sábado, 17 de junho de 2017

TESTAMENTO VITAL.

Apontamentos do testamento vital.

*Márcia Cristina Diniz Fabro

O testamento vital é um tema polêmico, tanto para o Direito Brasileiro, quanto para o Direito Estrangeiro.
O instituto abrange aspectos  da autonomia da vontade privada, do direito fundamental à vida e  ainda do princípio da dignidade da pessoa humana, dentre outros celeumas jurídicos.
Poder  passar por um cenário de doença sem querer submeter-se a tratamentos dolorosos e ineficazes diante do quadro conclusivo da medicina de que a morte é certa e virá indubitavelmente, pode levar a pessoa através de o testamento vital dispor acerca do episódio delineado.
A legislação brasileira, se por um lado privilegia a vontade privada de  evitar o sofrimento na doença e buscar abreviá-lo através do óbito, de outra sorte, colide com a proteção constitucional  do direito à vida.
No Brasil, diante do princípio da dignidade da pessoa humana a par da tutela constitucional da autonomia da vontade privada, é possível, a meu ver dispor sobre certos direitos de como morrer.
Minimizar o sofrimento na hipótese de doença terminal é realidade, sim, se elaborado  por agente capaz ou seu representante legal.
Não obstante à vida ser direito indisponível, este direito vê limites diante de obstáculos intransponíveis que dizem respeito ao evento morte.
Neste sentido, a questão que se coloca é:  qual o limite de autonomia da vontade quanto aos direitos indisponíveis.         
Qual  a possibilidade do individuo dispor em testamento vital a forma de uma morte mais rápida e menos dolorosa? Há o direito à morte no lapso temporal da autonomia da vontade do paciente ou testador ou representante legal? Em que casos?
Para o eminente jurista Adriano Marteleto Godinho: “ o testamento vital (também chamado testamento biológico, testamento de vida ou testamento do paciente), consiste num documento, em que o interessado juridicamente capaz declara quais tipos de tratamentos médicos aceita ou rejeita, o que deve ser obedecido nos casos futuros em que se encontre em situação que o impossibilite de manifestar sua vontade”.
Aqui o paciente é capaz civilmente, e neste caso, não resta dúvida quanto a sua legalidade no ordenamento jurídico, para a corrente majoritária do nosso sistema jurídico.   
Em apertada síntese, o paciente, dispõe dentre outros direitos quais os tipos de tratamentos médicos que deseja em determinados eventos de doenças incuráveis, basicamente.
Neste esteio é mister adentramos na eutanásia instrumento através do qual a morte é abreviada, quando o paciente se vê acometido de doença terminal.
A eutanásia trás a morte  futura como escape para aliviar o sofrimento presente, quando não há tratamento disponível no campo da medicina que possa curar o acamado.
E, ainda  quando a postergação da morte leva o doente a um sofrimento angustiante e extremamente doloroso, também a morte surge para expurgar o processo de dor do paciente e da família.
Neste sentido os médicos põem fim à dor do paciente e dos familiares.
Mas só,  o podem fazê-lo na medida em que haja expressa determinação inserida em testamento vital ou, ainda, no prontuário médico do paciente.
A dúvida que surge é a de que :podem os familiares representarem a vontade do acamado no caso de sua incapacidade física ou mental? É possível? Qual o limite?
A Resolução 1.995, do Conselho Federal de Medicina, aprovada em agosto de 2012, permite que os médicos cumpram a vontade do paciente  em querer ou não receber tratamentos  que prolonguem sua vida quando esses se mostrarem insuficientes para a reversibilidade do seu quadro clínico, e esta vontade estiver consignada no testamento vital, ou até no prontuário médico que dispensa desta forma o testamento vital.
Nestas hipóteses o paciente pode relatar sua vontade de abreviar a morte e nestes casos sua solicitação constará ou no prontuário  médico ou em testamento vital.
Destarte o médico valendo-se da Resolução 1.995/ 2002, pode proceder  à suspensão do tratamento  penoso para que o paciente possa morrer sem dor.
 O art. 5º da CF dispõe como direito fundamental  o direito a liberdade, o direito a vida e estes estão compreendidos no principio da dignidade da pessoa humana (art. 1º,inciso III,CF). No art. 5,III,CF, está positivado que: “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”.
A medicina por vezes, para prolongar a vida do paciente em situação terminal, submete-o a tratamento que pode ser considerado como degradante ou desumano, daí surge à possibilidade do indivíduo capaz romper com o tratamento para abreviar seu sofrimento, através de testamento vital ou declaração que será acolhida por escrito no prontuário médico.
Sob, este prima o princípio da dignidade da pessoa humana viabiliza a existência de uma vida digna e como tal se considerar que o tratamento médico submeterá o doente a tratamento desumano ou cruel e o paciente estará ceifado do princípio da dignidade da pessoa humana é possível amenizar a dor através de sua vontade ou de seu parente próximo, representante legal, trazendo afinal à morte imediata.
Frise-se que no  caso do incapaz, quem responde por seus atos são seus representantes legais e neste sentido assumem em nome deste a  sua vontade.
Veja-se que  no caso de prolongamento artificial da vida, sem possibilidade de cura, nosso ordenamento jurídico deveria permitir em casos excepcionalíssimos o processo de morte abreviada, sem dor, para evitar o sofrimento desumano, degradante e doloroso tanto para o acometido do mal, e ainda para  dar cabo a angustia  dos seus familiares (Princípio do Afeto).
Em todos os casos é preciso ter-se em mente que nossa legislação veda o auxilio ao suicídio de modo que abreviar a vida, só poderá vingar em casos excepcionais, quais sejam em doenças graves e incuráveis que exponham os seus portadores a tratamento doloroso e desumano.(art.5º,III,CF).
O art. 196 da CF dispõe que: “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantida mediante politicas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos, e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”.
Infere-se que a saúde deve ser assegurada desde a prevenção até o estágio final da doença, que não é sinônimo de manutenção da vida do doente sem dignidade.
Tratamentos que violam fragrantemente a dignidade da pessoa humana por obstinação terapêutica violam a vida digna e a morte em paz.
Ademais, roborando a permissibilidade da morte antecipada, o artigo 15 do Código Civil dispõe que:  “ninguém pode ser constrangido a  submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou intervenção cirúrgica, em razão também do princípio da liberdade ao próprio corpo”. Referido texto legal, reforça a possibilidade da quitação do sofrimento pela morte.
Ademais, nos casos em que o paciente não tenha condições de exprimir a sua vontade, ou por causa dos medicamentos ou por conta da doença propriamente, estas situações rigorosamente se analisadas permitirão que a família decida ou não pela manutenção de tratamentos direcionados ao paciente terminal que não puder expressar sua vontade. (art.3º, inciso II, art.1.767, inciso,I e art. 1.775 do Código Civil ).
Desta forma, pelas razões apresentadas somos pela viabilidade de o médico suspender o tratamento de terapêuticas paliativas para diminuir o incomodo do sofrimento em pacientes de estágio terminal, isto se o paciente ou seu representante legal  expressarem sua vontade de por fim ao tratamento desumano e ou degradante.
Isto para não macular o direito à morte digna tendo por parâmetros os princípios da dignidade da pessoa humana, direito à vida, igualdade, liberdade, saúde e vedação a tratamento desumano, degradante e tortura.
As ponderações atendem aos princípios bioéticos, representados pelo Biodireito.
Encerro citando um trecho escrito por D Urso em 2005, intitulado: “A eutanásia no Direito Brasileiro”, artigo publicado no Diário do Grande ABC (...) Na forma libertadora, o enfermo incurável pede que se lhe abrevie a dolorosa agonia, com uma morte calma , indolor. Já na forma piedosa, o moribundo encontra-se inconsciente e tratando de caso terminal que provoca sofrimento agudo, proporcionando horríveis espetáculos de agonia, seu médico ou seu familiar, movido por piedade, o liberta, provocando a antecipação de sua hora fatal. “Quanto à forma eugênica, trata-se da eliminação daqueles seres apsíquicos e associais absolutos, loucos incuráveis e outros”.





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