“A citação do devedor de alimentos no novo CPC
Maria Berenice DiasMaria Berenice Dias
Publicado em 04/2016
De todas as novidades trazidas pelo codificador, no intuito
de acelerar a cobrança dos alimentos, talvez o mais eficaz seja admitir a
citação postal.
Estranhamente, o novo Código de Processo Civil (L
13.105/2015) tenta ressuscitar a Lei de Alimentos (L 5.478/1968) ao expressamente
excluir a ação de alimentos das ações de família (CPC 693 parágrafo único).
Toma para si tão somente a cobrança e a execução dos alimentos, revogando os
artigos 16 a 18 da Lei de Alimentos (CPC 1.072 V). Olvidou-se, no entanto, de
revogar também o artigo 19, que fala em prisão de até 60 dias, uma vez que
fixou o prazo de aprisionamento de um a três meses (CPC 538 § 3º).
Dedica um capítulo ao cumprimento de sentença que reconheça a
exigibilidade de obrigação de prestar alimentos (CPC 528 a 533) e outro para a
execução de alimentos (CPC 911 a 913). Agora está explicitado: a prisão será
cumprida em regime fechado, permanecendo o devedor separado dos presos comuns
(CPC 528 § 4º). Nem se tem como saber o que quer dizer preso "comum".
Talvez porque incomum deveria ser alguém cometer o crime mais hediondo que
existe: homicídio qualificado por dolo eventual - assumir o pai o risco de
produzir a morte dos próprios filhos. No entanto a lei reconhece apenas a
prática do delito como abandono material (CPC 532), cuja pena é de detenção, de
um a quatro anos e multa de 10 salários mínimos (CP 244).
Tanto os alimentos frutos de sentença condenatória como os
alimentos provisórios estabelecidos em decisão interlocutória sujeitam-se a
mais de uma modalidade de cobrança. Também os alimentos estabelecidos
consensualmente em título executivo extrajudicial podem ser buscados: mediante
a ameaça de coação pessoal (CPC 528 § 3º e 911 parágrafo único); por desconto
em folha de pagamento (CPC 529 e 912); ou viaexpropriação (CPC 528 § 8º, 530 e
913).
A eleição da modalidade de cobrança depende tanto da sede em
que os alimentos estão estabelecidos (título judicial ou extrajudicial) como do
período que está sendo cobrado (se superior ou inferior a três meses).
A cobrança dos alimentos via coação pessoal compreende o
máximo de três prestações alimentares já vencidas. O devedor só se livra da
prisão se pagar as parcelas cobradas e mais as que se vencerem durante o curso
do processo (CPC 528 § 7º). Incorporou a
lei o enunciado da Súmula 309 do STJ: O débito alimentar que autoriza a prisão
civil do alimentante é o que compreende até as três prestações anteriores ao
ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.
Havendo parcelas antigas e atuais (vencidas a mais de três
meses), não conseguiu o legislador encontrar uma saída. Continua sendo
indispensável que o credor desencadeie duplo procedimento, o que só onera as
partes e afoga a justiça. Com relação às três últimas parcelas, pode usar a via
da prisão. Quanto às mais antigas, é necessário fazer uso da via
expropriatória. Ambos os processos correm em paralelo. Mesmo que o devedor
cumpra a pena e não pague os alimentos, a execução prossegue pelo rito da
expropriação (CPC 530). Impositivo que, neste caso, as execuções sejam
apensadas e prossigam em um único processo, pela integralidade do débito.
Pela nova sistemática os alimentos acordados consensualmente
em título executivo extrajudicial são cobrados mediante a propositura de uma
execução judicial (CPC 911).
Estabelecidos por sentença ou decisão judicial, os alimentos
são cobrados via cumprimento de sentença. Quando se trata de sentença
definitiva ou acordo judicial, a busca pelo adimplemento é promovida nos mesmos
autos (CPC 531 § 2º). A cobrança dos alimentos provisórios e dos fixados em
sentença sujeita a recurso se processa em autos apartados (CPC 531 § 1º).
Em qualquer das formas de cobrança (cumprimento de sentença
ou execução de título extrajudicial) ou o seu rito (expropriação ou prisão), o
devedor precisa ser cientificado pessoalmente. É intimado quando se tratar de
cumprimento de sentença e citado na execução de título extrajudicial. A
expressão "pessoalmente" constante do artigo 828 do CPC não significa
que a intimação deve ser levada a efeito por oficial de justiça. Pode ser feita
pelo correio. Basta que a carta AR seja na modalidade de "mão
própria", o que garante a "pessoalidade" da intimação. A
expressão intimação pessoal não significa que o ato terá que ser por oficial de
justiça. A intimação se diz pessoal porquanto se opõe àquela que é feita na
pessoa do advogado no cumprimento de sentença (CPC 513 § 2º). Contudo, pode se
realizar pelo correio (CPC 274) ou por meio eletrônico (CPC 270), desde que
dirigida, naturalmente ao citando.[2] É o que também afirma Araken de Assis:
são pessoais tanto a intimação por meio eletrônico (CPC 270) como a postal (CPC
273 II).[3]A alteração é das mais significativas e para lá de salutar. Traduz
sensível aceleração para a cobrança de alimentos. Não tem correspondência na
lei atual (CPC 247) a exceção prevista na lei anterior, que excluía a
possibilidade de citação postal nos processos de execução (CPC/73 222 d).
Exige-se tão só que, feita pelo correio, o devedor pessoalmente firme o AR.
Trata-se assim de intimação pessoal. Aliás, quando representado pela Defensoria
Pública a intimação é feita pessoalmente com aviso de recebimento (CPC 513 § 2º
II). A ênfase também salienta que a intimação não pode ser feita na pessoa do
advogado, mediante publicação no Diário da Justiça, como é autorizado nas
demais hipóteses de cumprimento da sentença (CPC 513 § 2º I). São consabidas as
manobras do devedor para se esquivar do oficial de justiça. Claro que o
executado pode se evadir do carteiro, evitando receber a carta AR, seja pela
dissimulação da própria identidade, seja pela recusa pura e simples. Nesse
caso, como os carteiros não dispõem da fé pública de que gozam os oficiais de
justiça, deve o exequente requerer a intimação por mandado (CPC 249).
Buscado o cumprimento da sentença ou de decisão
interlocutória, se o devedor não pagar e nem justificar o inadimplemento, cabe
ao juiz, de ofício, determinar o protesto do procedimento judicial (CPC 528 §
1º). Desnecessário o trânsito em julgado da decisão para tal providência (CPC
517 e 519). Quando se trata de título
executivo extrajudicial, injustificadamente, a medida não tem previsão
expressa. Inclusive a remissão é feita aos §§ 2º a 7º do art. 528 (CPC 911
parágrafo único). No entanto, nada,
absolutamente nada impede que o juiz tome igual providência em se tratando de
débito alimentar, devendo a medida ser tomada de ofício. Segundo Luiz Fernando
Valladão Nogueira, a previsão expressa do protesto é direcionada para todas as
hipóteses de cumprimento de sentença, eis que prevista genericamente no art.
517 do CPC. É óbvio que, seja por força de lei específica de regência (L
9.492/97), seja pela aplicação subsidiária do cumprimento da sentença, à
execução por título extrajudicial (CPC 771 parágrafo único), este também é
protestável.[4]
Em qualquer hipótese de cobrança o credor pode obter certidão
comprobatória da dívida alimentar para averbar no registro de imóveis, no
registro de veículos ou no registro de outros bens sujeitos a penhora, arresto
ou indisponibilidade (CPC 828).
Quando o credor estiver sob o abrigo do benefício da
assistência judiciária, os emolumentos a notários e registradores não são
devidos (CPC 98 IX), o que alcança o protesto da execução de alimentos.
Também é possível ser a dívida inscrita nos serviços de
proteção ao crédito, como SPC e SERASA (CPC 782 § 3º).
Flagrada conduta procrastinatória do executado, havendo
indícios da prática do crime de abandono material (CP 244), cabe ao juiz dar
ciência ao Ministério Público (CPC 532).
De todas as novidades trazidas pelo codificador, no intuito
de acelerar a cobrança dos alimentos, talvez o mais eficaz seja admitir a
citação postal. Uma mudança que - infelizmente - ainda não vem sendo
implementada pela justiça.
NOTAS
[2] NOGUEIRA, Luiz Fernando Valladão. A execução de alimentos
no novo Código de Processo Civil. Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões. Belo
Horizonte: IBDFAM, 2015, v. 7. jan./fev. p. 21.
[3] ASSIS, Araken de. Processo Civil Brasileiro. Vol. 3. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1.601.
[4] NOGUEIRA, Luiz Fernando Valladão. A execução de alimentos
no novo Código de Processo Civil. Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões. Belo
Horizonte: IBDFAM, 2015, v. 7. jan./fev. p. 11-22”.
Fonte: https://jus.com.br/artigos/48440/a-citacao-do-devedor-de-alimentos-no-novo-cpc.
Acesso: 28/06/2016
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Qualquer sugestão ou solicitação a respeito dos temas propostos, favor enviá-los. Grata!