ERRO DE DIAGNÓSTICO. EXAMES MÉDICOS.RESPONSABILIDADE CIVIL.


AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. LABORATÓRIO. ERRO DE DIAGNÓSTICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. DANOS MATERIAIS. RESSARCIMENTO DAS DESPESAS EFETIVAMENTE COMPROVADAS NOS AUTOS.

I. A responsabilidade civil é a obrigação de reparar o dano causado a alguém. Para ser caracterizada a responsabilidade civil subjetiva, nos termos do art. 927, do Código Civil, é necessária a comprovação da ação (conduta comissiva ou omissiva), da culpa do agente, da existência do dano e do nexo de causalidade entre a ação e o dano. No entanto, a hipótese dos autos trata de relação de consumo, sendo objetiva a responsabilidade do fornecedor de serviços, nos termos do art. 14, caput, do CDC, ou seja, a parte requerida responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados ao consumidor, bastando a comprovação do prejuízo e do nexo de causalidade.

II. Além do mais, em se tratando da realização de exames médicos, os laboratórios possuem obrigação de resultado, e não de meio, na medida em que é legítima a expectativa do consumidor quanto à exatidão das conclusões lançadas nos respectivos laudos. 

III. No caso em tela, restou demonstrada a ocorrência do erro de diagnóstico, eis que dois exames realizados deram positivo para Toxoplasmose, devendo o laboratório-réu reparar os danos suportados pela autora em decorrência da falha na prestação do serviço. Aliás, não prospera o argumento de que se tratou de “falso positivo”, na medida em que tal circunstância se insere dentre os riscos assumidos pela instituição no exercício de sua atividade empresarial.

IV. Com relação aos danos morais, embora o erro de diagnóstico possa caracterizá-los, a questão deve ser examinada caso a caso, observando-se, dentro outras questões, o tipo de exame realizado. Na hipótese dos autos, é  cabível a indenização pretendida, uma vez que a hipótese dos autos reflete o dano moral in re ipsa ou dano moral puro, tendo em vista que o sofrimento, a angústia e o transtorno causados pelo requerido são presumidos, o que confere o direito à reparação sem a necessidade de produção de outras provas. Ora, a autora se encontrava grávida e teve a notícia de que era portadora de Toxoplasmose, doença extremamente grave e que apresenta elevados riscos ao feto, situação que perdurou por mais de dois meses.

V. A indenização por danos morais deve levar em conta a condição social da autora, o potencial econômico do réu, a gravidade do fato, o caráter punitivo-pedagógico da reparação e os parâmetros adotados por esta Câmara em casos semelhantes. A correção monetária pelo IGP-M incide a partir do presente arbitramento, na forma da Súmula 362, do STJ. Em se tratando de contrato de prestação de serviços (laboratório – paciente), os juros moratórios de 1% ao mês devem incidir a partir da citação.

VI. De outro lado, no que tange aos danos materiais, não restou demonstrado o prejuízo informado na inicial, devendo ocorrer o ressarcimento apenas das despesas efetivamente comprovadas. O valor a ser ressarcido deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M, desde o desembolso, e a crescido dos juros moratórios de 1% ao mês, a contar da citação, por se tratar de relação contratual.

VII. Redimensionamento da sucumbência, considerando o decaimento recíproco das partes em suas pretensões, porém maior do requerido.

APELAÇÃO PROVIDA.  


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento à apelação.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. Jorge Luiz Lopes do Canto e Des.ª Lusmary Fatima Turelly da Silva.
Porto Alegre, 30 de maio de 2018.


DES. JORGE ANDRÉ PEREIRA GAILHARD,
Relator.

RELATÓRIO
Des. Jorge André Pereira Gailhard (RELATOR)
Trata-se de recurso de apelação interposto por Tatiane da Silva contra a sentença que, nos autos da Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais ajuizada contra Núcleo de Análises Clínicas Ltda., julgou a demanda nos seguintes termos:


ISSO POSTO, fulcro no artigo 487, inciso I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por TATIANE DA SILVA contra o NÚCLEO ANÁLISES CLÍNICAS, na forma da fundamentação supra.

Sucumbente, condeno a parte autora ao pagamento das despesas processuais, com fundamento no art. 82, §2º do CPC, cuja abrangência está elencada no art. 84 do mesmo diploma legal, bem como ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da ré, os quais arbitro em 15% sobre o valor atualizado da causa, conforme art. 85, §2º do CPC, diante do grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado, considerando que não foram produzidas provas e a tramitação do feito por aproximadamente dois anos.

A exigibilidade dos encargos sucumbenciais, no entanto, fica suspensa, em razão do benefício da gratuidade judiciária concedido à autora (fl. 40).

Sustenta a petição recursal que o juízo considerou de forma isolada apenas três exames laboratoriais realizados, quando foram cinco realizados. Diz que o juízo a quo também deixou de observar que no primeiro exame realizado pelo apelado, em 30.06.2014, a apelante teve um diagnóstico totalmente diferente dos três posteriores, ou seja, naquela ocasião nenhuma alteração foi constatada, prosseguindo a gravidez em sua normalidade. Afirma que não prospera o argumento de que o adequado tratamento teria erradicado a doença, já que o apelado apresentou um primeiro resultado não reagente (coleta em 30.06.2014 – fl. 22), um segundo exame reagente (coleta em 22.09.2014 – fl. 23), com índice de 0,94, e um terceiro exame reagente (coleta em 21.10.2014), com índice de 0,74, enquanto que a prescrição do medicamente ocorreu em 13.12.2014 e o resultado de erradicação fora coletado em 22.12.2014, sendo que a autora usou o medicamento por pouco mais de uma semana. Descreve que o quinto exame, feito por um terceiro laboratório, se mostrou totalmente negativo. Salienta que o médico não tem outras ferramentas para confirmação da doença. Destaca a incidência do Código de Defesa do Consumidor e da inversão do ônus da prova. Argumenta que a partir da constatação da suposta presença da doença, foi dado início ao tratamento médico, desnecessário, causando exclusivamente pela falha na prestação do serviço. Acrescenta que com a notícia da gravidade da situação, a apelante sofreu severamente com a possibilidade de contágio ao feto, diante do seu estado gravídico, situação que, atendendo as peculiaridades do caso concreto, sujeita p apelado à compensação de ordem moral. Defende a procedência da ação para condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais e materiais.
Requer o provimento do apelo (fls. 141/148).
Intimado, réu não apresentou as contrarrazões, conforme certidão de fl. 149.
Subiram os autos a este Tribunal.
Distribuídos, vieram conclusos.
Cumpriram-se as formalidades previstas nos arts. 929 a 935, do CPC.
É o relatório.
VOTOS
Des. Jorge André Pereira Gailhard (RELATOR)
O apelo é tempestivo. Dispensado o preparo em razão do benefício da justiça gratuita.
Cuida-se de demanda na qual a parte autora postula a reparação pelos danos morais e materiais suportados em virtude de suposto erro de diagnóstico em exames laboratoriais realizados pelo réu, que teria apontado que a mesma era portadora de Toxoplasmose, fato ocorrido durante a gestação.
Pois bem. Segundo Maria Helena Diniz: “A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal” (in Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidade Civil, Volume 7, 29ª edição, Editora Saraiva, São Paulo, 2015, p. 51).
Nessa linha, importante referir que para ficar caracterizada a responsabilidade subjetiva é necessária a comprovação da ação (conduta comissiva ou omissiva), da culpa do agente, da existência do dano e do nexo de causalidade entre a ação e o dano.
Acerca do tema, os arts. 186, 187 e 927, do Código Civil, assim dispõem:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

(...)

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

No entanto, a hipótese dos autos trata de relação de consumo, sendo objetiva a responsabilidade do fornecedor de serviços, nos termos do art. 14, caput, do CDC, ou seja, a parte requerida responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados ao consumidor.
Eis a redação da aludida norma legal:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Sobre a matéria, Antônio Herman V. Benjamin, Cláudia Lima Marques e Leonardo Roscoe Bessa (in Manual de Direito do Consumidor, 6ª edição, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 2014, p. 190) mencionam que:

(...)

Ao contrário do que sucede no art. 12, o Código, no art. 14, não fragmenta a responsabilidade, colocando de um lado o comerciante (distribuidor ou varejista) e do outro o fabricante, o produtor, o construtor e o importador. Fala-se apenas em “fornecedor”, gênero que inclui todos os partícipes da cadeia de produção e distribuição. Tal ocorreu porque, de regra, o fornecedor do serviço é o próprio prestador, aquele, pessoa física ou jurídica, que entrega a prestação. É certo que os serviços podem ser prestados por contratação de terceiros: neste caso, todos são responsáveis objetivamente pelos acidentes de consumos causados pelo serviço prestado.

(...)

Da mesma forma que se põe para os produtos, o defeito é o elemento que detona a responsabilidade civil objetiva do prestador de serviço, ao causar um acidente de consumo.
O defeito do serviço pode ser de prestação, de concepção ou de comercialização.
O defeito de prestação, que se contrapõe ao defeito de fabricação no caso de produtos, manifesta-se no ato da prestação do serviço. É um desvio de um padrão de qualidade fixado antecipadamente. Em tudo o mais segue as características do defeito de fabricação.
O defeito de concepção surge na própria formulação do serviço, na escolha dos seus métodos e na fixação de seu conteúdo. É semelhante aos defeitos de concepção de produtos.
O defeito de comercialização nos serviços, finalmente, decorre de “informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. A ele se aplica o já dito sobre os defeitos de comercialização de produtos.
Alguns tipos de serviço têm maior potencial para causar acidentes de consumo. É o caso dos serviços de transporte, de lazer, de saúde. Outros, como os de crédito , bancário, securitário ou financeiro, só indiretamente provocam acidentes de consumo. Assim quando o consumidor, ao ingressar em um estabelecimento bancário, escorregando em piso molhando, vem a cair, lesionando-se.

Além do mais, em se tratando da realização de exames médicos, os laboratórios possuem obrigação de resultado, e não de meio, na medida em que é legítima a expectativa do consumidor quanto à exatidão das conclusões lançadas nos respectivos laudos. 
De qualquer forma, mesmo em se tratando de responsabilidade objetiva, é necessária a comprovação do prejuízo e do nexo de causalidade, pois indispensáveis à possibilidade de pagamento de indenização.
No caso concreto, verifico que no dia 30.06.2014 a autora realizou a primeira coleta junto ao laboratório-réu, sendo que o resultado foi negativo para Toxoplasmose (não reagente), conforme laudo emitido em 04.07.2017 (fl. 22). Por sua vez, o segundo e terceiro exames realizados, cujas coletas ocorreram em 22.09.2014 e 21.10.2014, deram resultado positivo para a Toxoplasmose (laudos emitidos em 25.09.2014 e 24.10.2014 – fls. 23/24).
Já, o quarto exame, coletado em 22.12.2014, confirmou a inexistência da doença, consoante laudo emitido em 30.12.2014 (fls. 26/27). No mesmo sentido, o exame realizado por um outro laboratório em 29.12.2014 (fls. 28/29).
Portanto, diante de tais elementos, tenho que restou suficientemente demonstrada a ocorrência do erro de diagnóstico, devendo o laboratório ora requerido reparar os danos suportados pela autora em decorrência da falha na prestação do serviço.
Aliás, não prospera o argumento de que se tratou de “falso positivo”, na medida em que tal circunstância se insere dentre os riscos assumidos pela instituição no exercício de sua atividade empresarial.
Com relação aos danos morais, entendo que, embora o erro de diagnóstico possa caracterizá-los, a questão deve ser examinada caso a caso, observando-se, dentro outras questões, o tipo de exame realizado.
No caso, é cabível a indenização pretendida, uma vez que a hipótese dos autos reflete o dano moral in re ipsa ou dano moral puro, tendo em vista que o sofrimento, a angústia e o transtorno causados pelo requerido são presumidos, o que confere o direito à reparação sem a necessidade de produção de outras provas. Ora, a autora se encontrava grávida e teve a notícia de que era portadora de Toxoplasmose, doença extremamente grave e que apresenta elevados riscos ao feto, situação que perdurou por mais de dois meses (24.10.2014 a 29.12.2014)
Inclusive, de acordo com a informação extraída da Biblioteca Virtual em Saúde, do Ministério da Saúde, a Toxoplasmose é uma zoonose causada pelo Toxoplasma gondii e adquire especial relevância quando atinge a gestante, visto o elevado risco de acometimento fetal, tais como restrição de crescimento intrauterino, morte, prematuridade e/ou manifestações clínicas e sequelas como microftalmia, lesões oculares, microcefalia, hidrocefalia, calcificações cerebrais, pneumonite, hepatoesplenomegalia, erupção cutânea e retardo mental (http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/gestacao_alto_risco.pdf).
Portanto, é inquestionável o abalo psicológico suportado pela demandante por conta da falha na prestação do serviço prestado pelo réu, sendo imperativo o dever de indenizar.
Sobre a matéria, Yussef Said Cahali esclarece que (in Dano Moral, 4ª ed., Editora RT, São Paulo, 2011, p. 635): 

(...)
Portanto, em determinados casos, os danos morais são ínsitos à própria ofensa (in re ipsa), presumidos, a dispensar a respectiva demonstração probatória concreta para a sua caracterização.

Na mesma linha, Carlos Roberto Gonçalves explica que (in Responsabilidade Civil, 8ª ed., Editora Saraiva, São Paulo, 2003, p. 552):

(...)
O dano moral, salvo casos especiais, como o de inadimplemento contratual, por exemplo, em que se faz mister a prova da perturbação da esfera anímica do lesado, dispensa prova em concreto, pois se passa no interior da personalidade e existe in re ipsa. Trata-se de presunção absoluta. Desse modo, não precisa a mãe comprovar que sentiu a morte do filho; ou o agravado em sua honra demonstrar em juízo que sentiu a lesão; ou o autor provar que ficou vexado com a não-inserção de seu nome no uso público da obra, e assim por diante.

Sobre o tema, posiciona-se a jurisprudência do egrégio STJ:

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. EXAME DE DNA. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. FALSO POSITIVO.
VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/73. AUSÊNCIA. LABORATÓRIO. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. MÉDICO SUBSCRITOR DO LAUDO DO EXAME. RELAÇÃO DE CONSUMO NÃO CARACTERIZADA. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DATA DA CITAÇÃO.
1. Ação ajuizada em 16/02/2005. Recurso especial interposto em 09/01/2012 e atribuído a esta Relatora em 25/08/2016.
2. O propósito recursal, para além da negativa de prestação jurisdicional, consiste em definir se há responsabilidade civil do laboratório e do médico subscritor do laudo de exame de DNA que apontou falsa paternidade.
3. Inexistentes os vícios de omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido, não se caracteriza a violação do art. 535 do CPC/73.
4. Caracteriza-se como de consumo e, portanto, sujeito às disposições do Código de Defesa do Consumidor, o serviço prestado por laboratórios na realização de exames médicos em geral, a exemplo do teste genético para fins de investigação de paternidade.
5. À luz do art. 14, caput e § 1º, do CDC, o fornecedor responde de forma objetiva, ou seja, independentemente de culpa, pelos danos causados por defeito na prestação do serviço, que se considera defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar.
6. Em se tratando da realização de exames médicos laboratoriais, tem-se por legítima a expectativa do consumidor quanto à exatidão das conclusões lançadas nos laudos respectivos, de modo que eventual erro de diagnóstico de patologia ou equívoco no atestado de determinada condição biológica implica defeito na prestação do serviço, a atrair a responsabilidade objetiva do laboratório. 7.
Consoante preconiza a jurisprudência desta Corte, os laboratórios possuem, na realização de exames médicos, efetiva obrigação de resultado, e não de meio, restando caracterizada sua responsabilidade civil na hipótese de falso diagnóstico.
Precedentes.
8. Na espécie, é incontroverso que o exame de DNA realizado pelo laboratório recorrente apresentou resultado equivocado, atribuindo ao recorrido paternidade inexistente. Outrossim, não logrou o recorrente comprovar quaisquer das excludentes de responsabilidade previstas no § 3º do art. 14 do CDC, a saber, a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
9. Não socorre ao laboratório o argumento de que o falso positivo decorreu do "isolamento genético" da comunidade onde viviam o recorrido, a criança e sua mãe. Essa circunstância se insere dentre os riscos assumidos pela instituição no exercício de sua atividade empresarial, na medida em que o teste de DNA para investigação de paternidade envolve o uso de dados estatísticos referentes ao perfil genético da população.
10. Perante o consumidor responde apenas o laboratório, pois o médico subscritor do laudo do exame de DNA não se enquadra no conceito de fornecedor, haja vista que não ofereceu no mercado qualquer serviço, atuando como mera mão-de-obra daquele. Assim, é despiciendo perquirir acerca da existência de culpa do médico na realização do exame, discussão que somente interessa ao laboratório e seu preposto, em eventual ação regressiva.
11. Os juros de mora incidem a partir da data da citação na hipótese de condenação por danos morais fundada em responsabilidade contratual. Precedentes.
12. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.
(REsp 1386129/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/10/2017, DJe 13/10/2017).

Na mesma linha, os seguintes precedentes deste Tribunal:

RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EQUÍVOCO EM RESULTADO APRESENTADO EM EXAME CLÍNICO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. QUANTUM REDUZIDO. JUROS DA DO EVENTO DANOSO. Da norma processual aplicável ao feito 1. No caso em exame a decisão recorrida foi publicada após a data de 17/03/2016, logo, não se aplica a anterior legislação processual civil, de acordo com enunciado do STJ quanto à incidência do atual Código de Processo Civil de 2015 para as questões processuais definidas após aquele termo. Assim, em se tratando de norma processual, há a imediata incidência no caso dos autos da legislação vigente, na forma do art. 1.046 do diploma processual precitado. Mérito do recurso em exame 2. A parte autora assevera que, em 25/10/2011, levou o filho, nascido prematuro há apenas dois meses, por orientação médica, para realização de exames laboratoriais, diante da aparência amarelada deste. De posse do resultado do exame a mãe apresentou-o à pediatra do menino que se mostrou extremamente preocupada e sugeriu que os pais do menor procurassem um especialista em Gastroenterologia Pediátrica, tendo em vista que o resultado do exame poderia indicar problemas no fígado, no baço, nos rins ou na vesícula biliar da criança. 3. É incontroverso nos autos, nos termos do artigo 374, II do Código de Processo Civil, que houve erro na digitação dos resultados do exame por parte da ré. 4. O laboratório demandado deve ressarcir os danos morais ocasionados, na forma do art. 186 do novo Código Civil, cuja incidência decorre da prática de conduta negligente na atuação profissional, caracterizando o agir culposo, ocasionando a lesão imaterial que consiste na dor e sofrimentos causa à parte postulante, em função de diagnóstico equivocado dado a esta referente ao exame de seu filho com apenas dois (02) meses de idade, erro confessado pela ré em contestação. 5. Frise-se que não há como afastar, portanto, o abalo psicológico de uma pessoa que recebe diagnóstico de existência de doença grave que pode levar ao óbito de seu filho, quando este está, dentro do quadro geral de uma criança prematura, perfeitamente saudável. Trata-se aqui de dano moral puro que prescinde de qualquer prova a respeito, pois a dor e o sofrimento nesses casos são presumidos, o que é passível de indenização. 6. No que tange à prova do dano moral, por se tratar de lesão imaterial, desnecessária a demonstração do prejuízo, na medida em que possui natureza compensatória, minimizando de forma indireta as consequências da conduta da ré, decorrendo aquele do próprio fato. Conduta ilícita da demandada que faz presumir os prejuízos alegados pela parte autora, é o denominado dano moral puro. 7. O valor a ser arbitrado a título de indenização por dano imaterial deve levar em conta o princípio da proporcionalidade, bem como as condições da ofendida, a capacidade econômica do ofensor, além da reprovabilidade da conduta ilícita praticada. Por fim, há que se ter presente que o ressarcimento do dano não se transforme em ganho desmesurado, importando em enriquecimento ilícito. Quantum indenizatório reduzido para R$ 20.000,00. 8. Juros moratórios devidos desde a data do evento danoso, de acordo com a Súmula n. 54 do Superior Tribunal de Justiça, a base de 1% ao mês, na forma do artigo 406, do Código Civil, em consonância com o disposto no artigo 161, § 1º, do Código Tributário Nacional. 9. Correção monetária que incide a partir do arbitramento da indenização. Súmula nº. 362 do STJ. Dado parcial provimento ao recurso. (Apelação Cível Nº 70072370836, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 26/04/2017);

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. EXAME LABORATORIAL. ERRO DE DIAGNÓSTICO. RELAÇÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO VERIFICADA. DANO MORAL IN RE IPSA. O serviço prestado pelo laboratório de análises clínicas insere-se na relação de consumo, tem regência pelo CDC e a responsabilidade é objetiva. Compete, assim, à parte autora apenas a demonstração do fato, do dano e do nexo causal. O laboratório se exime apenas se comprovar que não houve defeito na prestação do serviço ou que a culpa é exclusivamente da vítima (art. 14 e seu § 3º). Na hipótese dos autos, restou demonstrado o defeito na prestação do serviço, considerando que o demandado não comprovou ter seguido adequadamente o protocolo determinado pelo Ministério da Saúde para o correto diagnóstico laboratorial da infecção pelo HIV, bem como por ter falhado no seu dever de informação, uma vez que emitiu laudo evidenciando que a autora seria reagente para esse vírus sem qualquer ressalva no sentido de que o exame não seria definitivo e de que deveria ser realizada nova coleta, em trinta dias, para fins de confirmação do resultado. Dano moral in re ipsa, ou seja, decorre do próprio fato, uma vez que é presumível que a autora tenha entrado em desespero e tenha sofrido muito ao pensar que pudesse estar infectada com uma doença incurável. Comporta redução o valor da condenação para R$ 10.000,00, diante das peculiaridades do caso concreto e dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, bem como da natureza jurídica da indenização. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70070775598, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 14/12/2016).

No pertinente ao quantum indenizatório, é sabido que este deve possuir dupla função, qual seja, reparatória e pedagógica, devendo objetivar a satisfação do prejuízo efetivamente sofrido pela vítima, bem como servir de exemplo para inibição de futuras condutas nocivas. Imbuído dessa ideia, a reparação deve ser fixada com parcimônia pelo Julgador, estando este sempre atento aos critérios de razoabilidade que o caso concreto exige.
Com efeito, o patrimônio moral das pessoas físicas e jurídicas não pode ser transformado em fonte de lucro ou polo de obtenção de riqueza. Não se admite a indenização como instrumento de enriquecimento ilimitado do ofendido, transformando-se o direito ao ressarcimento em loteria premiada, ou sorte grande, de forma a tornar um bom negócio o sofrimento produzido por ofensas.
É certo que a indenização por dano moral tem caráter pedagógico. Todavia, devem ser observados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação dos valores, atendidas as condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado.
Impende, pois, ao Julgador dosar a indenização de maneira que, suportada pelo patrimônio do devedor, consiga no propósito educativo da pena, inibi-lo de novos atos lesivos, por sentir a gravidade e o peso da condenação, ao passo que a vítima, pelo grau de participação no círculo social e pela extensão do dano suportado, sinta-se razoável e proporcionalmente ressarcida.
Desta forma, tendo em vista a condição social da autora, o potencial econômico do réu, a gravidade do fato, o caráter punitivo-pedagógico da reparação e os parâmetros adotados por esta Câmara em casos semelhantes, tenho que a indenização deva ser arbitrada em R$ 15.000,00, acrescidos de correção monetária pelo IGP-M, a contar do presente arbitramento, na forma da Súmula 362, do STJ, e dos juros moratórios de 1% ao mês, a partir da citação, por se tratar de relação contratual (laboratório – paciente).
Por fim, no que tange aos danos materiais, não restou comprovado o prejuízo no valor de R$ 2.000,00 informado na inicial, mas tão somente de R$ 121,68 para a aquisição do medicamento utilizado em virtude do resultado positivo para Toxoplasmose (fls. 18 e 30/31). Tal montante deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M, desde o desembolso (24.11.2014), e a crescido dos juros moratórios de 1% ao mês, a contar da citação, por se tratar de relação contratual, como visto anteriormente.
Outrossim, o valor comprovado pela nota fiscal de fl. 19 não guarda qualquer relação com o erro de diagnóstico, tratando-se de exame ecodopplercardiograma fetal. Ao menos não restou comprovado o nexo de causalidade com o erro de diagnóstico, ônus que incumbia à autora, na forma do art. 373, I, do CPC.
Consequentemente, merece prosperar o apelo.
Ante o exposto, dou provimento à apelação para julgar procedente em parte a ação e: a) condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 15.000,00, corrigidos monetariamente pelo IGP-M, a contar do presente arbitramento, e acrescidos dos juros moratórios de 1% ao mês, desde a citação; b) condenar o réu ao pagamento de indenização por danos materiais, no montante de R$ 121,68, corrigidos monetariamente pelo IGP-M, a contar do desembolso, e acrescidos dos juros moratórios de 1% ao mês, desde a citação.
Face ao decaimento maior do réu, este arcará com 80% das custas e com os honorários do procurador da autora, fixados em 20% do valor da condenação atualizada, enquanto a autora pagará 20% das custas e os honorários do procurador da autora, arbitrados 20% sobre o valor que couber ao seu patrono, vedada a compensação, observados os arts. 85, § 2° e 14, e 86, caput, do CPC. Fica suspenso o pagamento pela autora por ser beneficiária da gratuidade da justiça.
É o voto.


Des.ª Lusmary Fatima Turelly da Silva - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Jorge Luiz Lopes do Canto
De acordo com o ilustre Relator, tendo em vista que as peculiaridades do caso em análise autorizam a conclusão exarada no voto.



DES. JORGE ANDRÉ PEREIRA GAILHARD - Presidente - Apelação Cível nº 70077570562, Comarca de Gravataí: "À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO À APELAÇÃO."


Julgador(a) de 1º Grau: JOSELINE MIRELE PINSON DE VARGAS



Fonte: Diário da Justiça do dia 06/06/2018. Acesso: 03/08/2018.

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