“ DA OBRA "ÊLES, OS JUÍZES, VISTOS POR NÓS, OS ADVOGADOS"

De Piero Calamandrei
Tradução de Arí dos Santos
Publicação da Livraria Clássica Editora, de Lisboa.
 
"Quem foi o autor desta cômoda e desprezível sentença: Habent sua sidera lites, pela qual se quere dizer, em substância, que a justiça é uma cousa que não deve ser levada a sério? Aquele que a inventou foi certamente um pleiteante sem escrúpulos e sem paixão, que dessa forma quis justificar tôdas as negligências, adormecer todos os remorsos, suprimir tôdas as fadigas. Mas tu, jovem advogado, não te agarres a essa fórmula de vã resignação, enervante como um narcótico; rasga a página onde a encontraste escrita e, quando tiveres aceite uma causa que te pareceu boa, atira-te ao trabalho com fervor, com a certeza de que aquele que tem fé na Justiça consegue sempre, mesmo em oposição com os astrólogos, fazer mudar o curso das estrelas".
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"Aquele que entra num tribunal trazendo na sua pasta _ em vez de boas e honradas razões _ manigâncias secretas, solicitações ocultas, suspeita sôbre a corruptibilidade dos Juízes e esperanças na sua parcialidade, não se admire ao aperceber-se que, em vez do templo severo da Justiça, se acha numa alucinante barraca de feira. Em tôdas as paredes, um espelho devolver-lhe-á, multiplicadas e deformadas, as suas intrigas. Para achar a pureza do Tribunal, é preciso que lá se entre com a alma pura. Também aquí se pode citar o Padre Cristóforo: Omnia munda mundis".
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"Se tens por adversário um dêsses advogados temidos pelas suas escuras habilidades, livra-te da tentação de concorrer com êle nas manhas engenhosas. Em vez de esconder a tua inferioridade pessoal nesse gênero de expedientes, é melhor proclamá-la francamente e limitar-te fazer compreender ao Juiz que, contra as astúcias do adversário, não tens outra arma senão a confiança na Justiça.
Ganhei quasi sempre as causas em que tinha adversários mais "habilidosos" do que eu; e, quando não as ganhei, orgulha-me não me ter encontrado no lugar de vencedor".
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"Foi a meu pai, que era advogado, que nos últimos dias da sua vida ouví estas palavras consoladoras: `As sentenças dos Juízes são sempre justas. Durante cinquenta anos de exercício profissional, nunca tive que me queixar da justiça. Quando ganhava uma causa era porque o meu cliente tinha razão. Quando a perdia era que a razão estava do lado do meu adversário'. Ingenuidade? Talvez, mas é apenas por fôrça dessa santa ingenuidade que a profissão de advogado, deixando o caminho subutil que conduz ao ódio, pode elevar-se até o nível daquela fé que permite a paz humana".
 

Fonte: >http://www.oabgo.org.br/Revistas/39/oabhistoria.htm<. Acesso: 17/08/2012

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