclui o reconhecimento da real
identidade sexual, em respeito à pessoa humana como valor absoluto” (BRASIL, 2009).
Elisa
Sheibe (2008) descreve, assim, que é neste contexto que os transexuais, até
então socialmente escondidos e, por conseguinte, excluídos, necessitam
encontrar o seu espaço social. Nesse sentido, os direitos que decorrem da
personalidade do transexual, tais como a adequação sexual, bem como de
alteração de nome e gênero são amplamente reconhecidos como valor
constitucional, devem ser concretizados, pois a partir do advento da
Constituição de 1988 houve uma reformulação do papel da pessoa, que passou a
ocupar o centro do sistema e os transexuais merecem uma norma que regulamente a
sua subjetividade.
3.1. A
evolução dos direitos humanos e sua relação intrínseca com os direitos
fundamentais e da personalidade:
Os
direitos humanos estão atualmente num plano de direito universal, já que o
homem se encontra no centro dos ordenamentos jurídicos dos Estados, mas nem
sempre foi assim, houve grande evolução da dignidade da pessoa ao longo do
tempo.
Inicialmente,
“a sociedade se organizava de forma primitiva, sem hierarquia política e sem
opressão social, todos usufruíam os mesmos bens, não existindo apropriação
privada”. Contudo, a partir do momento em que se criou e “se desenvolveu a
apropriação privada, surgiu também uma forma social de subordinação e
opressão”, pois o titular da propriedade passa a impor seu domínio e subordinar
todos que se relacionam com a coisa apropriada (SILVA, 2000, p. 150).
Os
antigos códigos civis cuidavam apenas de regular as relações com repercussão
patrimonial. Como conseqüência natural dos fundamentos ideológicos do direito
privado liberal, tudo que escapava da órbita patrimonial desinteressava ao
direito privado.
A
filosofia grega considerava que o indivíduo não passava de um mero animal
político ou social, pertencia ao Estado e possuía íntima ligação com o Cosmos e
com a natureza. Na Roma Antiga, também, o indivíduo não era considerado sujeito
de direitos, o sujeito por excelência era o pai de família, capaz de deter a
propriedade, realizar negócios, e proteger a unidade produtiva familiar
(COMPARATO, 2001, p. 26).
A
partir da influência do pensamento de Boécio ao pensamento medieval, surge a
clássica definição de que a pessoa é um ser composto de substância espiritual e
corporal, uma substância do indivíduo, impulsionando a elaboração do princípio
de igualdade essencial de todo ser humano, formando assim, o núcleo do conceito
universal de direitos humanos. (COMPARATO, 2001, p. 19).
A
terceira fase na elaboração do conceito de pessoa, baseada na filosofia de
Kant, “pontuava que cada ser humano em sua individualidade é insubstituível”,
possuindo dignidade que não tem um preço (COMPARATO, 2001, p. 19). Kant
sustentava uma oposição ética entre coisas e pessoas, tendo como pressuposto a
não-coisificação do ser humano, o que conseqüentemente levou a condenação de
várias práticas que atentaram contra a dignidade humana. A escravidão foi um
dos maiores exemplos de atentado à dignidade humana, que perdurou por séculos,
sendo abolida somente no século XX.
O
pensamento kantiano também prenunciou uma quarta etapa de conceituação da
pessoa a qual trouxe “idéias valorativas e fundamentos éticos”. O ser humano
passa a ser visto como o único ser capaz de dirigir sua vida em função de
preferências valorativas, ao passo que é racional e possui vontade própria. É
nesta fase que “os direitos humanos tornaram-se os valores mais importantes da
convivência humana em sociedade” (COMPARATO, 2001, p. 26).
Com
o pensamento existencialista do século XX, dava-se início a última etapa na
elaboração do conceito de pessoa. Afirmava que cada indivíduo possuía uma
identidade inconfundível e singular, ou seja, a unicidade da pessoa humana,
conforme os ensinamentos de Comparato:
“Reagindo
contra a crescente despersonalização do homem no mundo contemporâneo, como
reflexo da mecanização e burocratização da vida em sociedade, a reflexão
filosófica da primeira metade do século XX acentuou o caráter único e, por isso
mesmo, inigualável e irreprodutível da personalidade individual. Confirmando a
visão da filosofia estóica, reconheceu-se que a essência da personalidade
humana não se confunde com a função ou papel que cada qual exerce na vida. A
pessoa não é personagem. A chamada qualificação pessoal (estado civil,
nacionalidade, profissão, domicílio) é mera exterioridade, que nada diz da
essência própria do indivíduo. Cada qual possui uma identidade singular,
inconfundível com a de outro qualquer. Por isso, ninguém pode experimentar,
existencialmente, a vida ou morte de outrem: são realidades únicas e
insubstituíveis” (COMPARATO, 2001, p. 26-27).
Em
1789, a Declaração Universal dos Direitos Humanos condensou toda essa evolução
da pessoa na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, nesta oportunidade
houve a proclamação de igualdade dos homens; mas foi com o fim da segunda
guerra mundial que as pessoas passaram a ter consciência da importância da
dignidade humana perante as agressões sofridas pelos governos autoritários da
época.
A
partir do fim do conflito mundial, que surgiu na Alemanha a Lei Fundamental de
Bonn, fundada na idéia de livre desenvolvimento do ser humano e no
reconhecimento da dignidade da pessoa. Surgiam os primeiros focos de um direito
humanitário, contra a escravidão e a favor da regulamentação dos direitos do
trabalhador. (HAMMERSCHMIDT, p. 114 e 115).
No
Brasil, a Constituição de 1824 trouxe idéias do liberalismo, e a criação de um
Estado com divisão de poderes, consagrando, assim, os direitos individuais. Já
o Código Civil de 1916, ao contrário do atual, não apresentava capítulo
especial sobre os direitos intrínsecos da pessoa, apenas continha algumas
disposições que englobavam os direitos personalíssimos, como o direito à
imagem, o direito moral do autor e sobre o segredo de correspondência.Em 1948,
houve a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembléia
Geral da ONU e, no século XX, acontecimentos políticos exigiram que a
positivação dos direitos humanos alcançasse o direito internacional.
Segundo
Pérez Luño citado por Evanna Soares (2004, p. 41), há que se destacar três
relevantes motivos para a positivação internacional dos Direitos Humanos: no
plano da fundamentação tem-se um retorno à exigência do seu caráter universal e
supra-estatal, livrando-os do arbítrio da jurisdição individual dos Estados;
quanto à titularidade, ampliou-se os sujeitos ativos, para não só proteger os
cidadãos de um único Estado, mas todos os homens, como fez a Declaração
Universal da ONU; quanto à natureza jurídica tem-se a tutela e
garantia desses direitos.
Norberto
Bobbio (1996, p.116), ressalta a relação dos direitos humanos com as
Constituições Democráticas:
“[...]
o reconhecimento e a proteção dos direitos do homem estão na base das Constituições
democráticas modernas. A paz, por sua vez, é o pressuposto necessário para o
reconhecimento e a efetiva proteção dos direitos do homem em cada Estado e no
sistema internacional. Ao mesmo tempo, o processo de democratização do sistema
internacional, que é o caminho obrigatório para a busca do ideal da ‘paz
perpétua’, no sentido kantiano da expressão, não pode avançar sem uma gradativa
ampliação do reconhecimento e da proteção dos direitos do homem, acima de cada
Estado.”
Segundo
Norberto Bobbio (1996, p. 117) a noção de direitos humanos somente encontrará a
exatidão procurada pelos doutrinadores se considerar os seus “vários
fundamentos possíveis”, apoiados no “estudo das condições, dos meios e das
situações nas quais este ou aquele direito pode ser realizado”.
Há
doutrinadores que diferenciam direitos humanos de direitos fundamentais.
Bonavides acredita que os direitos fundamentais “são os do homem que as
Constituições positivaram”, recebendo nível mais elevado de garantias ou
segurança, pois, cada Estado, tem seus direitos fundamentais específicos.
Entretanto, o autor acrescenta que os direitos fundamentais “estão vinculados
aos valores de liberdade e dignidade humana, levando-nos, assim, ao significado
de universalidade inerente a esses direitos como ideal da pessoa humana”.
(BONAVIDES, 2000, p. 514-518)
Canotilho
ensina que a positivação dos direitos fundamentais, considerados “naturais e
inalienáveis” do indivíduo pela Constituição como normas fundamentais
constitucionais, é que vincula o direito. “Sem o reconhecimento constitucional,
estes direitos seriam meramente aspirações ou ideais, seriam apenas direitos do
homem na qualidade de normas de ação moralmente justificadas”. (CANOTILHO,
1998, p.369)
Os
direitos humanos são sempre direitos do ser humano inerente a sua dignidade e
convívio social, sem, contudo, apresentar juridicidade constitucional, enquanto
os direitos fundamentais encontram-se positivados na esfera constitucional.
Ingo Wolfgang SARLET, assim os define:
“Em
que pese sejam ambos os termos (“direitos humanos” e “direitos fundamentais”)
comumente utilizados como sinônimos, a explicação corriqueira e, diga-se de
passagem, procedente para a distinção é de que o termo "direitos
fundamentais" se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e
positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado,
ao passo que a expressão “direitos humanos” guardaria relação com os documentos
de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se
reconhecem o ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com
determinada ordem constitucional e que, portanto, aspiram à validade universal
para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoco caráter
supranacional (internacional).” (SARLET, 2006, p.35-36)
Desse
modo, os direitos humanos seriam garantias inerentes à existência da pessoa,
albergados como verdadeiros para todos os Estados e positivados nos diversos
instrumentos de Direito Internacional Público, não possuindo aplicação simplificada
e acessível a todos os indivíduos.
Por
outro lado, os direitos fundamentais são constituídos por regras e princípios,
positivados constitucionalmente, cujo rol não está limitado aos dos direitos
humanos, que visam garantir a existência digna (ainda que minimamente) da
pessoa, tendo sua eficácia assegurada pelos tribunais internos.
Atualmente,
a doutrina os classifica em direitos fundamentais em primeira, segunda,
terceira e quarta dimensões[3],
cujos conteúdos ensejariam os princípios: liberdade, igualdade e fraternidade.
Direitos
de primeira dimensão ou de liberdade seriam os direitos e as garantias
individuais e políticos clássicos, as chamadas liberdades públicas. Visam
inibir a interferência indevida do Estado na vida do cidadão.
Os
direitos de segunda dimensão ou de igualdade referem-se aos direitos sociais,
econômicos e culturais, surgidos no início do século XX. Eram os direitos de
caráter social. Neste caso, a interferência do Estado era desejada para
garantir a igualdade material dos indivíduos.
Já
os direitos de terceira dimensão ou de solidariedade ou fraternidade são os da
coletividade, de titularidade coletiva ou difusa. Entre eles, encontra-se o
direito à paz, ao meio ambiente equilibrado, à comunicação e à proteção do
consumidor (DE LUCCA, 2008).
Assim,
na terceira dimensão dos direitos fundamentais compreende uma saudável
qualidade de vida, ao patrimônio comum da humanidade, ao progresso, à
comunicação, aos direitos dos consumidores, das crianças e idosos, entre outros
direitos metaindividuais (difusos e coletivos). Esses direitos são
titularizados por pessoas indeterminadas e indetermináveis, dada a sua própria
natureza.
Bonavides
cita a quarta dimensão de direitos originários do mundo globalizado: os
direitos à democracia, à informação, ao pluralismo. Seriam estes direitos que
possibilitariam a legítima globalização política. (BONAVIDES, 2000, p.524)
Norberto
Bobbio também entende ser possível identificar quatro gerações de direitos
fundamentais: os direitos de liberdade, os direitos políticos, os direitos
sociais e econômicos e a nova geração de direitos, relativos "à
integridade do próprio patrimônio genético, que vai muito além do tradicional
direito à integridade física. (Bobbio, 1997, p. 160).
Oportuno
dizer que na obra “A era dos direitos”, Bobbio (1996, p.5) enquadra a
redesignação sexual como “direitos do homem de quarta geração”, isso por estar
inserida no campo da Bioética, abrangendo “um conjunto de direitos diretamente
resultantes dos novos conhecimentos e tecnologias decorrentes das pesquisas
científicas”, possuindo uma abrangência multidisciplinar que convoca os ramos
da Medicina, da Psicologia, da Biologia, da Sociologia, da Filosofia e do
Direito, para se manifestarem a respeito da mudança de sexo do transexual.
Existem
também concepções diversas sobre direitos da personalidade e direitos humanos. A
partir do reconhecimento dos direitos naturais como direitos inerentes ao
homem têm-se de forma mais programática, diferentes concepções sobre os
direitos humanos e da personalidade; pois ambos têm seus
fundamentos aspectos refletidos de acordo com a organização social e política em que
estejam inseridos, com o sistemaeconômico e com o respectivo contexto
histórico.
Dentro
de uma concepção idealista moderna, com suas origens no jusnaturalismo, tanto
os direitos humanos quanto os direitos da personalidade são subjacentes à
natureza racional do homem. Sob a ótica científico-positivista, centrado no
positivismo jurídico, os direitos da personalidade e os direitos humanos são
direitos fundamentais recepcionados formalmente pela ordem jurídica, posto
serem emanados e assegurados pelo poder estatal. Tais direitos são produto de
um processo histórico-estrutural, e de circunstâncias ideológicas, políticas e
econômicas ensejadas através das verdadeiras fontes do direito, marcadas por
lutas de classes e por movimentos sociais.
Na
mesma esteira, os direitos da personalidade, pela sua essência, têm caracteres
peculiares de valoração constitucional axiológica, tendo como cláusula geral o
respeito à dignidade da pessoa humana. São direitos oponíveis erga omnes e
contém em si um dever geral de abstenção, cuja garantia decorre de uma ação
positiva do Estado.
Tanto
os direitos da personalidade quanto os direitos humanos não podem ser
considerados apenas como direitos individuais, mas sim, como condições que
garantam a plena cidadania, sendo direitos, deveres e responsabilidades, a cada
ser humano em toda a sua complexidade.
Os
direitos da personalidade caracterizam-se, principalmente, por serem
intransmissíveis, pois nascem e se extinguem com os seus titulares; são
indisponíveis relativamente, pois são insuscetíveis de disposições[4],
salvo em caso de interesse (cirurgia de adequação de sexo), ou de vontade
própria (exploração de imagem para eventos ou produtos) ou de doação de órgãos;
são direitos irrenunciáveis, impenhoráveis.
O
seu âmbito de defesa não se extingue nem pelo uso nem pela inércia, uma vez que
são imprescritíveis; são inexpropriáveis e, portanto, não podem ser retirados
da pessoa enquanto ela viver; por serem extrapatrimoniais, não tem conteúdo
patrimonial direto, aferível economicamente, exceto dos direitos tidos como
autorais, que podem ser morais, próprios da personalidade.
No
que se refere aos direitos humanos a sua trajetória encontra-se delineada nas
concepções aqui já enfocadas, caracterizando-se em todas as correntes por serem
direitos transcendentais, supra-estatais, uma vez que são inerentes ao homem,
cujo processo de crescimento resulta de circunstâncias ideológicas e políticas,
carecendo, mas que para sua efetividade, o reconhecimento, por parte do Estado,
através do processo legislativo torna-se imprescindível, como defende BOBBIO
(1996, p. 16).
Ao
contrário das épocas remotas, onde o direito era considerado restrito e
diferenciado de acordo com a posição que o indivíduo ocupasse na sociedade,
hoje, todos são considerados como pessoa e enquadram-se como sujeitos de
direitos e obrigações protegidos pela lei.
Pode-se
concluir que os direitos fundamentais, humanos e da personalidade são intrinsecamente
interligados entre si, todos interligados pela cláusula geral da Dignidade da
Pessoa Humana inserida no texto Constitucional, todos têm o objetivo de
proteção da pessoa, sendo os direitos humanos no âmbito internacional, os
direitos individuais fundamentais no nível nacional geral e os direitos da
personalidade na esfera civil.
Portanto,
o direito ao equilíbrio do corpo e da mente do transexual trata-se de um
direito humano, fundamental e de personalidade do indivíduo.
Diante
desse transtorno de gênero, não é possível o Estado Brasileiro, através da
omissão legislativa, deixar de regulamentar os procedimentos necessários à
conformação do sexo, sob pena de infringência aos Direitos Personalíssimos da
classe de indivíduos transexuais.
4. O
direito à identidade do transexual como direito da personalidade:
A
grande barreira que os transexuais enfrentam não está relacionada a cirurgia de
readequação genital ante as alternativas de redução de custo, segurança e de
eficácia da cirurgia. O grande obstáculo está na dificuldade de alteração do
registro civil para completa satisfação com relação à identidade pessoal, a
efetivação do direito da personalidade de alteração do nome e do gênero.
A
alteração do nome e impedida pelo sistema jurídico brasileiro que consagra o
princípio da imutabilidade do nome, não chancelando qualquer pretensão do
transexual à mudança do prenome, como explica a Desembargadora Maria Berenice
Dias:
“A
Lei dos Registros Públicos diz que o prenome só pode ser alterado quando
expuser ao ridículo o seu portador[5],
sendo admitida à alteração somente a pedido do interessado, contanto que não
prejudique o sobrenome da família[6].
Outra objeção que impede a mudança do nome decorre da vedação do art. 1.604 do
Código Civil: “Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do
registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro”. Esse
é o fundamento que leva a Justiça, muito freqüentemente, a indeferir o pedido
de retificação”. (DIAS, p.3)
A
personalidade nem sempre foi reconhecida e inerente a todos os seres humanos,
tendo variado conforme a evolução do homem. (SCHEIBE, 2008, p. 118). A
construção dos direitos de personalidade se confunde com a evolução dos
direitos humanos, assim como a proteção à dignidade da pessoa humana, são os
movimentos de constitucionalização e repersonalização que têm orientado o atual
estudo sobre os direitos da personalidade, todavia, os transexuais ainda
encontram muita dificuldade em efetivar o seu direito básico da personalidade à
identidade pessoal e sexual. (SCHEIBE, 2008, p. 119-120).
No
tocante à identidade propriamente dita, esta é uma das grandes angústias do
transexual, pois quando nasce não identifica seu sexo psíquico com seu sexo
biológico, e, mesmo depois de operado, tem dificuldades de alteração do nome,
bem como da nova designação de gênero, tudo isso visando à efetivação da
verdadeira dignidade humana, como afirma Tereza Vieira:
“O
direito à busca do equilíbrio corpo-mente do transexual, ou seja, à adequação
de sexo e prenome, ancora-se no direito ao próprio corpo, no direito à saúde
(art.196 da Constituição Federal), principalmente, no direito à identidade
sexual, a qual integra um poderoso aspecto da identidade pessoal. Trata-se,
destarte, de um direito da personalidade”. (VIEIRA, 2004, p. 117)
Todas
as pessoas são possuidoras dos direitos da personalidade, na medida em que são
inerentes ao indivíduo, bens essenciais à pessoa, portanto, todos, inclusive o
transexual, têm direito a sua identidade como forma de individualização da
pessoa humana.
Assim,
o estudioso Adriano de Cupis adverte sobre a importância de se ter a
identificação pessoal como um direito de personalidade:
“O
indivíduo, como unidade da vida social e jurídica, tem necessidade de afirmar a
própria individualidade, distinguindo-se dos outros indivíduos, e, por
conseqüência, ser conhecido por quem é na realidade. O bem que satisfaz esta
necessidade é o da identidade, o qual consiste, precisamente, no distinguir-se
das outras pessoas nas relações sociais”. (DE CUPIS, 2004, p. 195).
Por
ser de tamanha importância a identificação pessoal para o ser humano é que o
direito à identidade abarca-se ao rol dos direitos da personalidade, tutelados
pela Constituição Federal. Identidade trata-se de uma qualidade de idêntico
conjunto de características de um indivíduo como nome, idade, peso, altura e
assim por diante. É, portanto, o direito que se tem de exigir um reconhecimento
com individualidade distinta de outras individualidades.
Rabindranath
Valentino Aleixo Capelo de Souza demonstra com a expressão “homem consigo
mesmo”, que o indivíduo assume a sua identidade quando se aceita como é, quando
se ama a si mesmo, asseverando que:
“O
bem da identidade reside assim na própria ligação de correspondência ou
identidade do homem consigo mesmo e está ligado a profundas necessidades
humanas, a ponto de o teor da convivência humana depender da sua salvaguarda em
termos de reciprocidade. [...] reconhecendo-lhe o seu particular modo de ser e
de se afirmar e impondo aos outros o reconhecimento da sua identidade de modo a
que as referências a cada homem respeitem a sua identidade ontológica. O bem da
identidade está na ligação de correspondência entre o homem e ele mesmo, e
mais, esta correspondência está ligada às profundas necessidades do ser humano,
ao ponto de a boa convivência do indivíduo com seus pares depender da
preservação deste direito, e direito este de modo recíproco, entre um indivíduo
e outro”. (SOUZA, 1995, p. 245).
Carlos
Alberto Bittar, acredita ser o direito à identidade, “um elo de ligação entre o
indivíduo e a sociedade em geral”, assim como forma os elementos básicos para o
relacionamento normal nos inúmeros meios, dentre eles o familiar e social, pois
que individualiza a pessoa evitando confusão com outra (BITTAR, 2007, p. 128).
Diante
destas informações acredita-se que o indivíduo que opta pela alteração de sexo,
também deve ter respaldo jurídico em relação ao respeito à sua identidade. Ora
a alteração de sexo jamais lhe retira a condição de pessoa humana portadora de
direitos da personalidade
Nesta
esteira, Tereza Vieira (2004, p. 95) resume:
“A
adequação do Registro Civil, no que concerne ao prenome e ao sexo, é uma das
últimas etapas a serem transpostas pelo transexual, a qual integra o
tratamento. Neste momento sim, deverá o transexual recorrer ao Judiciário.
Os
países signatários da Convenção Européia dos Direitos do Homem têm acolhido o
pedido de adequação de sexo do transexual verdadeiro, desde que esgotadas as
vias internas de recursos. Os Juizes da Corte Européia têm entendido que o não
acolhimento do pedido é uma transgressão ao art. 8o da Convenção. Eis o texto:
“Toda pessoa tem direito ao respeito à vida privada e familiar de seu domicílio
e da sua correspondência”.”
Defende-se
aqui a criação de uma lei federal[7] específica
que regulamente o direito do transexual alterar seu nome e seu sexo, para
evitar a necessidade de ação judicial, pois como Rabindranath ensina com “sua
identidade lesionada, não respeitada, gerará um conflito em sua harmonia
pessoal, resultando, tal fato, em impedimento ao bom desempenho do seu
desenvolvimento próprio, do seu progresso social” (SOUZA, 1995, p. 245).
Adriano
de Cupis (DE CUPIS, 2004, p. 249), no mesmo sentido compreende o direito à
identidade sexual de modo amplo:
“[...]
o direito de aparecer extremamente igual a si mesmo em relação com a realidade
do próprio sexo, masculino ou feminino, ou seja, o direito ao exato
reconhecimento do próprio sexo real, antes de mais nada na documentação contida
no registro do estado civil.”
O
Governador do Estado do Rio de Janeiro, utilizando-se do argumento de evitar a
discriminação, editou um decreto[8] que
possibilita travestis e transexuais a utilizarem o nome social na administração
pública do Estado do Rio de Janeiro, visando à construção de uma política
pública estadual de combate à homofobia e a promoção da cidadania da população
de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, de modo a garantir a
consolidação dos direitos LGBT na gestão pública do Estado do Rio de Janeiro.
Para
os transexuais, a utilização de nome social é um constrangimento público
passível de discriminação. Considerando que a cirurgia modificou o sexo, o nome
deveria ser automaticamente alterado sem necessidade de utilização de nome
social, mas de um novo nome compatível com a nova redesignação sexual.
Outro
aspecto relevante é saber se a adequação do prenome e do sexo deve-se realizar
sob a forma de averbação no registro já existente ou se deve ser produzido um
novo registro. Por um lado, averbar novo nome e sexo no registro público de
nascimento não poderia ser evitado, pois ocorre uma modificação no estado da
pessoa e a lei e a segurança jurídica exige a gravação. Mas, os outros
documentos devem ser novos sem referência da adequação, haja vista que poderia
trazer problemas discriminatórios ao transexual[9].
Tereza
Vieira (2004, p.99) também compartilha desta opinião:
“Os
Registros Públicos relatam fatos históricos da vida do indivíduo. Assim,
acreditamos que a adequação de prenome e de sexo deve constar para demonstrar
que determinado indivíduo passa oficialmente, a partir daquele momento, e não
do seu nascimento, a chamar-se fulano de tal, pertencente ao sexo X (não
retroativo). Entendemos que os direitos dos transexuais e de terceiros estariam
muito mais explicitamente assegurados, se, no Registro Civil constar à
alteração ocorrida. Trata-se de uma ação modificadora do estado da pessoa,
com a adequação de sexo, devendo, portanto, ser averbada (art. 29, p. 1, letra
f, da lei 6.015/73).
Todavia,
defendemos que não deverá ocorrer nenhuma referência à aludida alteração na
Carteira de Identidade, Cadastro de Pessoa Física, Carteira de Trabalho,
Cadastro Bancário, Título de Eleitor, Cartões de Crédito etc”.
Como
o registro público possui efeito constitutivo, servindo para provar a
existência e a veracidade do que está consignado, a alteração registral levada
a efeito torna-se acessível ao conhecimento de todos[10] o
que pode também ser objeto de discriminação. A jurista Maria Berenice Dias
(2000, p. 4) esclarece o conflito entre o princípio da privacidade do
transexual e da publicidade do registro:
“Mesmo
que qualquer alteração posterior deva ser obrigatoriamente mencionada, sob pena
de responsabilidade civil e penal do serventuário, conforme expressamente
preconiza a Lei dos Registros Públicos, tal regra não pode ensejar infringência
ao sagrado princípio de respeito à privacidade e à identidade pessoal. Integra
o restrito campo do livre arbítrio de todo e qualquer indivíduo o direito de
revelar ou ocultar seu sexo real, o sexo com o qual se identifica, o sexo pelo
qual optou. Entre os dois princípios, possui mais relevância o que diz com o
direito à identidade, devendo ser o prevalentemente preservado.”
A
corrente doutrinária de Rosa Maria Nery citada na obra de Maria Helena Diniz
(2002, p. 98), nos coloca outra opção para a adequação do transexual no que se
trata de seu registro civil:
“Os
documentos têm de ser fiéis aos fatos da vida, logo, fazer a ressalva é uma
ofensa à dignidade humana. Realmente, diante do direito à identidade sexual,
como ficaria a pessoa se se colocasse no lugar de sexo “transexual”? Sugere a
autora que se faça, então, uma averbação sigilosa no registro de nascimento,
assim, o interessado, no momento do casamento, poderia pedir, na justiça, uma
certidão “de inteiro teor”, onde consta o sigilo. Seria satisfatório que se
fizesse tal averbação sigilosa junto ao Cartório de Registros Públicos,
constando o sexo biológico do que sofreu a operação de conversão de sexo, com o
intuito de impedir que se enganem terceiros.”
Realmente,
a averbação sigilosa resguardaria o direito de privacidade e intimidade da vida
privada do transexual, evitando a discriminação e, por sua vez, eventuais
humilhações públicas em relação a sua mudança de identidade.
É
inimaginável a pessoa declarar-se de um sexo e ser conhecida na sociedade por
outro até que a sentença judicial reconheça a adequação sexual efetivamente
realizada. Este fato violaria o princípio da dignidade da pessoa humana
inerente à pessoa.
Um
autêntico Estado Democrático de Direito reconhece, respeita e faz cumprir todos
os direitos dos seus cidadãos, inclusive, o direito a uma nova identidade
sexual. O transexual deseja ver seu direito à saúde, à cidadania, à
igualdade, à dignidade, à opção sexual respeitados.
5.
O direito de autodeterminação do transexual:
Pierre
Henri Castel (2003, p.26) traz em sua obra sobre o transexualismo um
questionamento relevante: “Se meu corpo é meu, porque não seria razoável mudar
de sexo”? A partir desta indagação surge outra: mesmo não mudando de sexo,
posso ser tratado pelo meu sexo psicológico? Mereço respeito e possuo
dignidade?
Psiquiatras
esclarecem que os transexuais são pessoas de um sexo que desejam se tornar do
outro, psicologicamente eles já são do sexo oposto ao biológico, o que gera o
transtorno de identidade sexual.
O
ser humano não deve somente respeitar a dignidade do outro, mas a sua própria.
Assim, caso um transexual decida não fazer a cirurgia de redesignação de sexo,
deve ser respeitado. Neste caso, levanta-se a dúvida: mesmo não tendo realizado
a cirurgia de adequação de sexo, o transexual poderia efetivar a alteração de
nome em seu registro público?
Questão
intimamente relacionada à possibilidade jurídica da redesignação sexual é a que
diz respeito aos limites do direito do próprio corpo, da mesma forma que a
partir do princípio do consentimento pessoal, o transexual opta pela cirurgia
de transgenitalização, pode também se autodeterminar decidindo pela manutenção
do corpo indesejado.
Cuida-se
da prevalência da autonomia privada, da expressão de vontade, como meio de
desenvolvimento da personalidade da pessoa humana, com a manifestação do desejo
de corrigir a sua aparência para o sexo que alega possuir ou não. É, em
verdade, uma salvaguarda ético-jurídica que reconhece ao transexual o direito
de se autodeterminar, nos limites constitucionais.
Em
2009, os participantes do Diálogo Latino-americano sobre Sexualidade e
Geopolítica publicaram um manifesto pela retirada da transexualidade do rol de
doenças, trata-se da Campanha Stop Pathologization 2012.
Constava
no manifesto que o diagnóstico de transexualidade não seria um transtorno, mas
um legado da naturalização das identidades. Afirmam que as “doenças de gênero”
são definidas por indicadores chamados DSM (sigla de classificação dos
Transtornos mentais da Associação Americana de Psiquiatria) e CID (código
internacional de doenças) que atuam como reprodutores oficiais da violência.
Os
manifestantes consideram que as pessoas que vivem a experiência de gênero nos
marcos da transexualidade, de modo a acessar o processo transexualizador
completo, incluindo cirurgias de transgenitalização, devem cumprir protocolos
que violam sua a autonomia e as expõe a situações humilhantes, pois o processo
e as regras a que se devem submeter partem do pressuposto de que elas são
pessoas sem capacidade para decidir, que aquilo classificado como “sua doença”
lhes retira a capacidade de autodeterminação. A transexualidade não seria uma
doença, mas apenas um direito do ser humano de se autodeterminar.
Ocorre
que as cirurgias ainda vinham sendo consideradas necessárias para que se obter
a alteração do nome e do sexo no registro civil, o que afasta do transexual não
operado, o direito ao tratamento digno pela sociedade e pelo direito.
No
entanto, vale frisar que a adequação do transexual feminino para o masculino
não é simples. A neofaloplastia, hoje realizada em três momentos: a construção
do neopênis no antebraço da pessoa, a implantação na zona perineal e a
colocação de próteses peniana e testicular de silicone, todas estas fases no
intervalo de três meses -, serve apenas para satisfação anatômica do indivíduo,
sem qualquer funcionalidade, - o que levou a Jurisprudência a considerar a
excepcionalidade desta situação e admitir mudanças de sexo até mesmo sem a
realização das cirurgias, desde que obedecidos os demais requisitos da
mencionada norma médica.
André
Lopes (2011) nos informa sobre a primeira decisão prolatada no Rio de Janeiro,
que autorizou a alteração de nome e de sexo ao transexual que não se submeteu a
cirurgia[11].
Entende-se
que o transexual tem o direito de se autodeterminar e independentemente de
realizar a cirurgia de redesignação de sexo pode ter o seu nome e sexo
alterados, fundamentado no princípio da dignidade humana que impõe a proteção
do ser humano concretamente considerado. Com a personalização dos institutos
jurídicos, o princípio passou não somente a representar um limite à atuação do
Estado, mas também um caminho para a sua atuação positiva, garantindo o mínimo
existencial e dando ao ser humano o direito de ser feliz.
A
estudiosa Maria Berenice Dias afirma que a proteção à
dignidade humana é o elemento norteador da Constituição Federal, o núcleo
jurídico do próprio Estado, sendo a garantia das liberdades individuais:
“A
regra maior da Constituição Pátria é o respeito à dignidade humana verdadeira
pedra de toque de todo o sistema jurídico nacional. Este valor implica adotar
os princípios da igualdade e isonomia da potencialidade transformadora na
configuração de todas as relações jurídicas, sendo que qualquer discriminação
baseada na orientação sexual é um desrespeito à dignidade da pessoa humana e
infringe regra expressa da Constituição Federal que garante a inviolabilidade
da intimidade e da vida privada” (DIAS, 2001, P.71-72)
A
dignidade da pessoa humana tem um conceito amplo que proporciona uma efetiva
fruição dos direitos fundamentais com o firme propósito de garantir a liberdade
e o respeito humano. A dignidade não pode ser compreendida sem a liberdade, nem
a liberdade sem dignidade. A liberdade é tida como valor supremo no Estado
Democrático de Direito. A pessoa é digna porque é autônoma e livre, dispõe de
si mesma de forma responsável, atendendo as leis morais.
Maria
Celina Bodin de Moraes há muito já enfatizava as dimensões da dignidade humana:
“O
substrato material da dignidade assim entendida pode ser desdobrado em quatro
postulados: i) o sujeito moral (ético) reconhece a existência dos outros
sujeitos como sujeitos iguais a ele, ii) merecedores do mesmo respeito à
integridade psicofísica de que é titular, iii) é dotado de vontade livre, de
autodeterminação, iv) é parte do grupo social, em relação ao qual tem a
garantia de não vir a ser marginalizado. São colorários desta elaboração os
princípios jurídicos da igualdade, da integridade física e moral – psicofísica
-, da liberdade e da solidariedade” (MORAES, 2003, p. 85).
Questão
interessante reside na possibilidade de o transexual se opor à cirurgia
corretiva em nome do direito de procriar. Há quem admita a prevalência do
direito de procriação, mantendo-se os órgãos reprodutores, como fator de
perpetuação da espécie. Periódicos informam que recentemente um transexual
britânico, Thomas Beatle, casado com Nancy e já tendo com ela um filho, restou
grávido, advindo uma filha Susan Julette, através de “parto natural” e
noticiários locais informam já a existência de outro transexual, o espanhol
Ruben Noe Coronado, de 25 anos, que estaria esperando gêmeos.
Certo
é que o transexual possui o seu direito de autodeterminação, podendo tutelar
dentre outros o seu direito à liberdade, optando ou não por realizar a cirurgia
de redesignação de sexo, sendo que, em qualquer caso, tem o direito de ser
feliz, não podendo ser discriminado nem alijado da sociedade.
Afinal,
todo ser humano tem dignidade, uma pessoa humana não tem uma dignidade maior ou
menor que a outra por ser ou não transexual. Cada pessoa é dotada de dignidade
em igualdade de condições com as demais. Negar a dignidade a alguém é
considerá-la inferior às demais, o que é inadmissível num Estado Democrático de
Direito, pois a dignidade, enquanto fundamento do Estado, representa então a
premissa essencial para que o homem seja a razão de todo o Direito.
6.
Decisões judiciais que reconheceram o direito à identidade do Transexual no
Brasil:
O
direito dos transexuais, em que pese não haver lei regulamentadora, é
amplamente debatido no Poder Judiciário de todo país. Já são vários os casos
cujas decisões garantiram o direito à identidade para aqueles que se submetem à
cirurgia de mudança de sexo.
Os
primeiros julgados, a princípio, concediam o direito apenas de alteração do
prenome dos transexuais, vedando a alteração do sexo no registro civil, ou nele
fazendo constar o termo “transexual”. Nestas hipóteses além da ofensa à
dignidade da pessoa humana, manifestada pela manutenção de gênero ao qual não
mais pertence, há uma verdadeira discriminação vedada pela Magna Carta, que
importaria na segregação do transexual perante seu meio social.
Com
o passar do tempo, as mudanças de prenome e de gênero começaram a ser
autorizadas em vários Tribunais do Brasil, todavia, predominantemente pelos
Tribunais de Justiça do Rio Grande do Sul (AP 70013909874[12],
AP 70022952261[13] e
AP70022504849[14])
e do Rio de Janeiro (AP 200500117926[15] e
AP 200600161108[16]).
Consolidando
a jurisprudência, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou a alteração
do prenome e da designação de sexo de um transexual de São Paulo que realizou
cirurgia de mudança de sexo. Ele não havia conseguido a mudança no registro
junto à Justiça paulista e recorreu ao Tribunal Superior de Justiça.
A
decisão da Terceira Turma do STJ, (REsp 1008398/SP - 2007/0273360-5 -
18/11/2009 – Min. Nancy Andrighi – Terceira Turma), além de inédita, atentou-se
a garantir a dignidade da pessoa, na medida em que determinou a expedição de
uma nova certidão de registro civil sem que constasse anotação sobre a decisão
judicial. (BRASIL, 2009). O registro de que a designação do sexo foi alterada
judicialmente poderia figurar apenas nos livros cartorários, conforme se
defende neste artigo.
No
processo, a parte afirmou ao STJ que cresceu e se desenvolveu como mulher, com
hábitos, reações e aspectos físicos tipicamente femininos. Submeteu-se a
tratamento multidisciplinar que diagnosticou o transexualismo e passou pela
cirurgia de mudança de sexo. Alegou que seus documentos lhe provocavam grandes
transtornos, já que não condiziam com sua aparência feminina (BRASIL, 2009).
Ainda
foram demonstrados no recurso os julgamentos no Tribunal de Justiça do Amapá,
do Rio Grande do Sul e de Pernambuco, nos quais questões idênticas foram
resolvidas de forma diferente do tratamento dado a ele pelo Tribunal de Justiça
de São Paulo. Nesses estados, foi considerada possível a alteração e
retificação do assento de nascimento do transexual submetido à cirurgia de
mudança de sexo.
Em
primeira instância, o transexual havia obtido autorização para a mudança de
nome e designação de sexo, mas o Ministério Público Estadual
apelou ao Tribunal de Justiça de São Paulo, que reformou o entendimento,
negando a alteração fundamentando que “a afirmação dos sexos (masculino e
feminino) não diz com a aparência, mas com a realidade espelhada no nascimento,
que não pode ser alterada artificialmente” (BRASIL, 2009).
A
relatora do Recurso Especial Ministra Nancy Andrighi, afirmou que “a observação
sobre alteração na certidão significaria a continuidade da exposição da pessoa
a situações constrangedoras e discriminatórias” (BRASIL, 2009). Assim
argumentou a relatora:
“A
cirurgia de transgenitalização foi incluída na lista de procedimentos custeados
pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e o Conselho Federal de Medicina reconhece o
transexualismo como um transtorno de identidade sexual e a cirurgia como uma
solução terapêutica. Assim, se o Estado consente com a cirurgia, deve prover os
meios necessários para que a pessoa tenha uma vida digna. Por isso, é preciso adequar
o sexo jurídico ao aparente, isto é, à identidade”. (BRASIL, 2009).
Ainda
destacou que, atualmente, “a ciência não considera apenas o fator biológico
como determinante do sexo. Existem outros elementos identificadores do sexo,
como fatores psicológicos, culturais e familiares”. Por isso, “a definição do
gênero não pode ser limitada ao sexo aparente” (BRASIL, 2009).
Por
fim, a Ministra brilhantemente esclarece:
“Deve, pois, ser facilitada a alteração
do estado sexual, de quem já enfrentou tantas dificuldades ao longo da vida,
vencendo-se a barreira do preconceito e da intolerância. O Direito não pode
fechar os olhos para a realidade social estabelecida, notadamente no que
concerne à identidade sexual, cuja realização afeta o mais íntimo aspecto da vida
privada da pessoa. E a alteração do designativo de sexo, no registro civil, bem
como do prenome do operado, é tão importante quanto a adequação cirúrgica,
porquanto é desta um desdobramento, uma decorrência lógica que o Direito deve
assegurar. - Assegurar ao transexual o exercício pleno de sua verdadeira
identidade sexual consolida, sobretudo, o princípio constitucional da dignidade
da pessoa humana, cuja tutela consiste em promover o desenvolvimento do ser
humano sob todos os aspectos, garantindo que ele não seja desrespeitado
tampouco violentado em sua integridade psicofísica. Poderá, dessa forma, o
redesignado exercer, em amplitude, seus direitos civis, sem restrições de cunho
discriminatório ou de intolerância, alçando sua autonomia privada em patamar de
igualdade para com os demais integrantes da vida civil. A liberdade se
refletirá na seara doméstica, profissional e social do recorrente, que terá,
após longos anos de sofrimentos, constrangimentos, frustrações e dissabores,
enfim, uma vida plena e digna. - De posicionamentos herméticos, no sentido de
não se tolerar “imperfeições” como a esterilidade ou uma genitália que não se
conforma exatamente com os referenciais científicos, e, consequentemente, negar
a pretensão do transexual de ter alterado o designativo de sexo e nome, subjaz
o perigo de estímulo a uma nova prática de eugenia social, objeto de combate da
Bioética, que deve ser igualmente combatida pelo Direito, não se olvidando os
horrores provocados pelo holocausto no século passado” (BRASIL, 2009)
No
mesmo sentido, em decisão unânime, a Quarta Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) determinou a modificação do prenome e da designação de sexo de um
transexual de Minas Gerais que realizou cirurgia de mudança de sexo (REsp
737993 (2005/0048606-4 - 18/12/2009. Ministro João Otávio de Noronha – Quarta
Turma).
Neste
caso, a parte recorreu contra o Acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais
que não deu provimento ao pleito entendendo que “a falta de lei que disponha
sobre a pleiteada ficção jurídica à identidade biológica impede ao juiz alterar
o estado individual, que é imutável, inalienável e imprescritível” (BRASIL,
2009)
O
relator do recurso, Ministro João Otávio de Noronha, sustentou que deveria ser
permitida a mudança do gênero e prenome no registro civil, adequando-se
documentos e, logo, facilitando a inserção social e profissional, suscitando
que “não entender juridicamente possível o pedido formulado na exordial
significa postergar o exercício do direito à identidade pessoal e subtrair ao indivíduo
a prerrogativa de adequar o registro do sexo à sua nova condição física,
impedindo, assim, a sua integração na sociedade” (BRASIL, 2009).
Alegou
que a ausência de legislação específica que regule as conseqüências jurídicas
advindas de cirurgia efetivada em transexual não justifica a omissão do Poder
Judiciário a respeito da possibilidade de alteração de prenome e de gênero
constantes de registro civil. Para o Ministro, “o transexual, em respeito à sua
dignidade, à sua autonomia, à sua intimidade e à sua vida privada, deve ter
assegurada a sua inserção social de acordo com sua identidade individual, que
deve incorporar seu registro civil” (BRASIL, 2009).
Entretanto
a decisão determinou que fosse averbado, no livro cartorário, que as
modificações procedidas decorreram de sentença judicial em ação de retificação
de registro civil para salvaguardar os atos jurídicos já praticados e manter a
segurança das relações jurídicas no âmbito do direito de família,
previdenciário e esportivo.
O
fato do tema de alteração de registro civil quanto ao gênero e nome para
transexuais ser analisado pela Corte Superior, com decisões similares, é
importante para a luta de efetivação de direitos humanos e de personalidade do
indivíduo.
O
Judiciário não poderia se furtar de analisar questão tão relevante, entretanto,
necessário se faz que o Legislativo se movimente e regulamente o direito à
alteração de nome e redesignação sexual para que os transexuais não precisem
levar tanto tempo para a sua inserção na sociedade com dignidade.
7.
Proposta de Projeto de Lei que regulamenta os direitos à cirurgia de adequação
de sexo e o de identidade do transexual:
PROJETO
DE LEI N° XXX/2011 - Dispõe intervenções cirúrgicas que visem à alteração de
sexo e dá outras providências.
EMENTA: Autoriza o transexual a realizar cirurgia de
adequação de sexo e admite a mudança do prenome e do sexo mediante apresentação
de documentação que comprove a intervenção cirúrgica destinada a alterar o sexo
originário.
Art.
1 - Fica assegurado aos
transexuais o direito a se submeter à cirurgia de redesignação de sexo ou
especificamente de transgenitalização do tipo neocolpovulvoplastia e/ou
procedimentos complementares sobre gônadas e caracteres sexuais secundários
como tratamento dos casos de transexualismo.
Art.
2 - O conceito de transexualismo
obedecerá, no mínimo, aos critérios abaixo enumerados:
a)
Desconforto com o sexo anatômico natural;
b)
Desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características primárias e
secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto;
c)
Permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo,
dois anos;
d)
Ausência de outros transtornos mentais.
Art.
3 - A seleção dos pacientes para
cirurgia de transgenitalismo deverá obedecer à avaliação de equipe
multidisciplinar constituída por médico psiquiatra, cirurgião,
endocrinologista, psicólogo e assistente social, seguindo aos critérios abaixo
definidos, após, no mínimo, dois anos de acompanhamento conjunto:
a)
Diagnóstico médico de transgenitalismo;
b)
Maior de 21 (vinte e um) anos;
c)
Ausência de características físicas inapropriadas para a cirurgia.
Art.
4 – Fica alterado o art. 129 do
Decreto-Lei nº. 2.848 de 7-12-40 - Código Penal – passa a vigorar acrescido do
seguinte parágrafo:
"Art.
129... Exclusão do crime: § 9º) Não constitui crime a intervenção cirúrgica
realizada para fins de ablação de órgãos e partes do corpo humano quando,
destinada a alterar o sexo de paciente maior e capaz, tenha ela sido efetuada a
pedido deste e precedida de todos os exames necessários e de parecer unânime de
junta médica."
Art.
5 - O art. 58 da Lei 6.015 -
31-12-73 – Lei de Registros Públicos - passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 58 - O prenome será imutável, salvo nos casos previstos neste artigo”.
§
1) Quando for evidente o erro gráfico do prenome, admite-se a retificação, bem
como a sua mudança mediante sentença do juiz, a requerimento do interessado, no
caso do parágrafo único do art. 55, se o oficial não houver impugnado.
§
2) Será admitida à mudança do prenome mediante apresentação de documentação que
comprove que o requerente tenha se submetido à intervenção cirúrgica destinada
a alterar o sexo originário.
§
3) No caso do parágrafo anterior deverá ser averbado ao registro de nascimento
a alteração do prenome e da alteração de sexo do transexual.
§
4) A alteração do prenome e do sexo do transexual não constará do documento de
identidade, assim como em outros documentos de identificação, isso como forma
de evitar preconceitos, discriminação e de garantir o direito de personalidade
do autor, garantindo o direito à privacidade e a intimidade constitucionais.
Art.
6 - Esta lei entra em vigor na
data de sua publicação.
Art.
7 - Revogam-se as disposições em
contrário.
JUSTIFICATIVA: Em seu preâmbulo, a Constituição Federal já
estabelece como um dos objetivos da República “instituir um Estado Democrático,
destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça
como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos”. Assegurar que os transexuais possam realizar a cirurgia de
adequação de sexo, bem como o seu direito a alteração de nome e gênero pretende
contribuir para acabar com a discriminação sofrida por este segmento
populacional. Embora a capacidade regida pelo Código Civil se iniciar aos 18
anos, entende-se sensata a opção da idade mínima de 21 anos para realização da
cirurgia de redesignação de sexo. Optou-se por seguir as orientações da Resolução
Conselho Federal de Medicina 1.955/2010 em vigor no Brasil, tendo em vista que
já ocorreram estudos científicos e médicos em relação aos requisitos e
critérios exigidos nos artigos 2 e 3 deste projeto de lei. Assim, a fim de
efetivar o direito de personalidade do transexual e de evitar que continuem a
passar por constrangimentos e discriminação é que se apresenta este projeto de
lei.
8.
Considerações finais:
A
sociedade contemporânea vive constantes transformações que acabam por refletir
nas suas mais diversas esferas. As mudanças de valores sofridas na órbita
social resultaram na reformulação da conduta humana. Atento a isso, o mundo
jurídico evoluiu em busca da consolidação dos direitos humanos, da dignificação
e valorização da pessoa enquanto ser desencadeador de novas propostas e
projetos de vida.
O
movimento de constitucionalização de direitos não é novidade, mas só pôde ser
notado a partir da instituição de um regime político inerente à proteção dos
Direitos Humanos. Por esta razão, apenas com a Constituição Federal de 1988,
que se delineou uma redemocratização política no país, e que, efetivamente,
pôde-se reconhecer a sedimentação dos direitos fundamentais.
Como
se viu a realidade do transexual não é fácil, trata-se de uma pessoa
biologicamente normal que, segundo sua história pessoal, clínica e
psiquiátrica, apresenta sexo psicológico incompatível com a natureza do sexo
somático. Portanto, um indivíduo que vive constantemente atormentado pela idéia
e pelo desejo de se submeter às intervenções cirúrgicas plásticas, com a
finalidade de transformar sua estrutura anatômica sexual e, quando consegue
realizar a cirurgia, encontra sérios óbices no enquadramento de sua identidade.
A
cirurgia para alteração de sexo é apenas o início de um longo caminho até o
reconhecimento do transexual como ser humano dotado de dignidade, pois mesmo
depois da realização da intervenção cirúrgica, e da conseqüente mudança do sexo
morfológico, continua existindo o estigma e a discriminação. O registro civil,
cujo norte é identificar e incluir socialmente o indivíduo serve aos
transexuais, muitas vezes, como instrumento de exclusão.
Nessa
busca de dignidade, foi proposta neste estudo uma sugestão de projeto de lei
que regulamenta os direitos à cirurgia e o de identidade do transexual,
incluindo a alteração de nome e de sexo, sem necessidade de ação judicial. Não
são estéreis as campanhas que incentivam o registro, pois é através dele que,
oficialmente, a pessoa passa a existir perante o Estado. Além disso, o nome
aposto no registro civil de nascimento é um aspecto indispensável ao processo
de individualização da pessoa, e está relacionado ao direito de identidade, um
direito humano e de personalidade do cidadão brasileiro.
Torna-se
imprescindível o respaldo jurídico-social às garantias das minorias, quaisquer
que sejam elas, sobretudo no que tange ao direito da personalidade. Afinal,
cada indivíduo possui como garantia os direitos ao nome, à honra e à
integridade, que juntos convergem na efetiva jurisdição e observância dos princípios
gerais da pessoa humana, dos bens jurídicos fundamentais de uma sociedade, dos
direitos humanos e do real Estado Democrático de Direito. Contudo, na prática,
não é o que infelizmente ocorre.
No
momento em que impera a dinamicidade das relações sociais e que os avanços
científicos trazem diversas conseqüências, mais do que necessário é o resgate
do tema da dignidade da pessoa humana, entendida como vetor de uma sociedade
democrática.
Dessa
forma, progredir e inovar nos direitos dos transexuais são necessidades
urgentes e ao Direito cabe a responsabilidade de resguardar valores e
princípios jurídicos, assegurando a todos a honra, a identidade, a privacidade,
mas, principalmente, a felicidade, que se situa no respaldo jurídico à
dignidade acima de tudo. Neste contexto, as diferenças, os preconceitos e o
extremismo não possuem terreno.
Em
uma sociedade complexa e diversificada como a brasileira, reconhecer a
pluralidade e a diversidade é condição indispensável para a promoção da
dignidade. A cirurgia de transgenitalização ou o direito de autodeterminação do
transexual, assim como a possibilidade de alteração de nome e gênero no
registro público civil devem ser viabilizados e facilitados pelo direito, pois
são caminhos na busca pelo reconhecimento de um direito humano de inclusão
social.
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registro de nascimento do transexual que se submete a cirurgia para
redesignação sexual, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana.
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Conveniência e necessidade de se ajustar a situação defluente das anotações
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e social da pessoa com a que resulta de aludido assentamento.
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O fato de o apelante ainda não ter se submetido à cirurgia para a alteração de
sexo não pode constituir óbice ao deferimento do pedido de alteração do nome
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demonstração de que as características físicas e psíquicas do indivíduo, que se
apresenta como mulher, não estão em conformidade com as características que o
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papel que desempenha na sociedade se caracteriza como de cunho feminino,
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p. 48.
Notas:
[1] Harry Benjamim iniciou seus estudos a partir
de casos de pacientes submetidos a tratamentos hormonais e cirúrgicos que
visavam à transformação da aparência sexual, com base em uma convicção
inabalável de pertencer a outro sexo (FRIGNET, 2011).
O nascimento do fenômeno da
transexualidade se deu efetivamente em 1952, na Cidade de Copenhagen, quando
foi ministrado um tratamento por iniciativa do Dr. Christian Hambúrguer em
conjunto com o Dr Harry Benjamim, no paciente George Jorgensen de 28 anos,
ex-soldado do Exército, visando à transformação da sua aparência sexual por via
hormonal e cirúrgica. Na oportunidade, foi prescrito um tratamento
endocrinológico, que consistiu em diminuir a importância dos caracteres sexuais
secundários do sexo recusado para aumentar sua expressão do lado do sexo
desejado, juntamente com diversas intervenções cirúrgicas e um acompanhamento
psicológico (FRIGNET, 2002).
George depois do tratamento se tornou
“Christine Jorgensen” e se transformou em celebridade no Mundo inteiro,
ganhando inclusive o inusitado título de “Woman of the year” em 1954.
Entretanto, “muito antes disso, já era desejada a modificação do estado do
corpo e as intervenções cirúrgicas alcançavam este firme propósito, ainda que
de modo precário” (FRIGNET, 2002, p.24).
Segundo Green (1998, p.3-14), “já havia
referência da influência transexual na mitologia greco-romana dramatizada na
Venus Castina, Deusa que simpatizava com os anseios das almas femininas detidos
em corpos masculinos”. Citou também um “Deus, filho de Hermes e da Deusa do
Amor Afrodite, chamado Hermafrodita”, que possuía mamas e pênis ao mesmo tempo,
e conforme as representações existentes nos museus lembravam muito os atuais
travestis ou transexuais, tanto em forma física como em postura: masculina e
feminina ao mesmo tempo. Pode-se afirmar que ao longo da história são várias as
manifestações do fenômeno da transexualidade.
Art. 1º Autorizar a cirurgia de transgenitalização do tipo
neocolpovulvoplastia e/ou procedimentos complementares sobregônadas e
caracteres sexuais secundários como tratamento dos casos de transexualismo.
Art. 2º Autorizar, ainda a título experimental, a
realização de cirurgia do tipo neofaloplastia.
Art. 3º Que a definição de transexualismo obedecerá, no
mínimo, aos critérios abaixo enumerados:
1) Desconforto com o sexo anatômico
natural; 2) Desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características
primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto; 3)
Permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo,
dois anos; 4) Ausência de outros transtornos mentais.
Art. 4º Que a seleção dos pacientes para cirurgia de
transgenitalismo obedecerá a avaliação de equipe multidisciplinar constituída
por médico psiquiatra, cirurgião, endocrinologista, psicólogo e assistente
social, obedecendo os critérios a seguir definidos, após, no mínimo, dois anos
de acompanhamento conjunto:
1) Diagnóstico médico de
transgenitalismo; 2) Maior de 21 (vinte e um) anos; 3) Ausência de
características físicas inapropriadas para a cirurgia.
Art. 5º O tratamento do transgenitalismo deve ser realizado
apenas em estabelecimentos que contemplem integralmente os pré-requisitos
estabelecidos nesta resolução, bem como a equipe multidisciplinar estabelecida
no artigo 4º.[...]
Art. 6º Deve ser praticado o consentimento livre e
esclarecido.
Art. 7º Esta resolução entra em vigor na data de sua
publicação, revogando-se a Resolução CFM nº 1.652/02.
Brasília-DF, 12 de agosto de 2010 Roberto Luiz D’avila Henrique Batista E Silva Presidente
[3] Importa esclarecer que a terminologia
“direitos de primeira, segunda e terceira gerações” é duramente criticada por
diversos autores já que estes direitos se completam, expandem-se, acumulam-se
não se substituem ou se sucedem.
[4] O enunciado 4 da I Jornada de Direito Civil:
art. 11: “O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação
voluntária, desde que não seja permanente, nem geral”.
Enunciado 139 da III Jornada de Direito
Civil: artigo 11: “Os direitos da personalidade podem sofrer limitações, ainda
que não especificamente previstas em lei, não podendo ser exercidos com abuso
de direito do seu titular, contrariamente à boa fé objetiva e aos bons
costumes”.
[7] Tereza Vieira (2004, p. 91) nos informa: No
direito comparado existe uma forte corrente favorável ao reconhecimento do
transexualismo, seja por via administrativa, judicial ou legislativa. As
legislações sueca, alemã, holandesa, italiana e de certos estados dos Estados
Unidos e do Canadá consagram os direitos dos transexuais. Por outras vias,
igualmente o reconhecem: Dinamarca, Finlândia, Noruega, Bélgica, Luxemburgo,
França, Suíça, Portugal, Turquia, Peru, etc.
[8] DECRETO Nº. 43065 DE 08 DE JULHO DE 2011.
Dispõem sobre o direito ao uso do nome social por travestis e transexuais na
administração direta e indireta do estado do rio de janeiro e dá outras
providências.
Art. 1º- Fica assegurado às pessoas
transexuais e travestis capazes, mediante requerimento, o direito à escolha de
utilização do nome social nos atos e procedimentos da Administração Direta e
Indireta do Estado do Rio de Janeiro.
Parágrafo Único**: Entende-se por nome
social o modo como às pessoas travestis e transexuais são reconhecidas, identificadas
e denominadas na sua comunidade e meio social. [...]
[9] TRANSEXUALISMO. RETIFICAÇÃO DE REGISTRO
CIVIL. NOME E SEXO. É possível a alteração do registro de nascimento
relativamente ao sexo e ao nome em virtude da realização da cirurgia de
redesignação sexual. Vedação de extração de certidões referentes à situação
anterior do requerente, sob pena de discriminação. (TJRS. – OITAVA CÂMARA CÍVEL
REL. DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA – ACÓRDÃO APEL. CÍVEL PROC. N.º 70028694479
– JULGAMENTO: 28.05.2009).
[10] Art. 17 da Lei nº. 6.015/73: Qualquer pessoa
pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o
motivo ou interesse do pedido. (BRASIL, 2011).
[11] Na presente hipótese, apesar de atestada a
transexualidade da autora através de diversos laudos acostados nos autos, esta
não seguiu as regras do CFM (Conselho Federal de Medicina), - muito embora
digam os peritos médicos o contrário. E assim acredito porque não fez a mesma a
completa cirurgia de transgenitalismo - e nem a quer realizar para a extirpação
das características primárias do genital externo que ainda possui (vagina),
pois considera perigosa e sem utilidade prática a neofaloplastia; fez as
cirurgias de mastectomia (retirada das mamas), histerectomia (retirada do
útero) e ooferectomia (retirada dos ovários) em clínica e hospital particulares
e, por fim, realizou apenas um ano e meio de tratamento psicológico, conforme
relata em seu depoimento. Não posso deixar de registrar que as cirurgias a que
se submeteu a autora não alteraram o seu código genético, apenas a aparência da
mesma que se definiu com o uso de testosterona (hormônio masculino),
adequando-se em parte o corpo à sua mente [...] Certo é que a autora permanece
com vagina e não possui pênis, mas a construção do falus advém de cirurgia
ainda em caráter experimental que oferece riscos bastante elevados, o que
justifica o receio da postulante em realizá-la para a construção de “um enxerto
de pele (neopênis) sem qualquer funcionalidade”, e ainda mais sabendo que a
cirurgia manteria a uretra no lugar em que atualmente se encontra e com a vulva
aberta. A falta do pênis, enquanto órgão, também não significa ausência de
masculinidade, pois se assim fosse considerado a pessoa que sofresse de câncer
e tivesse seu órgão genital extirpado em razão da doença, passaria
conseqüentemente a ser “menos” homem, - conclusão a que me parece equivocada.
Na presente hipótese, exigir a
submissão da autora a uma completa cirurgia de transgenitalização para a
adequação do sexo biológico ao sexo psicossocial, como prelecionam algumas
recentes decisões do Poder Judiciário Nacional, afrontaria, por certo, o
princípio da dignidade humana consagrada na Magna Carta, em seu artigo primeiro
e mais importante.
Como já foi dito e volto a enfatizar, a
sexualidade não se limita à anatomia dos órgãos genitais, mas a um conjunto de
outros fatores psicológicos, sociais e culturais. A requerente, segundo o
estudo psicológico muito bem elaborado pela Drª Lenôra Maria Niquet Gonçalves,
apresenta um desejo imenso de viver e ser aceita como pessoa do sexo oposto e
nenhum argumento é capaz de demovê-la, e dita transformação é tão necessária
para sua vida que absorve todo o seu interesse.
A Drª Lenora Gonçalves foi incisiva ao
afirmar em sua conclusão que: “Ana Paula vivencia conflitos de identidade de
gênero, isto é, sente que houve um erro na determinação do sexo anatômico,
genérico e biológico, ao qual não se sente pertencer, desde a sua infância.
Sofre de uma dicotomia físico-psíquica, possuindo um sexo físico distinto de
sua conformidade social psicológica, o que vem lhe gerando, ao longo de todo o
seu desenvolvimento, infelicidade, baixa auto-estima, rejeição e inadequação
social. Desde sua adolescência sua meta vem sendo à busca de sua real
identidade, já que sempre se sentiu uma pessoa do sexo masculino, mas habitava
um corpo feminino. Já deu significativos passos nessa direção, como o uso
regular de testosterona (hormônio sexual responsável pelos caracteres
masculinos); a mastectomia (retirada das mamas), bem como a ablação de seu
aparelho reprodutor (histerectomia e ooferctomia bilateral). Quanto à colocação
da prótese peniana, optou por não realizar ainda a intervenção, por ser
experimental e de resultados imprevistos. A troca de nome é mais um importante
passo para que aumente significativamente seu sentimento de pertencimento,
auxiliando-o na integração das áreas social, jurídica, emocional, comportamental
e cognitiva, visando a construção de sua identidade masculina. A troca de nome
evitará situações constrangedoras que vivencia constantemente e que impedem a
autonomia da requerente. Ana Paula possui planos importantes para a sua vida
futura, como o ingresso na faculdade e a realização de concursos públicos e
esses planos, essenciais para a sua felicidade, dependem da alteração de seu
registro de nascimento e demais documentos. Permanecendo tal situação, Ana
Paula terá cerceada seu direito ao exercício pleno da cidadania. Ana Paula
conta com o apoio integral de sua mãe e família materna que a aceita em suas
diferenças e a apóia [...] Frente ao exposto, sugerimos imediata Alteração de
Registro reivindicada na inicial.”
A postulante embora não tenha falado,
apresenta fenótipo (inclusive com barba e bigode) e timbre de voz masculinos,
jamais foi mulher sob ponto de vista psicológico, sente-se homem, veste-se com
roupas masculinas, vive na Sociedade como se homem fosse inclusive morando com
uma companheira (opção sexual), não podendo gerar filhos e não sendo do seu
interesse qualquer fim comercial na modificação de sexo. Diante disso, a
permanência do sexo feminino no registro não se justifica, podendo criar
situações vexatórias para a requerente, como as que já ocorrem, não conseguindo
sua adaptação ao meio social, deslocada e vista sempre com preconceito pelos
seus pares (LOPES, 2011).
[12] APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DO NOME E AVERBAÇÃO
NO REGISTRO CIVIL. TRANSEXUALIDADE. CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO. O fato de o
apelante ainda não ter se submetido à cirurgia para a alteração de sexo não
pode constituir óbice ao deferimento do pedido de alteração do nome. Enquanto
fator determinante da identificação e da vinculação de alguém a um determinado
grupo familiar, o nome assume fundamental importância individual e social.
Paralelamente a essa conotação pública, não se pode olvidar que o nome encerra
fatores outros, de ordem eminentemente pessoal, na qualidade de direito
personalíssimo que constitui atributo da personalidade. Os direitos
fundamentais visam à concretização do princípio da dignidade da pessoa humana,
o qual, atua como uma qualidade inerente, indissociável, de todo e qualquer ser
humano, relacionando-se intrinsecamente com a autonomia, razão e
autodeterminação de cada indivíduo. Fechar os olhos a esta realidade, que é
reconhecida pela própria medicina, implicaria infração ao princípio da
dignidade da pessoa humana, norma esculpida no inciso III do art. 1º da
Constituição Federal, que deve prevalecer à regra da imutabilidade do prenome.
Por maioria, proveram em parte. (RIO GRANDE DO SUL, 2006).
[13] APELAÇÃO CÍVEL. TRANSEXUALISMO. ALTERAÇÃO DO
GENERO/SEXO NO REGISTRO DE NASCIMENTO. DEFERIMENTO. Tendo o autor/apelante se
submetido a cirurgia de " redesignação sexual ", não apresentando
qualquer resquício de genitália masculina no seu corpo, sendo que seu
"fenótipo é totalmente feminino ", e, o papel que desempenha na
sociedade se caracteriza como de cunho feminino, cabível a alteração não só do nome
no seu registro de nascimento mas também do sexo, para que conste como sendo do
gênero feminino. Se o nome não corresponder ao gênero/sexo da pessoa, à
evidência que ela terá a sua dignidade violada (RIO GRANDE DO SUL, 2008)
[14] APELAÇÃO. RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL.
TRANSEXUALISMO.TRAVESTISMO. ALTERAÇÃO DE PRENOME INDEPENDENTEMENTE DA
REALIZAÇÃO DE CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO. DIREITO À IDENTIDADE PESSOAL E À
DIGNIDADE. CONFIRMAÇÃO DE SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU. ACOLHIMENTO DE PARECER DO
MINISTÉRIO PÚBLICO DE SEGUNDO GRAU. A demonstração de que as características
físicas e psíquicas do indivíduo, que se apresenta como mulher, não estão em conformidade
com as características que o seu nome masculino representa coletiva e
individualmente são suficientes para determinar a sua alteração. A distinção
entre transexualidade e travestismo não é requisito para a efetivação do
direito à dignidade. Tais fatos autorizam, mesmo sem a realização da cirurgia
de transgenitalização, a retificação do nome da requerente para conformá-lo com
a sua identidade social. Pronta indicação de dispositivos legais e
constitucionais que visa evitar embargo de declaração com objetivo de
prequestionamento. REJEITADAS AS PRELIMINARES, NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME (RIO
GRANDE DO SUL, 2009).
[15] TRANSEXUALISMO. REGISTRO CIVIL DE NASCIMENTO.
RETIFICACAO. MUDANCA DE PRENOME. MUDANCA DO SEXO. Registro Civil. Pedido de
retificação do prenome e do sexo constantes do assentamento de nascimento do
postulante na serventia de Registro Civil das Pessoas Naturais. Pessoa que,
inobstante nascida como do sexo masculino, desde a infância manifesta
comportamento sócio-afetivopsicológico próprio do genótipo feminino,
apresentando-se como tal, e assim aceito pelos seus familiares e integrantes de
seu círculo social, sendo, ademais, tecnicamente caracterizada como transexual, submetendo-se
a exitosa cirurgia de transmutação da sua identidade sexual originária,
passando a ostentar as caracterizadoras de pessoa do sexo feminino. Registrando
que não é conhecido pelo seu prenome constante do assentamento em apreço, mas
pelo que pretende substitua aquele. Conveniência e necessidade de se ajustar a
situação defluente das anotações registrais com a realidade constatada, de modo
a reajustar a identidade física e social da pessoa com a que resulta de aludido
assentamento. Parcial provimento do recurso, para determinar que sejam
promovidas as alterações pretendidas no aludido assentamento (RIO DEJANEIRO,
2005).
[16] TRANSEXUAL. REGISTRO CIVIL. ALTERAÇÃO.
POSSIBILIDADE. CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 4º DA LEI DE
INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL DIANTE DA AUSÊNCIA DE LEI SOBRE A MATÉRIA. SENTENÇA
QUE ATENDE SOMENTE AO PEDIDO DE ALTERAÇÃO DO NOME. REFORMA PARCIAL PARA TAMBÉM
PERMITIR A ALTERAÇÃO DO SEXO NO REGISTRO DE NASCIMENTO. PROVIMENTO DO APELO. A
jurisprudência tem assinalado a possibilidade de alteração do nome e do sexo no
registro de nascimento do transexual que se submete a cirurgia para
redesignação sexual, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana
(RIO DE JANEIRO, 2006).
Informações
Sobre os Autores
Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas
Doutoranda
em Direito Privado pela PUC Minas. Mestre em Direito Privado pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais. Professora de Direito da Faculdade João
Alfredo de Andrade e da Faculdade Del Rey. Especialista em Direito Processual
Civil pela Universidade Gama Filho. Especialista em Educação a Distância pela
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito
Público – Ciências Criminais. Bacharel em Administração de Empresas e Direito
pela Universidade FUMEC. Tutora em EAD de Direito do Consumidor e Propriedade Intelectual.
Advogada
Cesar Leandro de Almeida Rabelo
Mestre
em Direito Público pela Universidade FUMEC. Professor da FUNCESI. Especialista
em Docência no Ensino Superior pela Pontifícia Universidade Católica do Estado
de Minas Gerais. Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pelo
CEAJUFE - Centro de estudos da área jurídica federal. Bacharel em Administração
de Empresas e em Direito pela Universidade FUMEC. Advogado do Núcleo de Prática
Jurídica da Universidade FUMEC.
Leonardo Macedo Poli
Doutor
em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Bacharel em Direito pela
Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em Direito pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais. Professor adjunto da Universidade FUMEC,
da UFMG e da PUC Minas. Foi coordenador do curso de direito da PUC MINAS no
triênio 2008/2010. Atualmente, Coordenador do Programa de Pós-Graduação em
Direito da PUC Minas. Advogado.
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