“Com
2,8 mi de deficientes, SP tem 62% das unidades de saúde sem acessibilidade
Por Wanderley Preite Sobrinho -
iG São Paulo | 02/09/2013 11:00
Texto
Ministério Público investiga e cobra mudanças na rede municipal. Em
algumas faltam Projeto Técnico e Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros
Wanderley Preite Sobrinho/iG
Fachada do Caps Pirituba 2, na zona oeste: calçada
sem adaptação, entrada sem piso tátil e ausência de banheiro para deficientes
Quarenta e cinco milhões de deficientes físicos em
todo o Brasil, 2,8 milhões somente na cidade de São Paulo, segundo o último
Censo do IBGE. Embora o número de deficientes na capital paulista seja maior do
que a população total de Salvador - a terceira maior cidade do País -, 62% dos
hospitais municipais em São Paulo trabalham sem a adaptação necessária para
receber esses pacientes. Para exemplificar o que médicos e enfermeiros ouvidos
pela reportagem classificam de “regra”, o iG conta o que acontece
em três unidades de saúde do município que passaram por investigação no
Ministério Público de São Paulo.
Hospitais em SP funcionam sem acessibilidade, mesmo com 3 milhões de
deficientes
Sob inquérito há dois anos, o Centro de Atenção Psicossocial (Caps) 2,
em Pirituba, zona oeste, foi instalado em um imóvel que não se adequou aos
deficientes. A rampa para a entrada e o caminho até a unidade não utilizam piso
tátil. Nas dependências do prédio - voltado a deficientes mentais -, a passagem
impede o uso adequado de cadeira de rodas, segundo relatório da Comissão
Permanente de Acessibilidade (CPA), ligada à própria prefeitura.
Além de faltar bebedouros acessíveis, não há banheiro para pessoas com
deficiência. No dia 22 de fevereiro deste ano, o Ministério Púbico deu 180 dias
para concluir o inquérito, prazo que terminou este mês. A partir de então, uma
ação civil pública pode ser instaurada.
“A rampa não é um detalhe para quem tem dificuldade de locomoção”,
afirma Robson Gonzales, diretor da Arpa Arquitetura, especializada em
acessibilidade. “O mais esquecido, entretanto, é o deficiente visual, que sofre
quando não tem piso tátil que o leva ao balcão, nem telefone próprio para se
comunicar com a família. Normalmente, ele vai fazer uma consulta, pega uma
senha sem braile e espera ser chamado por um painel sem orientação por voz.”
Irregularidade ainda maior enfrenta o Hospital Municipal Doutor
Alexandre Zaio, na Vila Nhocune, na zona leste. Em vistoria de abril, o Corpo
de Bombeiros denunciou a ausência de Auto de Vistoria (AVCB).
“O AVCB é a certificação dos bombeiros de que o prédio está em ordem com
as medidas de segurança contra incêndio”, explica o tenente Mauro Antônio
Brancalhão. “Ele é obrigatório para qualquer edificação, exceto casas com uma
só família. A penalidade, no entanto, cabe à prefeitura, responsável pela
fiscalização.”
Sobre a acessibilidade do prédio, foram identificadas 146 inadequações
pela CPA. Até o dia 13 de agosto, o MP não recebeu nenhuma resposta da
prefeitura sobre as soluções para o prédio, onde as rampas de acesso estão fora
do padrão e faltam piso tátil e banheiro exclusivo para deficientes. Também não
há bebedouro e telefone adaptados, enquanto os assentos fixos impedem o
posicionamento de cadeira de roda na sala de espera. As calçadas ao redor do
hospital também estão em mau estado.
“O entorno das unidades de saúde precisa de adaptação”, afirma Gonzales.
“Desde o ponto de ônibus à calçada que leva ao hospital recomenda-se piso
tátil, além da necessidade de instalar orelhão especial perto da unidade. O
acesso a muitos hospitais é por uma rua inclinada com a calçada acompanhando o
desnível. Quem usa cadeira de rodas tem de rezar para não rolar.”
Ao contrário do que acontece no Caps e do Alexandre Zaio, o inquérito
aberto em dezembro de 2012 ajudou a solucionar problemas idênticos na Unidade
Básica de Saúde (UBS) da Vila Formosa, também na zona leste. Atualmente, uma
empreiteira conclui uma reforma esperada pelos usuários há anos.
O prédio não dava acesso a pessoas com deficiência, as rampas estavam
fora do padrão e o único sanitário para deficientes estava com oito
inadequações, como a altura incorreta nas barras de ferro utilizadas para o
apoio do paciente. A investigação identificou outros problemas na UBS, como
extintores com prazo de validade vencido (já resolvido) e ausência de Projeto
Técnico Simplificado, obrigatório para a organizar o sistema de segurança
contra incêndio.
O especialista elogia a legislação brasileira para o setor, mas diz que
o problema está em sua execução. “As leis estipulam multas, mas isso raramente
acontece sob a justificativa de que o Brasil ainda está na fase de
esclarecimento e educação”, diz ele. “Mas isso não funciona no País. Já se
foram 13 anos desde a lei 10.098 e a sociedade civil com deficiência vai
continuar esperando pela boa vontade do governo e do comerciante para adaptar
seus edifícios”.
Outro lado
Ao iG , a Secretaria Municipal da
Saúde confirmou que “38% das unidades da rede municipal são acessíveis. Nas
demais, quando o paciente não tem condições de acessar o local, um profissional
o atende no andar inferior”. O município prevê R$ 14,6 milhões para obras de
acessibilidade no ano que vem.
“Com relação ao projeto para adaptação do Caps 2 Pirituba, informamos
que já foi publicada no Diário Oficial do Município a autorização para
realização de serviços gerais de manutenção preventiva, corretiva, reparações,
adaptações e modificações", informou a secretaria.
Quanto à UBS Vila Formosa, “o Projeto Técnico Simplificado foi
solicitado pelo Corpo de Bombeiros após vistoria realizada na Unidade. Somente
após a finalização da reforma, o engenheiro poderá aprovar o Projeto Técnico
Simplificado.”
Em relação ao Alexandre Zaio, “todas as respostas condizentes às
adequações físicas e acessibilidades necessárias serão contempladas na proposta
de reforma e ampliação, que se encontra em fase final de avaliação pelo
Departamento de Edificações (Edif) e inclui o sistema de proteção e combate a
incêndio.”
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