CDC regula prescrição em caso de dano terrestre causado por acidente aéreo
O
prazo de prescrição de ações relacionadas a acidente aéreo, uma vez
demonstrada a relação de consumo entre o transportador e aqueles que
sofreram o resultado do evento danoso, é regido pelo Código de Defesa do
Consumidor (CDC). Esse foi o entendimento da Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso da Unibanco AIG Seguros S/A
contra a Associação de Assistência às Famílias Castigadas por Acidentes
Aéreos e Tragédias Antigas e Modernas.
A
associação ajuizou demanda com pedido de indenização pelos danos
materiais e morais sofridos por moradores da rua Luís Orcine de Castro,
no bairro Jabaquara, em São Paulo , que tiveram suas casas atingidas após acidente com a aeronave Fokker 100 da empresa Tam Linhas Aéreas em outubro de 1996.
Na
sentença, o juiz reconheceu a prescrição, aplicando o prazo do Código
Brasileiro de Aeronáutica (CBA), que é de dois anos em ação por danos
causados a terceiros na superfície. O Tribunal de Justiça de São Paulo,
porém, afastou a prescrição, por entender que o prazo é o de 20 anos,
previsto no Código Civil de 1916, e determinou o prosseguimento da ação.
Paralelamente,
outra sentença condenou a Tam a indenizar os proprietários dos imóveis
pelo dano material decorrente de sua eventual desvalorização e pelos
danos morais sofridos. Os moradores das casas, seja por contrato de
locação ou comodato, também foram indenizados. A Unibanco Seguros foi
condenada a restituir os valores das indenizações pagas.
Recurso especial
A
seguradora recorreu ao STJ alegando que, uma vez que existe legislação
específica, o Código Civil não poderia ser utilizado. No recurso, a
empresa alegou também que seria impossível a incidência do CDC. Segundo
ela, enquanto o CBA trata da relação entre o transportador aéreo e o
transportado, incluindo terceiros na superfície, o CDC trata da relação
entre fornecedor e consumidor - o que não seria o caso - e o Código
Civil cuida do transporte em geral.
Para
a ministra Nancy Andrighi, relatora do processo, o prazo prescricional
da pretensão que versa sobre danos causados por acidente aéreo a
terceiros na superfície “não pode ser resolvido pela simples aplicação
das regras tradicionais da anterioridade, da especialidade ou da
hierarquia, que levam à exclusão de uma norma pela outra; mas sim pela
aplicação coordenada das leis, pela interpretação integrativa, de forma a
definir o verdadeiro alcance de cada uma delas, à luz do concreto”.
A
ministra esclareceu que, apesar de estabelecido o prazo prescricional
de dois anos para a pretensão de ressarcimento dos danos, essa regra
específica não impede a incidência do CDC, desde que a relação de
consumo entre as partes envolvidas esteja evidenciada.
Relação de consumo
Segundo a ministra, a situação dos autos traduz uma relação de consumo.
“De
um lado, está a TAM Linhas Aéreas S/A, que desenvolve atividade de
prestação de serviço de transporte aéreo; fornecedora, portanto, nos
termos do artigo 3º do CDC. De outro, estão os moradores da rua em que
se deu a queda da aeronave, os quais, embora não tenham utilizado o
serviço como destinatários finais, equiparam-se a consumidores pelo
simples fato de serem vítimas do evento (consumidores por equiparação ou
bystanders), nos termos do artigo 17 do mesmo diploma”, afirmou a
relatora.
Com
esse entendimento, a Terceira Turma, por unanimidade, alterou a decisão
de segunda instância, afastando a aplicação do Código Civil e
determinando a incidência da Código de Defesa do Consumidor, cujo prazo
prescricional para situações como a analisada é de cinco anos. Como o
acidente ocorreu em outubro de 1996 e a ação foi ajuizada em setembro de
2001, a pretensão não está prescrita.
Processo relacionado: REsp 1202013
Fonte: Superior Tribunal de Justiça
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