domingo, 9 de novembro de 2014

Direito do Trabalho. Subordinação.Trabalhadores autônomos.

“A quem o Direito do Trabalho deve proteger e o novo conceito de subordinação

Autora: Yone Frediani

Com o surgimento das novas técnicas de produção a partir da introdução da robótica e da informática, as relações entre trabalhadores e empregadores sofreram modificações profundas que, refletiram, também, no mercado de trabalho através do aparecimento de novas profissões.

Por outro lado, a globalização da economia, responsável pela ampliação e internacionalização dos mercados produtores e consumidores, impôs às empresas rígidas regras acerca da competitividade, produtividade, eficiência e qualidade de seus produtos.

Considerados tais aspectos, constata-se que as atividades executadas pelos trabalhadores autônomos representam, na atualidade, a opção adotada por inúmeros prestadores de serviços que se dedicam ao comércio, à consultoria, assessoria contábil, informática, vendas, e outras modalidades.

Examinando essa mesma questão, ensina o professor Amauri Mascaro Nascimento que “o autônomo hoje não é mais apenas o autônomo clássico, o profissional liberal, o médico, o advogado, o engenheiro, o arquiteto, o dentista, a podóloga e tantos que exerçam uma atividade econômica por conta própria porque os sistemas de produção de bens, de serviços, de produção de informações, o avanço da tecnologia criou novas realidades com reflexos amplos inclusive sobre as forma pelas quais o trabalho é prestado”.

Portanto, o desafio que se lança na atualidade é de que, de acordo com as alterações havidas no mercado de trabalho e as novas formas de prestação de serviços, a multiplicação de trabalhadores juridicamente autônomos e economicamente independentes parecer ser irreversível, aos quais, certamente, não poderão ser aplicadas as regras de proteção contidas na CLT, já que destinadas àqueles que mantém contrato de trabalho.

Importante realçar, ainda, que os inúmeros contratos de prestação de serviços autônomos existentes e os que são celebrados diariamente nas mais diversas áreas, não podem ser considerados, genericamente, como fraude à lei; ao contrário, representam a opção das partes que necessitam mutuamente da prestação de serviços, usualmente, a diversos tomadores, sem vinculação a qualquer um deles.

Necessário enfatizar, também, que a valorização do trabalho independente ou autônomo não importa no afastamento dos princípios protetores que inspiram o direito do trabalho, mas, na sua aplicação, tão somente, àqueles que, verdadeiramente, trabalharam sob o regime de subordinação.

Não foi sem qualquer motivo que a EC 45/04, ampliando a competência da Justiça do Trabalho, reconheceu a existência de modalidades atípicas da prestação de serviços identificadas como “relação de trabalho”, às quais o Magistrado, para resolver o conflito, aplicará a lei civil e não a legislação consolidada, vez que não se trata de trabalho subordinado.

Diante de tais considerações é que se afirma que o conceito de subordinação necessita ser revisto, reconstruído, remodelado a uma nova realidade para que com ela se harmonize, posto constituir fato público e notório o expressivo número de pessoas que trabalham em seu próprio domicílio, fazendo sua própria jornada de trabalho em sintonia com seus interesses pessoais e sem qualquer vinculação ao tomador de serviços.

Ressalte-se, ainda, que a aplicação da lei consolidada às situações atípicas apresentadas no cotidiano, colide com a diversidade de atividades autônomas existentes no mercado de trabalho, de que se utilizam as grandes, médias e pequenas empresas, sem qualquer prejuízo ao prestador de serviços autônomos, na medida que se reconhece que a subordinação nunca existiu, porque não era do interesse das partes.

Por tais razões é que se propõe uma adequação do conceito tradicional de subordinação às peculiaridades apresentadas no mercado de trabalho atual, como forma de conferir maior dinâmica às relações de trabalho, estimulando e desenvolvendo todas as formas de prestação de serviços legitimas, idôneas e legalmente previstas pelo ordenamento pátrio.

Lembra-se que a subordinação tradicional corresponde à relação de emprego, através da qual, o trabalhador encontra-se completa e absolutamente sujeito às diretrizes decorrentes do poder diretivo de seu empregador.

Contrariamente, o autônomo é caracterizado como o prestador de serviços que atua, ainda que com pessoalidade e habitualidade, porém, sem qualquer subordinação ou sujeição a quem o contratou, pessoa física ou jurídica.

Nesse contexto, é importante não se perder de vista o fato de que qualquer empresa, independentemente de seu porte ou área de atuação depende, no seu cotidiano, de um conjunto de pessoas para atingir seus objetivos, sendo oportuno lembrar a garantia constitucional da livre iniciativa inserida no artigo 170 da CF/88, assegurando, exatamente, a possibilidade que o empresário organize sua estrutura da maneira que lhe convier, desde que respeitadas as demais normas legais aplicáveis a cada caso concreto.

Dessa forma, dentre os participantes desse “pequeno exército” que integra a atividade empresarial, encontram-se empregados, prestadores de serviços autônomos e eventuais, prestadores de serviços que atuam em empresas especializadas tais como transportadoras, serviços de vigilância e limpeza, empresas de assessoria logística, contábil, empresas de call center e de tecnologia da informação, agências de publicidade, etc.

Por conseguinte, constitui fato público e notório que, é da multiplicidade de conhecimentos e das atividades prestadas pelos mais diversos profissionais que o empresário alcança seus objetivos sociais, não se valendo, para tanto, somente de seus empregados.

Referidas considerações tornam-se necessárias diante da constatação de uma certa tendência atual na aplicação da teoria da subordinação estrutural para o reconhecimento da relação de emprego em relações autônomas. Nesta hipótese, a singela adoção de referida teoria carece de suporte legal, na medida em que tal como concebida pela doutrina, somente teria aplicação se o trabalhador estivesse plenamente inserido na dinâmica da empresa, ou seja, acolhido pela estrutura da empresa, na sua dinâmica de organização e funcionamento.

Com efeito, se do contexto probatório resultar demonstrado que o prestador de serviços agia na qualidade de “senhor de seu tempo e de suas atividades”, dirigindo seu próprio negócio, incabível restaria o reconhecimento da relação de emprego pelo simples fato deste executar atividades inerentes à finalidade do empreendimento, visto que na situação apontada, não se fizeram presentes nenhum dos elementos caracterizadores da relação de emprego (subordinação clássica), nem, tampouco, os requisitos que poderiam inseri-lo na estrutura e dinâmica da empresa (subordinação estrutural), posto que a relação havida foi marcada pela total autonomia na prestação de serviços, sem que tal fato possa sugerir fraude à lei ou precarização do trabalho.

Feitas tais considerações, considera-se de primordial importância o justo, adequado e correto direcionamento de como e a quem aplicar as regras celetistas, prestigiando-se e fortificando-se as novas e diversas modalidades contratuais contemporâneas ao Terceiro Milênio.

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* Yone Frediani é desembargada aposentada do TRT da 2ª região. Doutora em Direito do Trabalho PUC/SP. Mestre em Direito das Relações do Estado PUC/SP; Mestre em Diretos Fundamentais/UNIFIEO; Professora de Direito Individual e Coletivo do Trabalho e de Direito Processual do Trabalho nos cursos de Pós-Graduação e Graduação da FAAP”.

Acesso: 9/11/2014

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