“Estamos
em um trabalho de construção das correlações entre a Constituição e o
Direito Privado e acredito que ainda possamos corrigir vários rumos que
estão sendo desviados”, concluiu o desembargador federal Guilherme
Calmon Nogueira da Gama, conselheiro do Conselho Nacional de Justiça
(CNJ), em sua palestra “Constituição e Direito Privado: uma relação em
construção” no seminário 25 Anos da Constituição Cidadã, no auditório do
Superior Tribunal de Justiça (STJ). O evento foi uma promoção do Centro
de Estudos Judiciários (CEJ) do Conselho da Justiça Federal (CJF). O
ministro do STJ, Ricardo Villas-Boas Cueva presidiu a mesa.
No
entendimento do desembargador federal, é preciso estabelecer com
cuidado onde e quando poderá haver a incidência das normas de direito
fundamental no Direito Privado. “Precisamos ter muito cuidado na busca
da concretização dessas normas, de modo a não permitir que haja uma
autêntica loteria em relação às escolhas que podem ser feitas em relação
às situações concretas”, afirma.
Ele
assinala que a questão das técnicas de reprodução humana assistida, por
exemplo, ainda não mereceu tratamento legislativo adequado e as regras
de Direito Civil existentes sobre o tema são insuficientes. “Por outro
lado, há uma atuação intensa do Conselho Federal de Medicina
normatizando como os médicos deve se portar nessa seara”, aponta. Com
relação à técnica de reprodução assistida, Guilherme Calmon menciona a
hipótese de uma viúva que teve seu marido falecido com o seu esperma
congelado e, após a morte dele, pretende iniciar uma gravidez. “Até que ponto esta é uma técnica admissível?”, questiona.
Outro
exemplo citado por ele é a da chamada “doação cruzada de gametas”: uma
mulher que tem dificuldade para engravidar mas tem óvulos férteis se
dispõe a doar óvulos para outra mulher, que não pode engravidar por não
ter óvulos férteis. Em troca, esta última se dispõe a custear o
tratamento da primeira. De acordo com Guilherme Calmon, essas são
hipóteses previstas pelo CFM como legítimas. “Será que o nosso
ordenamento jurídico admite essas regras?”, indaga novamente. Para ele,
há uma omissão do legislador em relação a essas questões. “É proibida
por lei a comercialização de partes do corpo humano e, no segundo caso,
está havendo, sim, vantagem patrimonial”, observa o desembargador
federal.
Outra
questão delicada nas relações entre particulares, tangenciadas pelas
normas de direitos fundamentais, foi o julgamento, por parte do Supremo
Tribunal Federal (STF), de uma ação direta de inconstitucionalidade a
respeito de união entre pessoas do mesmo sexo. “Na falta de positivação
do nosso ordenamento jurídico a respeito dessas uniões, o STF acabou por
estabelecer que não se pode excluir a união entre pessoas do mesmo
sexo, um autêntico ativismo jurídico, na minha opinião”, afirma
Guilherme Calmon.
Saber
qual é o grau de influência das normas de direitos fundamentais nas
relações entre particulares, e como devem atuar essas normas, para o
desembargador federal, é uma das grandes questões do Direito Privado.
“Surgiu a teoria da eficácia imediata ou direta dessas normas no que
tange aos particulares. Criticando
essa teoria, veio a teoria da eficácia indireta das normas de direitos
fundamentais para particulares. Precisariam sofrer a intermediação do
legislador, que tem de dar concretude a essas normas, senão haveria
esvaziamento da autonomia privada”, explica ele.
Fonte: Conselho da Justiça Federal
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