terça-feira, 5 de agosto de 2014

Uso do e-mail corporativo para fins particulares
09/mar/2010 
Reflexão sobre o uso adequado do e-mail corporativo no ambiente de trabalho.

Por Ivone Ballao Lemisz

Definição e características do e-mail corporativo

O e-mail é uma forma de transmissão de mensagens, que independe da localização geográfica dos usuários, por meio de uma rede de comunicações e que pode ser acessado por computadores, telefones celulares. É uma ferramenta que se caracteriza pela agilidade, baixo custo, economia de papel. As mensagens são enviadas para um endereço virtual e ficam depositadas em um servidor que quando se trata de e-mail corporativo é de propriedade da empresa.

Sendo a propriedade da empresa a verificação dos conteúdos que tramitam no servidor é uma forma de controle do empregador.

O poder de subordinação do empregado em relação ao empregador é visto como um desequilíbrio do poder nesta relação.

Não se pode conceber uma organização sem autoridade, sem que tenha uma pessoa no comando, ditando as normas a serem seguidas. Essa autoridade exercida pela empresa por sua vez pressupõe o poder de subordinação.

Se todas as pessoas não se sujeitassem a uma dada subordinação, no sentido de que uma atividade deve se sujeitar a outra, numa relação de coordenação, haveria o caos absoluto no ambiente de trabalho, o que se aplica a toda sociedade.

O poder de controle tem como escopo a maneira com que os trabalhadores devem cumprir certos horários, executar determinadas tarefas, seguindo um comando da liderança da empresa, de sua chefia imediata.

Para a execução das atividades, normalmente, existem equipamentos, máquinas, técnicas adequadas a cada situação e que devem ser utilizados de acordo com o que prevêem as normas para sua utilização, desde o uso de equipamentos de segurança até o manuseio de máquinas e computadores.

Especificamente quanto ao uso da Internet, hoje é praticamente impensável que uma empresa não tenha sido automatizada e não se utilize do e-mail para o trâmite das correspondências da empresa, sejam internas ou externas.

Como exemplo de correspondências internas podemos citar: notícias sobre atualizações de produtos, alterações de preços dos produtos, orientação sobre procedimentos no atendimento aos clientes, etc.

Quanto às correspondências externas, o contato com compradores, fornecedores, parceiros comerciais, clientes em geral.

Desde a difusão do uso da rede mundial de computadores – Internet – no Brasil a partir da década de 90 as empresas começaram a se utilizar de e-mail como forma de agilizar o atendimento e também como forma de otimização de resultados, ganhando em agilidade.

Foi a partir do século XXI que essa difusão se tornou mais ampla, atingindo não só as empresas, mas toda a população economicamente ativa. Atualmente é muito comum os clientes enviarem suas reclamações ou sugestões através de canais abertos pelas empresas através da Internet.

Com a globalização e o uso da Internet, as empresas se vêem obrigadas a se utilizar de formas de comunicação cada vez mais eficientes, como é o caso da adoção de e-mail para a troca de correspondências.

Essa necessidade de agilidade, para atender as demandas crescentes dos clientes, muitas vezes gera, também, a falta de controle e seleção das correspondências que circulam nesse meio.

É comum as empresas criarem sites na Internet e liberarem e-mail corporativo “@nomedaempresa” para seus empregados, que além da agilidade no trâmite das correspondências, também ajudam a divulgar o nome das empresas, uma forma de publicidade, de mostrar que sua empresa está conectada ao mundo virtual.

Ocorre, como já citado, que a falta de controle por falta do empregador, dos conteúdos de e-mail e dos sites acessados, gera o uso indevido para fins particulares dessa ferramenta por parte de seus empregados.

Para coibir essa prática muitas empresas estabelecem formas de como essa ferramenta deverá ser utilizada, estabelecendo a proibição de divulgação de material pornográfico, proibição de acesso a conteúdos não afetos as atividades laborativas.

Pelo excesso de trabalho, nem sempre há como fiscalizar esse trâmite de informações ou de consultas a determinados sites, desta forma, é comum o bloqueio, por parte do empregador, ao acesso a determinados sites e conteúdos, inibindo essa prática que acarreta prejuízos aos empregadores.

O empregador tem o controle do conteúdo consultado por seus empregados e também acesso aos conteúdos das correspondências trocadas através do e-mail corporativo como forma de fiscalização do trabalho.

A partir disto, surge a seguinte discussão: “é lícito ao empregador verificar o conteúdo das correspondências trocadas por seus empregados através do e-mail?”

É justa a demissão por justa causa no caso de descumprimento das normas que regulamentaram o uso dessa ferramenta de trabalho?

Dessas indagações podemos chegar a algumas conclusões: se considerarmos o e-mail como uma ferramenta de trabalho que está sendo utilizada de maneira indevida pelo empregado, podemos dizer que é lícito ao empregador ter acesso ao conteúdo do e-mail corporativo cedido aos seus empregados.

O E-mail como Ferramenta de Trabalho

Mas como definir o e-mail como ferramenta de trabalho? O art. 186 da CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas, estabelece:

O Ministério do Trabalho estabelecerá normas adicionais sobre proteção e medidas de segurança na operação de máquinas e equipamentos, especialmente quanto à proteção das partes móveis, distância entre estas, vias de acesso às máquinas e equipamentos de grandes dimensões, emprego de ferramentas, sua adequação e medidas de proteção exigidas quando motorizadas ou elétricas.

Percebe-se que a CLT apenas cita ferramentas de trabalho, sendo que a doutrina é que se encarrega de esclarecer o que na pratica seriam essas ferramentas.

Desta forma o e-mail fornecido pela empresa aos seus empregados é uma ferramenta de trabalho que pertence ao empregador, sendo a empresa responsabilizada pelas conseqüências do seu uso. Esse é o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho em alguns casos já julgados. Entende este órgão que não há invasão de privacidade ou violação de correspondência, quando a empresa, exercendo o poder de controle e coordenação faz o monitoramento dos conteúdos que trafegam através dos e-mails corporativos.

O e-mail com o “@nome da empresa” é o papel timbrado da empresa digital e seu uso indevido pode acarretar demissão sem justa causa.

O monitoramento dos conteúdos dos e-mails corporativos normalmente é feito por amostragem com a busca de determinadas palavras que levem o empregador a crer que não se tratam de conteúdos relativos ao trabalho, buscas específicas de palavras, para rastrear conteúdos indevidos.

As empresas costumam coibir, também, o uso do e-mail para divulgação de correntes entre seus empregados o que gera lentidão nos serviços de processamento de dados, podendo acarretar prejuízos financeiros, inclusive.

Um dos primeiros casos julgados no TST – Tribunal Superior do Trabalho - foi o caso de um empregado que se utilizava do e-mail corporativo para divulgar imagens de mulheres nuas.

O TST entendeu que o e-mail não é de propriedade do empregado e sim uma ferramenta que a empresa disponibiliza a seus empregados para a facilitação e agilização do desenvolvimento de suas atividades.1

O artigo 5º da Constituição Federal Brasileira de 1988 trata da inviolabilidade das correspondências, não estando relacionado ao uso indiscriminado de uma ferramenta cedida pela empresa.

Diferentemente dos casos de violação de e-mail particulares com a finalidade de expor o empregado a situações vexatórias. O artigo 5º da Constituição Federal assegura a todos os cidadãos o sigilo das correspondências além do direito à privacidade e à intimidade.

O e-mail corporativo não pode ser comparado ou equiparado às correspondências particulares de forma a merecer a proteção constitucional, conforme opinião do Prof. João Orestes Dalazen da Universidade de Brasília.

Como ferramenta de trabalho o e-mail corporativo auxilia o empregado na realização de suas atividades e deve ser visto como um facilitador a realização de atividades.

As empresas ganham muito em agilidade com a utilização desta ferramenta, sendo justo que seu uso seja utilizado de maneira racional pelos seus empregados, também é justo que sejam considerados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade quando na aplicação de determinadas sanções aos empregados que porventura utilizam o e-mail como instrumento para contatos sociais. Considerando-se os limites tanto do empregado quanto do empregador no sentido de apurar a devida utilização ou mesmo a má utilização desta ferramenta.

A utilização dos e-mails e da Internet, veio para dar agilidade ao trabalho, reduzir o custo das empresas e melhorar o atendimento dos clientes, ocorre que essa utilização pode gerar inúmeras questões de natureza jurídica.

De um lado a Constituição Federal preserva o sigilo das correspondências, de outro garante ao empregador o direito a propriedade privada, dos meios utilizados pelos empregados em serviço, entre eles o e-mail corporativo.

A empresa será responsabilizada, perante terceiros, que se sintam prejudicados, por atos de seus empregados em serviço de conteúdos impróprios.

Após a análise destas questões bem como dos princípios da dignidade da pessoa humana, o direito à intimidade no ambiente de trabalho, da razoabilidade e da proporcionalidade, podemos entender que é razoável ao empregador o controle sobre os e-mails corporativos colocados à disposição dos seus empregados para serem utilizados como melhoria no desempenho de suas atividades, quer por economia de tempo ou de dinheiro.

O empregador tem o poder de controle sobre seus empregados, o chamado poder diretivo que decorre do seu direito de propriedade.

Algumas empresas elaboram regulamentos próprios de utilização do e-mail corporativo e outras apesar de não editarem tais regulamentos esclarecem a seus empregados que a utilização deve ser feita para atividades relacionadas ao trabalho para o qual foram contratados.

Como demonstrado na parte final do presente trabalho, os tribunais do País têm sido chamados a decidir inúmeras questões decorrentes do uso do e-mail corporativo para fins particulares.

Conforme analisamos alguns acórdãos publicados pelos TRTs e pelo TST o posicionamento é o de conceber o e-mail como propriedade da empresa, portanto passível de controle por parte do empregador. O e-mail é considerado uma ferramenta de trabalho colocada à disposição dos empregados com a finalidade de melhorar o desempenho de determinadas tarefas.

Conclui-se que nos casos de verificação do abuso ou da má utilização do e-mail corporativo, pode o empregador advertir, suspender ou demitir o empregador por justa causa, dependendo da reiteração ou da gravidade da falta, atendendo sempre aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

REFERÊNCIAS

AMARAL, Júlio Ricardo de Paula. Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações Trabalhistas. São Paulo: LTr, 2007.

ANDRADE, Vander Ferreira. A Dignidade da Pessoa Humana. Valor-Fonte da Ordem Jurídica. São Paulo: Cautela, 2007.

ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

BASTOS. Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 19. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 1998.

BACELLAR, Margareth de Freitas. O Direito do Trabalho na Era Virtual. Rio de Janeiro: Renovar Biblioteca de Teses, 2003.

BELMONTE. Alexandre Agra. O Monitoramento da Correspondência Eletrônica nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 2004

BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 10 ed., Brasília: UnB, 1999.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional.14. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.

DORIA, Pedro. Manual para a internet: uma visão brasileira. Rio de Janeiro: Editora Revan, 1995.

GANDELMA. Henrique. De Gutenberg à Internet. 4 ed. Rio de Janeiro: Editora Record, 1997.

GOMES, Dinaura Godinho Pimentel. Direito do Trabalho e Dignidade da Pessoa Humana, no Contexto da Globalização Econômica. São Paulo: LTr, 2005.

LISBOA. Roberto Senise. A inviolabilidade de correspondência na internet. In Direito & internet – aspectos relevantes. Coordenação Newton de Lucca e Adalberto Simão Filho. São Paulo: Edipro: 2001.

MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO, Inocêncio Mártires. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 31. ed. São Paulo: LTr, 2005.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dimensões da Dignidade. Ensaios de Filosofia do Direito e Direito Constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.

VIANNA, Márcio Túlio. Direito de Resistência. São Paulo: LTr, 1996.

BRASIL, Constituição Federal 1988. Vade Mecum/obra coletiva da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Marcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Livia Céspedes. 7. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

BRASIL, Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Vade Mecum/obra coletiva da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Marcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Livia Céspedes. 7. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

1 IDENTIFICAÇÃO DO ACÓRDÃO TRIBUNAL: 2ª Região ACÓRDÃO NUM: 02960279330 DECISÃO: 07 05 1996TIPO: RO01 NUM: 02950021764 ANO: 1995 NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - RECURSO ORDINÁRIO TURMA: 10 ÓRGÃO JULGADOR - DÉCIMA TURMA
Acesso: 05/08/2014


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