Há muito tempo que se sabe que a chamada globalização é mais uma mentira inventada pelos países mais poderosos para impingir seu modo de produção e consumo para o resto da humanidade, gerando riqueza (para eles) e custo (para os demais países). Antigamente, esse método chamava-se imperialismo e os demais países, hoje intitulados de emergentes, eram qualificados como subdesenvolvidos.
Essa manipulação linguística é tão boa que pegou forte: todo mundo gostou. Os países ricos continuaram assim e os subdesenvolvidos foram “promovidos” a emergentes. Uma vitória simbólica. Vitória dos poderosos e não dos oprimidos, pois como diz o sociólogo francês Pierre Bourdieu, a base da violência simbólica está presente nos símbolos e signos culturais, especialmente no reconhecimento tácito da autoridade exercida por certas pessoas e grupos de pessoas, como por exemplo, a mídia, a religião, a publicidade etc. Por isso, a violência simbólica propriamente dita nem é percebida como violência, mas sim como uma espécie de indicação, uma permissão ou uma proibição desenvolvida com base em um respeito ao que "naturalmente" se faz; ela se apresenta como um modelo de conduta a ser seguida[i].
A produção cultural e tecnológica dos países dominantes é desenvolvida e entregue aos países emergentes (eu ia dizer “imposta”, mas a aquiescência mansa e pacífica é tamanha que sou obrigado a abandonar esse verbo autoritário). Assim, na atual globalização, a invasão não se faz em termos de territórios, mas de mercados. Toma-se conta do polo de consumo e, na medida em que os consumidores aderem aos produtos e serviços inventados e produzidos pela indústria dominante, passam a se comportar como esses detentores do poder global querem que eles se comportem. Quanto aos produtos e serviços, vale de tudo, desde um refrigerante até os chamados “produtos culturais”, tais como filmes de cinema (hollywoodianos de preferência), enlatados de tevê como séries e programas etc.
E um dos modos mais eficientes de dominação é o do uso da linguagem. Para ficarmos com a posição de Bourdieu, o uso de palavras e expressões pelos dominadores (os que vêm de fora ou que estão mesmo dentro da comunidade) é um dos modos mais eficientes de controle.
Meu amigo Outrem Ego gosta muito de brincar com esse poder que a língua estrangeira tem, especialmente, o anglicismo (que no mais das vezes aparece escondido no termo “estrangeirismo”. É que cada vez mais por aqui o estrangeirismo tem uma única origem e direção: a língua inglesa, como diria a banda britânica que acaba de passar por aqui, One Direction).
Numa conversa com sobre o tema, ele me disse:
“Minha filha me contou que seu boyfriend foi até o shopping center de bike. Ela estava lá, esperando por ele, na pista de skate, que fica em frente a umoutdoor. Quando ele chegou, foi que ela reparou que ele tinha um piercing na barriga, pois estava quase sem camisa por causa do vento. Parecia até que queira fazer strip tease. Brincando, ela perguntou se ele não queria fazer de vez umtopless e aproveitar para arrancar o apetrecho do umbigo e colocar um band-aid no lugar. Ele riu e disse que estava tudo bem como ele, pois tinha feito umcheckup recentemente. Daí eles encontraram outro casal e entraram correndo para comer numa lanchonete fast food. Ela comeu um hamburger, no qual passou ketchup e bebeu uma coca-cola light. Ele deglutiu um cheeseburger bacon e tomou um milk-shake de chocolate. De sobremesa, ela comeu umcupcake de blueberry e ele um sundae de creme. Os outros dois amigos, que sentaram na mesma mesa da praça de alimentação, haviam ido a lugares diferentes: ela foi a um restaurante self-service e de lá levou uma caesar salade um smoothie de morango. Ele variou: pegou um tuna wrap num lugar, uma porção de onion rings em outro e bebeu um suco detox. De sobremesa, ela tomou frozen yogurt e ele um cookie de chocolate”.
Eu, em flash-back, voltei ao meu tempo de adolescente, quando comia hot-dogcom suco natural e comia banana-split de sobremesa…
De fato, a linguagem é um sistema aberto e, naturalmente, cada língua, de um jeito ou de outro, recebe influência externa. Não há necessariamente um mal nisso até por que é inevitável. Muitas vezes, inclusive, a língua pátria acaba por fazer uma adaptação. No caso brasileiro, são muitas as palavras aportuguesadas (ou abrasileiradas), tais como abajur, futebol, purê, batom, chofer, baguete, ateliê, bife, boate, sutiã etc.
Mas, o que nos últimos tempos chama a atenção é a enorme quantidade de termos em inglês que passou a fazer parte do dia-a-dia do mercado de consumo brasileiro, com muita naturalidade, a indicar, como acima referi, de um lado o poder de controle dos americanos e ingleses e, de outro, uma aceitação passiva do modelo.
Não é pouca coisa. Junto com os termos e expressões, vêm regras e comportamentos, nem sempre declarados. Eu mesmo aqui neste espaço já fiz, por exemplo, uma análise do Halloween no Brasil e sua capacidade de influência e direção para a aquisição de produtos esdrúxulos, além de porcarias e guloseimas que só fazem mal à saúde das crianças.
Uma simples passada d´olhos no mercado brasileiro mostra uma interminável sucessão de termos ingleses. Nem preciso ficar na tecnologia, com iphones, smarthphones, blue-rays etc. ou nos computadores e seus inputs, outputs, backups, mouse, scanner, software, hardware, etc. ou, ainda, na internet e redes sociais com o skype, facebook, o twitter, as hashtags etc. (Aliás, permita-me um parêntese para mostrar nossa capacidade de assimilação ligeira. Essa palavra “hashtag” tão difícil de pronunciar é usada com orgulho por locutores nas rádios…). Por falar em rádio, há uma empresa de TI, que faz uma propaganda, na qual diz mais ou menos isso: “Nossa empresa conta com grandeportfolio de clientes, storage, data center, service desk e field services”.
Na área dos automóveis e demais veículos é incrível: os automóveis possuem transmissão automática H-matic com shiftronix, freios ABS, ar condicionado com AQS (Air quality control system), tração 4X4 full time, air-bags,pneus radiais com banda larga all season passenger, blue tooth, bluemediatv, bancos de couro premium, e muitos outros adereços, em inglês, claro. O novo Honda Fit permite uma acomodação dos bancos da seguinte forma: modo utility, modo tall, modo long e modo refresh. Capisce?
Para terminar, conto a história do professor de Direito que, num Congresso, assistia a uma palestra de um outro professor. Este defendia que se usassem mais expressões em latim na comunicação jurídica, por que isso era um bem inominável e um patrimônio a ser preservado. O citado professor discordava disso. Daí, levantou a mão, pediu a palavra e com o braço estendido ao alto disse: “Prezado colega, permita-me discordar, data máxima vênia…”
E ficou lá, parado, examinando sua própria fala em silêncio!"
[i] [i] O Poder simbólico. Lisboa: Edições 70, passim.
>http://terramagazine.terra.com.br/blogdorizzattonunes/blog/2014/05/19/a-lingua-como-produto-de-consumo-e-controle/<. Acesso: 27/05/2014
O Beasil e um país enorme, as vezes costumo pensar que a única coisa que se teme em comum entre todos os estados brasileiros é a língua e por isso acho q deveria ser valorizada.
ResponderExcluirO Beasil e um país enorme, as vezes costumo pensar que a única coisa que se teme em comum entre todos os estados brasileiros é a língua e por isso acho q deveria ser valorizada.
ResponderExcluirO Beasil e um país enorme, as vezes costumo pensar que a única coisa que se teme em comum entre todos os estados brasileiros é a língua e por isso acho q deveria ser valorizada.
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