"1. Aplicação da Lei no tempo - As normas prejudiciais podem
ser retroativas?
A primeira análise na elaboração da petição inicial de uma
Reclamação Trabalhista, será a verificação dos reflexos das normas, se
benéficas ou prejudiciais ao reclamante. Como principal argumento para a
manutenção da eficácia de norma anterior mais benéfica é em relação ao direito
adquirido.
Em tese, a Reforma Trabalhista não teria eficácia para
retirar direitos do trabalhador cuja relação jurídica é anterior à Lei
13.467/17, em observância pura à segurança jurídica inerente ao Estado
Democrático de Direito, e ao DIREITO ADQUIRIDO, nos termos da redação
constitucional em seu Art. 5º:
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato
jurídico perfeito e a coisa julgada;
Este entendimento já foi concretizado pela Súmula 191 do TST
que entendeu em caso análogo a não aplicação de lei norma por ser prejudicial
ao empregado:
Súmula nº 191 ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. INCIDÊNCIA. BASE
DE CÁLCULO (cancelada a parte final da antiga redação e inseridos os itens II e
III)
(...)
III - A alteração da base de cálculo do adicional de
periculosidade do eletricitário promovida pela Lei nº 12.740/2012 atinge
somente contrato de trabalho firmado a partir de sua vigência, de modo que,
nesse caso, o cálculo será realizado exclusivamente sobre o salário básico,
conforme determina o § 1º do art. 193 da CLT.
Trata-se de aplicação do princípio da irretroatividade de
norma nova, disposto no Decreto-Lei nº 4.657/42 (LIDB):
Art. 6º. A lei em vigor terá efeito imediato e geral,
respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.
Assim, mesmo que em vigor, a lei que estabeleça
alterações que prejudique algum direito
do trabalhador, tem-se a necessidade de argumentar sobre a irretroatividade da
norma, pra fins de que produza efeitos, quando prejudiciais, somente para os
contratos de trabalho celebrados a partir 11/11/2017, em respeito à cláusula
pétrea de proteção ao direito adquirido.
Todavia, trata-se de um tema polêmico e sem análise do
judiciário ainda. Dependendo do direito pleiteado, sugere-se que a petição
inicial traga uma preliminar sobre a irretroatividade parcial da Reforma
Trabalhista conforme modelo que disponibilizamos aqui.
2. Análise de mérito
O segundo ponto de análise para a elaboração da petição é a
influência pontual sobre os direitos pleiteados, uma vez que com a alteração de
determinadas normas, tem-se o necessário trabalho hermenêutico de argumentação
sobre a aplicação ou não da reforma Trabalhista a cada caso concreto.
Este trabalho deve preponderantemente evidenciar os impactos
da Lei 13.467/17 sobre os direitos do trabalhador, com destaque à ponderação
sobre à prevalência da norma mais benéfica, conforme tópico anterior.
3. Liquidação prévia - Pedido certo, determinado e líquido
Dentre as principais mudanças trazidas pela Reforma
Trabalhista, importante destacar sobre a necessária liquidação prévia com a
alteração do Art. 840 da CLT, passando a adotar a seguinte redação:
§ 1o Sendo escrita, a
reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a
breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser
certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante
ou de seu representante.
§ 2o Se verbal, a
reclamação será reduzida a termo, em duas vias datadas e assinadas pelo
escrivão ou secretário, observado, no que couber, o disposto no § 1o deste
artigo.
Com isso, tem-se a necessidade de apresentar os valores
discriminados das verbas pleiteadas e todos os seus reflexos, sob pena de
extinção do processo, conforme redação do referido artigo 840 em seu §3º:
§ 3o Os pedidos que
não atendam ao disposto no § 1o deste artigo serão julgados extintos sem resolução
do mérito.
A importância de uma discriminação minuciosa dos valores
pleiteados ganha especial relevância, uma vez que estes valores serão tomados
por base para o pagamento das verbas de sucumbência, outra novidade trazida
pela reforma trabalhista.
Interessante atentar ao fato de quem nem sempre será possível
apurar todos os valores estimados, pela dependência de informações que estão
sob posse do Réu.
Nestes casos, para não correr o risco da sucumbência, pode
ser interessante ingressar previamente com um pedido cautelar antecedente de
exibição de documentos.
Ou ainda, indicar na petição inicial um pedido liminar para
antecipação dos documentos, referindo ao Juízo a impossibilidade de discriminar
de forma pormenorizada os valores devidos, socorrendo-se do pedido genérico
disposto no Art. 324 do CPC/15:
Art. 324. O pedido
deve ser determinado.
§ 1o É lícito, porém, formular pedido genérico:
I - nas ações universais, se o autor não puder individuar os
bens demandados;
II - quando não for possível determinar, desde logo, as
consequências do ato ou do fato;
III - quando a determinação do objeto ou do valor da
condenação depender de ato que deva ser praticado pelo réu.
Assim, quando comprovada a impossibilidade de se mensurar os
valores pleiteados, pode ser uma alternativa a indicação de pedido genérico.
Todavia, por não termos precedentes ainda sobre o tema, o pedido genérico pode
ser bem arriscado.
4. Análise de riscos - Sucumbência
A Reforma trouxe também a previsão de sucumbência à parte
vencida:
“Art. 791-A. Ao
advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de
sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15%
(quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do
proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor
atualizado da causa.
(...)
§ 3o Na hipótese de
procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca,
vedada a compensação entre os honorários.
§ 4o Vencido o
beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda
que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações
decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade
e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em
julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir
a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de
gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do
beneficiário.
Portanto, especial atenção na hora da formulação dos pedidos
e na mensuração dos valores, pois a parcela perdida repercutirá em sucumbência.
Especial atenção aos pedidos exorbitantes ou sem a certeza de
amparo legal, pois nestas hipóteses a sentença parcialmente procedente poderá
igualmente trazer um prejuízo ao Reclamante (Art. 791-A, §3º).
5. Cuidados com a Litigância de má fé
O princípio da lealdade processual e boa-fé deve vigorar
plenamente em qualquer atuação processual, exigindo dos litigantes o respeito
aos deveres impostos pelo artigo 80 do Código de Processo Civil.
Ao sedimentar tais princípios, o novo CPC dispõe em seus
artigos 5º e 79º o principio da boa-fé deve ser obedecido por todos que fazem
partes do processo:
“Art. 5o Aquele que de qualquer forma participa do processo
deve comportar-se de acordo com a boa-fé.”
“Art. 79. Responde por
perdas e danos aquele que litigar de má-fé como autor, réu ou interveniente.”
No mesmo sentido, a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/17)
previu a preocupação com a boa fé nos artigos 793-A a 793-D de forma semelhante
ao CPC:
‘Art. 793-B. Considera-se litigante de má-fé aquele que:
I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei
ou fato incontroverso;
II - alterar a verdade dos fatos;
III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal;
IV - opuser resistência injustificada ao andamento do
processo;
V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato
do processo;
VI - provocar incidente manifestamente infundado;
VII - interpuser recurso com intuito manifestamente
protelatório.’
‘Art. 793-C. De ofício
ou a requerimento, o juízo condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que
deverá ser superior a 1% (um por cento) e inferior a 10% (dez por cento) do
valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que
esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas
que efetuou.
As mudanças legislativas objetivam cumprir um papel
importante na busca pela lealdade processual, inclusive na celeridade no
trâmite dos processos.
Apesar de predominar o entendimento de que "A pena por
litigância de má-fé deve ser aplicada à parte, e não ao seu advogado, nos
termos dos arts. 14 e 16 do Código de Processo Civil.” (BRASIL, STJ, REsp 1247820/AL,
Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/06/2011, DJe
01/07/2011)
Sempre subsiste o risco de uma penalidade regressiva ao
Advogado em ação própria:
RECURSO ORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DE ADVOGADO.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. Exclui-se da condenação a responsabilidade solidária de
advogado pelo pagamento da multa por litigância de má-fé, uma vez que esta
sujeita-se à observância do devido processo legal, em ação própria. Recurso
provido parcialmente. (TRT-1 - RO: 00111433720155010024 RJ, Data de Julgamento:
23/08/2016, Nona Turma, Data de Publicação: 12/09/2016)
Para
mitigar riscos como estes, é crucial extrair do cliente o máximo de
informações, especialmente aquelas que fragilizam o pleito, pois surpresas na
fase instrutória, além de comprometer o processo, podem colocar em cheque a
ética do profissional e gerar um grande prejuízo ao Reclamante. Assim, alguns
cuidados para que este prejuízo não recaia sobre o Advogado:
Não ingresse com ações temerárias sem provas. O primeiro
filtro de justiça deve ser feito pelo Advogado;
Busque previamente a obtenção de documentos ou elementos
necessários a proar o direito, mesmo que seja preciso um Pedido de Tutela
Cautelar Antecedente de exibição de documentos;
Nos casos em que a prova seja comprometida, peça ao cliente
para assinar um termo de veracidade - modelo aqui, contendo os fatos e provas
disponibilizadas para se resguardar de eventual responsabilização profissional
por litigância de má fé.
6. Gratuidade de Justiça
A Lei 13.467/15, em seu Art. 790, trouxe critérios mais
objetivo à concessão da Gratuidade de Justiça:
§ 3o É facultado aos
juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer
instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça
gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem
salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos
benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
§ 4o O benefício da
justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos
para o pagamento das custas do processo.” (NR)
O benefício da justiça gratuita será concedido quando
evidenciado que o salário é igual ou inferior a 40% do limite máximo dos
benefícios do RGPS (o que em 2017 é o valor de R$ 2.212,52), ou diante da
demonstração de insuficiência de recursos para pagamento das custas do
processo.
Até o momento a súmula nº 463 do TST regulamentava o
requisito para a concessão da gratuidade da justiça mediante a simples
declaração de insuficiência financeira. Agora é preciso demonstrar a renda
inferior ou comprovar insuficiência de recursos, a exemplo do comprometimento
do salário com pensões, plano de saúde, etc.
Sobre o tema, destaca-se ainda o risco do pagamento de
honorários periciais nos casos em que a perícia solicitada não for favorável:
Art. 790-B. A
responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente
na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita.
Razão pela qual, a liquidação já mencionada neste artigo
assume especial relevância, para fins de que o valor requerido não seja
inferior ao devido (esbarrando em decisão extra-petita), ou muito acima do
devido, repercutindo em sucumbência sobre a parcela não concedida (Art. 791-A,
§3º).
Afinal, importa destacar que a sucumbência, mesmo nos casos
de deferida a gratuidade de justiça serão compensados em eventual proveito
econômico ou apenas suspensos para futura execução (Art. 791-A, §4º).
7. Ônus da prova
Por fim, destaca-se outro ponto que afeta diretamente a
elaboração da Reclamação Trabalhista, foi a previsão já disposta no CPC/15
sobre o ônus da prova:
Art. 818. O ônus da
prova incumbe:
I - ao reclamante, quanto ao fato constitutivo de seu
direito;
II - ao reclamado, quanto à existência de fato impeditivo,
modificativo ou extintivo do direito do reclamante.
Todavia, nos termos do §1º do referido artigo, tem-se a
possibilidade de se requerer a inversão do ônus da prova, desde que demonstrada
a inviabilidade ou desequilíbrio entre as partes na obtenção de algumas provas:
§ 1º Nos casos
previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à
impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos
deste artigo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário,
poderá o juízo atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por
decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se
desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
Assim, diante de algumas circunstâncias, o Reclamante deve
solicitar expressamente a inversão do ônus da prova, evidenciando os motivos do
desequilíbrio na obtenção das provas necessárias.
Para ver um modelo de petição inicial de Reclamação
Trabalhista com estas alterações, clique aqui. Veja também como ficou a
Contestação após a Reforma Trabalhista - modelo aqui.
Há notícias de que estão por vir alterações à Lei 13.467/17
publicada, repercutindo em novas análises sobre os impactos nos pedidos, sobre
o direito adquirido e sobre eficácia nas relações jurídicas vigentes.
Evidentemente que este artigo, longe de esgotar o assunto,
abre apenas uma brecha para discutirmos mais ativamente sobre os impactos na
atuação processual do operador de Direito”.
Fonte: https://modeloinicial.com.br/artigos-juridicos/37/Reforma-Trabalhista-que-muda-peticao?utm_source=email%2Fusers_feed&utm_medium=email.
Acesso: 03/12/2017
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