“JUSTIÇA MILITAR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

No Rio Grande do Sul, a Justiça Militar existiu antes mesmo da Justiça Comum, tendo chegado a bordo das naus portuguesas que integravam a expedição militar de Silva Paes, em 1737. Em 1763, o Marquês do Pombal condensou a dispersa legislação penal militar portuguesa. Em 1808, com a vinda da família real para o Brasil, Dom João VI criou o Conselho de Justiça Supremo Militar, embrião do atual Superior Tribunal Militar, que foi o primeiro órgão permanente de Justiça Castrense a operar no País. Com a criação do Corpo Policial da Província – embrião da Brigada Militar, surgiu logo a necessidade de se garantir a disciplina da Força Pública, que não apenas fazia o policiamento urbano, como, também, tinha a atribuição de proteger o território, recebendo instrução militar. Foi, então, instituída a Justiça do próprio Corpo Policial. A Lei Estadual nº 148, de 24 de julho de 1848, dizia que o Presidente da Província deduziria da parte penal do Exército aqueles princípios que fossem aplicáveis à manutenção da disciplina. O Regulamento baixado em 23 de dezembro de 1857 foi mais explícito, criando o Conselho de Disciplina. Como órgão revisor, o mesmo Regulamento instituiu a Junta Superior, nomeada pelo Presidente da Província e formada por um juiz criminal e dois oficiais, sendo presidida pelo próprio Presidente da Província. Aplicava-se o Código Penal da Armada, comum ao Exército. Em 1876, a Junta Superior foi extinta, e o Presidente da Província tornou-se a instância revisora das decisões de primeiro grau. Pelo Ato nº 357, do Presidente do Estado, de 15 de outubro de 1892, a Guarda Cívica, denominação que o antigo Corpo Policial recebera logo depois da Proclamação da República, foi transformada em Brigada Militar. Em 1893, o Governo baixou o Regulamento Disciplinar e Processual, inspirado, ainda, no Código da Armada, que instituiu o Conselho de Julgadores na primeira instância, reservando o grau recursal para o Presidente do Estado. O Ato nº 12 A, de 24 de janeiro de 1893, fixou o Tribunal de Justiça como instância recursal das decisões do Conselho. Um convênio firmado entre a União e os Estados, em 24 de maio de 1917, em virtude do qual as Brigadas Estaduais foram consideradas forças auxiliares do Exército, abriu caminho para a Lei Federal nº 3.351, de 3 de outubro de 1917, que autorizou o julgamento dos oficiais e das praças das polícias por elementos das suas corporações, nos crimes propriamente militares. Em conseqüência, o Decreto nº 2.347-A, de 28 de maio de 1918, estabeleceu os Conselhos de Disciplina, organizados extraordinariamente, um Conselho Militar permanente para o primeiro grau e, como instância revisora, o Conselho de Apelação, que iniciou os trabalhos quando da assinatura da primeira ata, em 19 de junho de 1918. O Decreto de 13 de março de 1924 criou o cargo de Juiz-Auditor civil, de livre nomeação do Presidente do Estado, para funcionar no primeiro grau, junto ao Conselho Militar. Na Constituição Federal de 16 de julho de 1934, a Justiça Militar Federal foi plasmada como ente do Poder Judiciário, sendo estendidas aos seus juízes as mesmas garantias da magistratura togada. A Lei Federal nº 192, de 17 de janeiro de 1936, reorganizou as polícias militares dos Estados, concentrando-as na manutenção da segurança pública, esvaziando-lhes competências militares e considerando-as reservas do Exército Nacional. A Lei determinou que cada Estado organizasse a sua Justiça Militar, o que foi executado apenas por São Paulo (1937) e Minas Gerais (1946) – o Rio Grande do Sul já possuía seu Conselho de Apelação desde 1918. O Decreto-Lei nº 47, de 19 de novembro de 1940, cuja tramitação iniciara em princípios de 1938, por iniciativa da Interventoria Federal, fixou a Lei Orgânica da Justiça Militar do Estado, convertendo o Conselho de Apelação em Corte de Apelação e, finalmente, atribuindo aos seus membros garantias de magistrados, o que reprimiu as interferências do Comando-Geral da Brigada nos julgamentos. No primeiro grau, foram instituídos dois Conselhos: o Especial, para julgar oficiais, e o Permanente, para julgar as praças. Junto aos Conselhos funcionava um Juiz-Auditor e o Ministério Público. O Decreto-Lei de 2 de junho de 1944 criou, ainda, o Conselho de Justiça nos Corpos para julgar as deserções. Em 27 de dezembro de 1957, foi criada, pela Lei nº 3.350, a segunda Auditoria, com sede na cidade de Santa Maria. O Ato Institucional nº 2, de 27 de outubro de 1965, ampliou a competência da Justiça Militar Federal para processar e julgar civis autores de crimes contra a segurança nacional, cabendo recurso das decisões de primeiro grau ao Superior Tribunal Militar e ao Supremo Tribunal Federal. O AI-5, de 13 de dezembro de 1968, suspendeu definitivamente a garantia constitucional do hábeas-córpus nos crimes políticos contra a segurança nacional, a ordem política e social e a economia popular. O AI-6, de 1º de fevereiro de 1969, suprimiu o recurso ordinário ao Supremo Tribunal de decisões proferidas pela Justiça Militar contra civis. Em 21 de outubro de 1969, o Decreto-Lei nº 1.003 instituiu os novos Código Penal Militar, Código de Processo Penal Militar e Lei de Organização Judiciária Militar, aposentando o obsoleto Código Penal Militar, de 24 de janeiro de 1944, e que não continha muitas das inovações do Direito Penal moderno. A Constituição Estadual de 14 de maio de 1967 estabeleceu a transferência da jurisdição de segundo grau da Corte de Apelação para o Tribunal de Justiça. Como, entretanto, o Governo Estadual argüísse junto ao Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade, na íntegra ou parcial, de 54 artigos, dentre os quais o que extinguia a Corte de Apelação, a medida não chegou a ser implementada. A Constituição Federal de 17 de outubro de 1969 esvaziou a discussão sobre a constitucionalidade da Carta gaúcha, determinando aos Estados que votassem novas Constituições. No tocante à Justiça Militar dos Estados, a Carta de 1969 limitou-a à primeira instância, excetuando aqueles Estados que houvessem instalado Cortes recursais antes de 15 de março de 1967, ou seja, Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais. Em 31 de dezembro de 1970, a Assembléia Legislativa aprovou a Lei nº 6.156, que manteve as duas Auditorias, os três Conselhos e a Corte de Apelação com cinco membros – dos quais um civil –, nomeados pelo Governador. Em 18 de março de 1979, foi instalada a terceira Auditoria, com sede na cidade de Passo Fundo. Em 1º de fevereiro de 1980, o Código de Organização Judiciária do Estado fixou a composição do Tribunal Militar em sete juízes, quatro militares e três civis, todos nomeados pelo Governador. A Lei nº 7.706/82 determinou que, obrigatoriamente, um dos juízes civis fosse escolhido dentre os Juízes-Auditores. Em 1982, foi instalada a quarta Auditoria, com sede em Porto Alegre. Durante a Constituinte Federal de 1988, surgiram emendas propondo a extinção das Justiças Militares Federal e Estadual. Na ocasião, provou-se que os tribunais militares nos Estados consomem parcela muito pequena do orçamento judiciário (no RS, menos de 1%) e prestam um relevante serviço, pois costumam julgar os crimes de policiais militares com mais rigor e celeridade do que normalmente faria a Justiça Comum, o que se constituiu numa garantia ao cidadão e à democracia. A Constituição Federal de 1988, manteve a Justiça Militar naqueles Estados onde o contingente militar fosse superior a 20 mil integrantes, como também ampliou-lhe a competência, restabelecendo a possibilidade de processar e julgar os policiais militares e os bombeiros militares nos crimes militares definidos em lei, além de decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças. A Emenda Constitucional nº 18, de 5 de fevereiro de 1998, explicitou a condição militar dos membros das polícias militares e dos corpos de bombeiros militares. Sérgio Antonio Berni de Brum, Juiz-Presidente do Tribunal de Justiça Militar, RS, gestão 2008/2009. I – BASE LEGAL • Constituição Federal de 1988 – Art. 125, §§ 3º e 4º. • Constituição Estadual de 1989 – arts. 104, 105 e 106 • Código de Organização Judiciária do RS (Lei nº 7.356/80 - COJE) – arts. 230 a 302. II – COMPETÊNCIA A Justiça Militar Estadual de 1º Grau existe em todos os Estados da Federação, e os Tribunais Militares existem como órgãos de 2ª instância nos Estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais, com a competência para julgar os militares estaduais que cometem crimes militares, exceto homicídios dolosos contra civis, que são julgados pela Justiça Comum, em Júri Popular. Além disso, a Emenda Constitucional nº 45 passou a designar os Juizes-Auditores de Juízes de Direito do Juízo Militar, estabelecendo a sua competência para processar e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a presidência de Juiz de Direito, processar e julgar os demais crimes militares. III – FUNCIONAMENTO Primeira Instância - (1º Grau) Conselho Especial: para julgar os oficiais da Brigada Militar, ou as praças, quando denunciadas juntamente com oficiais pela mesma falta. Cinco membros: constituído por um Juiz de Direito, bacharel em Direito nomeado após concurso público pelo Tribunal de Justiça Militar do Estado, e quatro oficiais superiores, sob a Presidência daquele. Esse Conselho é formado especificamente para cada processo. Conselho Permanente: para julgar as praças da Brigada Militar. Também composto por cinco membros: um Juiz de Direito (bacharel em Direito e concursado), Presidente do Conselho, um oficial superior e três oficiais, capitães ou tenentes. Funciona para todos os processos por três meses consecutivos. A convocação dos militares para os Conselhos integrados pelo Juiz de Direito, que elabora as sentenças após os julgamentos, se dá por sorteio, através de lista de nomes fornecida pela Brigada Militar. Auditorias: são dirigidas pelo Juiz de Direito titular e contam, ainda, com um Juiz Substituto. As Auditorias correspondem às varas ou aos juízos da Justiça Comum e seus respectivos cartórios e são divididas por território. No Rio Grande do Sul existem quatro Auditorias: duas em Porto Alegre, criadas, respectivamente, em 28 de maio de 1918 e em 15 de outubro de 1982; uma em Santa Maria, criada em 27 de dezembro de 1957, e uma em Passo Fundo, criada em 22 de novembro de 1975. Julgamento: os julgamentos em 1º grau são realizados pelos Conselhos de Justiça, com a participação do Promotor de Justiça e de um advogado indicado pelo réu ou um Defensor Público, se não quiser ou não puder constituir advogado. Recurso: realizado o julgamento pelo 1º grau, tanto a defesa quanto a acusação poderão recorrer da decisão da Auditoria para o Tribunal de Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul. Segunda Instância - (2º Grau) O Tribunal de Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul é o órgão recursal da Justiça Militar estadual, sendo constituído por sete Juízes: quatro militares, oficiais combatentes do mais alto posto da Brigada Militar (coronéis), nomeados pelo Governador; três Juízes civis, todos bacharéis em Direito, sendo um magistrado de carreira, promovido pelo Tribunal de Justiça Militar, um representante do Ministério Público e um representante da OAB, ambos nomeados pelo Governador (Art. 104, § 1º, 2º e 3º da CE/89). Nos julgamentos do Tribunal funcionam um Procurador de Justiça, designado pela Procuradoria-Geral de Justiça, e os advogados indicados pelas partes, ou, no lugar destes, o Defensor Público, quando as partes não puderem ou não quiserem contratar um advogado. Os julgamentos em 2º grau são realizados em plenário, tendo assento junto ao mesmo um Procurador de Justiça. Incumbe ao Tribunal de Justiça Militar, em síntese, o seguinte: - julgar originariamente os hábeas-córpus impetrados perante a Justiça Militar do Estado; - julgar, em instância única, os processos oriundos de Conselhos de Justificação a que foram submetidos oficiais, desde que enviados pelo Poder Executivo; - julgar os recursos interpostos das decisões e das sentenças proferidas pelo 1º grau, bem como os embargos opostos das decisões do próprio Tribunal; - julgar as representações oferecidas pelo órgão do Ministério Público, nos casos de condenação acima de dois anos, decretando ou não a indignidade ou a incompatibilidade para oficialato, com a conseqüente perda do posto e da patente, ou a perda da graduação das praças, com a conseqüente decretação da exclusão das fileiras da Brigada Militar; - julgar representações oferecidas pelo Corregedor-Geral da Justiça Militar do Estado, na hipótese de arquivamento de inquérito policial militar ou sindicância, sempre que aquele entender que há hipótese de deflagração da ação penal militar. Das decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça Militar cabe, ainda, recurso da defesa ou do Procurador de Justiça para o Superior Tribunal de Justiça e, nas questões exclusivamente de matéria constitucional, para o Supremo Tribunal Federal”.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Relações da ética com outras ciência: filosofia, moral, psicologia, sociologia, antropologia, história, economia, política, e o direito